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Comentário

Escrito por Super User | Publicado: Terça, 24 de Janeiro de 2017, 13h02 | Última atualização em Quinta, 09 de Agosto de 2018, 14h39

 Elaine Cristina Ferreira Duarte
Mestre em História – UERJ

 

Entre os séculos XV e XIX, o continente africano revelou-se fonte de uma riqueza diferente a ser explorada pelos navegadores europeus.  A mão-de-obra escrava africana atraiu para o continente negro comerciantes de várias partes da Europa que estabeleceram ali feitorias e deram início a uma das principais atividades econômicas do período colonial: o tráfico de escravos. A procura crescente por mão-de-obra escrava, motivada pelo estabelecimento de colônias na América geridas pelo sistema de Plantation, garantiu as condições para o pleno desenvolvimento dessa atividade.

Como resultado, a África passou a ser parte integrante do chamado comércio triangular (Europa-África-América), cuja principal atuação foi como fornecedora de mão-de-obra escrava para as possessões ultramarinas. Utilizados nas grandes plantações monocultoras de açúcar, tabaco, algodão e café, os escravos eram adquiridos através do escambo, isto é, da troca por produtos manufaturados (tecidos, rum, armas de fogo, melaço, etc.).

Transportados em navios tumbeiros ou negreiros, os escravos provinham principalmente do Senegal, da Gâmbia, da Costa do Ouro e da Costa dos Escravos (séculos XVII e XVIII) e do delta do Níger, do Congo e de Angola (séculos XVIII e XIX). 

Os primeiros escravos negros chegaram ao Brasil com a expedição de Martim Afonso de Souza em 1530, vindos da Guiné. A partir da década de 1550, o comércio negreiro intensificou-se, sendo oficializado em 1568 pelo governador-geral Salvador Correa de Sá. Ocorreu que a expansão da cultura canavieira gerou uma crescente necessidade de mão-de-obra, a qual os portugueses tentaram solucionar, em um primeiro momento, apelando para a escravização da população indígena que aqui encontraram.

A grande hostilidade e resistência dos indígenas aos portugueses e ao trabalho forçado levaram a substituição do escravo indígena pelo escravo africano. Este, além de solucionar a questão da mão-de-obra, representou o início de uma atividade altamente rentável para os comerciantes portugueses e para a Coroa. Ao longo desse período, Portugal desfrutou amplamente do domínio que havia consolidado em diversas regiões da Costa africana (Guiné, Costa do Marfim, Angola, Moçambique, arquipélago de Cabo Verde e Congo), de onde vieram a grande maioria dos escravos trazidos para América portuguesa.

O tráfico de escravos para o Brasil entrou em declínio a partir do estabelecimento de leis proibitivas resultantes da pressão exercida pela Inglaterra para extinção do comércio escravo no início do século XIX. Nesse período, a Inglaterra – que havia passado pela revolução industrial (1750),  proibido o tráfico de escravos em seu império (1806-07) e, mais tarde, o trabalho escravo (1833) – levantou como sua principal bandeira no campo da política externa a luta pelo fim desse comércio. Já em 1810, nos primeiros tratados comerciais assinados com a Coroa inglesa, o príncipe regente d. João se comprometera a abolir o tráfico de escravos africanos.

A pressão inglesa prosseguiu e com a realização do Congresso de Viena (1815) os congressistas ingleses, liderados pelo primeiro-ministro Castlereagh, conseguiram estabelecer interrupção do tráfico negreiro ao norte da linha do Equador. Como conseqüência, os comerciantes portugueses perderam importantes áreas de abastecimento de mão-de-obra