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Irmandades

Irmandade do Santíssimo Sacramento

Escrito por Super User | Publicado: Sexta, 26 de Janeiro de 2018, 13h05 | Última atualização em Quinta, 25 de Março de 2021, 17h49

O documento trata do compromisso da Irmandade do Santíssimo Sacramento da catedral do Rio de Janeiro, escrito em 1785. Era um estatuto completo, constando todos os direitos e deveres dos membros da irmandade. Através deste documento é possível observar a organização do universo religioso colonial.

 

Conjunto documental: Compromisso da Irmandade do Santíssimo Sacramento da catedral do Rio de Janeiro
Notação: Códice 758
Datas-limite: 1785-1785
Título do fundo ou coleção: SDH – Diversos códices
Código do fundo: NP
Argumento de pesquisa: Irmandades
Data: 1785
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 9 e 9v.

 

"Item n.º 1 do capítulo 6º do compromisso[1] da Irmandade do Santíssimo Sacramento da catedral do Rio de Janeiro[2].

 

No Domingo seguinte a quinta-feira do corpo de Deus, dia em que se costuma celebrar a nossa festividade[3] se fará a festa do santíssimo sacramento[4]; com sacramento exposto, e com aquela grandeza que pede a mesma solenidade, e nos limites da razão, onde assistirá o Provedor da Irmandade com toda a mesa de Ópas[5]; e de tarde a procissão na forma praticada para o que fará o tesoureiro toda a despesa da Irmandade.

(...) Item n.º 3.

 

Falecido que seja algum Irmão[6], tendo pago os anuais terá pela sua alma vinte e cinco missas da obrigação da Irmandade, e se lhe dará sepultura se dela necessitar; o que também se praticará com suas mulheres se continuarem com o pagamento dos anuais, e caso que algum Irmão, pela sua indigência, e pobreza não pague os ditos anuais, pede a piedade se pratique com ele o mesmo que com os que pagam.

(...) Capítulo 7.

O andador[7] da Irmandade, terá obrigação de fazer prover a lampada, e observar algum descuido ou falta no altar do santíssimo sacramento, para fazer aviso a quem tocar, fazer as diligências que lhe são cometidas, assistir ao tesoureiro para que lhe encarregar, em negócio, benefício e obrigação da Irmandade. E se for descuidado das suas obrigações será admoestado pela Mesa; e ao depois de advertido não se reformando das missões; como também os que servem para ordenado, dará a mesa nesta parte a providência que for justa.”

 

 

 

[1]COMPROMISSO: estatuto que regia as irmandades católicas. Os compromissos eram documentos juridicamente reconhecidos, nos quais vinham prescritas as normas, os deveres e as obrigações que implicavam a associação a essas instituições. Cada irmandade possuía um compromisso próprio, com suas especificidades.

[2] RIO DE JANEIRO: a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro foi fundada tendo como marco de referência uma invasão francesa. Em 1555, a expedição do militar Nicolau Durand de Villegaignon conquista o local onde seria a cidade e cria a França Antártica. Os franceses, aliados aos índios tamoios confederados com outras tribos, foram expulsos em 1567 por Mem de Sá, cujas tropas foram comandadas por seu sobrinho Estácio de Sá, com o apoio dos índios termiminós, liderados por Arariboia. Foi Estácio que estabeleceu “oficialmente” a cidade e iniciou, de fato, a colonização portuguesa na região. O primeiro núcleo de ocupação foi o morro do Castelo, onde foram erguidos o Forte de São Sebastião, a Casa da Câmara e do governador, a cadeia, a primeira matriz e o colégio jesuíta. Ainda no século XVI, o povoamento se intensifica e, no governo de Salvador Correia de Sá, verifica-se um aumento da população no núcleo urbano, das lavouras de cana e dos engenhos de açúcar no entorno. No século seguinte, o açúcar se expande pelas baixadas que cercam a cidade, que cresce aos pés dos morros, ainda limitada por brejos e charcos. O comércio começa a crescer, sobretudo o de escravos africanos, nos trapiches instalados nos portos. O ouro que se descobre nas Minas Gerais do século XVIII representa um grande impulso ao crescimento da cidade. Seu porto ganha em volume de negócios e torna-se uma das principais entradas para o tráfico atlântico de escravos e o grande elo entre Portugal e o sertão, transportando gêneros e pessoas para as minas e ouro para a metrópole. É também neste século, que a cidade vive duas invasões de franceses, entre elas a do célebre Duguay Trouin, que arrasa a cidade e os moradores. Desde sua fundação, esta cidade e a capitania como um todo desempenharam papel central na defesa de toda a região sul da América portuguesa, fato demonstrado pela designação do governador do Rio de Janeiro Salvador de Sá como capitão-general das capitanias do Sul (mais vulneráveis por sua proximidade com as colônias espanholas), e pela transferência da sede do vice-reinado, em Salvador até 1763, para o Rio de Janeiro quando a parte sul da colônia tornou-se centro de produção aurífera e, portanto, dos interesses metropolitanos. Ao longo do setecentos, começam os trabalhos de melhoria urbana, principalmente no aumento da captação de água nos rios e construção de fontes e chafarizes para abastecimento da população. Um dos governos mais significativos deste século foi o de Gomes Freire de Andrada, que edificou conventos, chafarizes, e reformou o aqueduto da Carioca, entre outras obras importantes. Com a transferência da capital, a cidade cresce, se fortifica, abre ruas e tenta mudar de costumes. Um dos responsáveis por essas mudanças foi o marquês do Lavradio, cujo governo deu grande impulso às melhorias urbanas, voltando suas atenções para posturas de aumento da higiene e da salubridade, aterrando pântanos, calçando ruas, construindo matadouros, iluminando praças e logradouros, construindo o aqueduto com vistas a resolver o problema do abastecimento de água na cidade. Lavradio, cuja administração se dá no bojo do reformismo ilustrado português (assim como de seu sucessor Luís de Vasconcelos e Souza), ainda criou a Academia Científica do Rio de Janeiro. Foi também ele quem erigiu o mercado do Valongo e transferiu para lá o comércio de escravos africanos que se dava nas ruas da cidade. Importantíssimo negócio foi o tráfico de escravos trazidos em navios negreiros e vendidos aos fazendeiros e comerciantes, tornando-se um dos principais portos negreiros e de comércio do país. O comércio marítimo entre o Rio de Janeiro, Lisboa e os portos africanos de Guiné, Angola e Moçambique constituía a principal fonte de lucro da capitania. A cidade deu um novo salto de evolução urbana com a instalação, em 1808, da sede do Império português. A partir de então, o Rio de Janeiro passa por um processo de modernização, pautado por critérios urbanísticos europeus que incluíam novas posturas urbanas, alterações nos padrões de sociabilidade, seguindo o que se concebia como um esforço de civilização. Assume definitivamente o papel de cabeça do Império, posição que sustentou para além do retorno da Corte, como capital do Império do Brasil, já independente.

[3] FESTEJOS COLONIAIS: no primeiro século da colonização, as festividades seguiam os rituais religiosos do calendário cristão e movimentavam toda a população, caracterizando-se por uma europeização dos costumes nas terras americanas. Ocupando posição de destaque na sociedade, as festas integravam diferentes estratos sociais, etnias e religiosidades no Brasil colonial. De uma maneira geral, as festas dividiam-se entre as religiosas e as públicas: as religiosas dedicavam-se ao culto a Jesus Cristo (nascimento, morte e ressurreição) e aos santos padroeiros e mártires, sendo promovidas pelas igrejas e irmandades; já as públicas eram organizadas pelas autoridades portuguesas e coloniais, celebrando, sobretudo, a coroação de reis, batismos e casamentos dos membros da família real. Tais festejos podem ser vistos como um modo de consolidar os vínculos coloniais, fortalecendo a monarquia e sua burocracia. Eram também uma forma de introjetar a cultura católica no seio de uma sociedade mestiça, disseminando as práticas e costumes brancos, estimulando a devoção popular. O poder exercido através das festas acontecia em tal grau, que a recusa em participar destes eventos poderia resultar em acusações de heresias ou subversões, coagindo a participação efetiva de todos os membros da comunidade. As festividades, religiosas e públicas, serviam também como momento da manifestação de rebeldia e protesto contra os poderosos. No entanto, dentro deste espaço delimitado, possibilitava a manutenção da ordem colonial. Aos poucos, as festividades foram abrindo espaço para o lúdico e o profano, seduzindo cada vez mais os colonos. Entre as principais manifestações, estavam as festas do calendário religioso (abarcando cerca de um terço do ano), as congadas negras e as cavalhadas dos brancos luso-brasileiros (representação da rivalidade entre mouros e cristãos).

[4] FESTA DO SANTÍSSIMO SACRAMENTO: instituída em 1264 pelo Papa Urbano IV, em hora do Santíssimo Sacramento da Eucaristia. É comemorada no dia de Corpus Christi, quando se celebra a morte e ressurreição de Cristo. Era composta de uma missa, seguida de uma procissão, em que os devotos enfeitavam, como ainda hoje, as ruas com tapetes, feitos de areia ou serragem colorida, formando desenhos dedicados a Jesus Cristo.

[5] MESA DE OPAS: era a mesa administrativa da Irmandade do Santíssimo Sacramento constituída pelos respectivos “dignitários”: juiz, tesoureiro, escrivão e procurador; três membros do conselho econômico e três membros da comissão de sindicância. Era assim designada em função das vestes comumente utilizadas por devotos e irmãos de confrarias em reuniões solenes, as opas – espécie de capa sem mangas.

[6] SEPULTAREM AOS MORTOS: a morte no Brasil colonial era marcada por um verdadeiro ritual – concebido de acordo com a concepção católica da tríade céu, purgatório e inferno –, buscando compensar os excessos dos fiéis em vida através de “estratégias de salvação”. Isto acabava por demarcar a camada social do falecido. O primeiro recurso utilizado era o testamento, verdadeiros tratados de arrependimento e reparações dos excessos. Em seguida vinham os velórios, muitas vezes com os detalhes predefinidos no testamento. Quanto maior fossem os gastos realizados para demonstrar o pesar do falecimento do cidadão, maior significava sua importância social. E se eram realizados à noite, expressavam o grande poder aquisitivo do falecido. Além disso, acreditava-se que, quanto maior os gastos na quantidade de liturgias oferecidas pelo falecimento do cidadão, maior seria a indulgência divina sobre seus pecados. As crenças populares predominavam nos velórios coloniais. Os cortejos fúnebres eram acompanhados por inúmeros personagens tais como as irmandades, parentes, amigos, curiosos, músicos e padres. Estes, por serem especialistas nas escrituras e na “salvação”, eram muito solicitados a comparecerem, e quanto mais fossem, melhor seria para o prestígio da alma perante Deus. Muitas vezes também, contavam com a presença de pessoas pobres pagas para assistirem e orarem por sua alma, aumentando o luxo do cortejo fúnebre e ajudando na redução de seus pecados. Finalmente, havia o sepultamento feito no interior das igrejas. Quanto mais próximo dos santos e do altar, maior o “status” da pessoa. No entanto, este ritual era permitido apenas para aqueles que tivessem condições de pagar por ele. Escravos e pessoas pobres contavam com a caridade das irmandades e na falta desta tinham seus corpos abandonados nos matagais e nos rios.  Essa prática deu origem à “procissão dos ossos”, realizada pela Santa Casa com o intuito de recolher os corpos que por ventura viessem a ser expostos.  Além disso, alguns colonos estavam previamente excluídos como: judeus, hereges, usurários, apóstatas, duelistas (bem como seus padrinhos), suicidas, ladrões e violadores dos bens da Igreja e excomungados. Para estes, não era permitido o sepultamento em solo sagrado ou mesmo celebrar missas por sua morte.

[7] ANDADOR: empregado subalterno da irmandade responsável por entregas e pequenas cobranças.

 

Sugestões de uso em sala de aula:
Utilização(ões) possível(is):
- Ao trabalhar o tema transversal “Pluralidade cultural” 
- No eixo temático sobre “História das representações e das relações de poder”

Ao tratar dos seguintes conteúdos:
- Homem e a cultura
- A sociedade colonial: movimentos religiosos e culturais  
- As relações sociais de dominação na América
- Brasil colonial: organizações religiosas

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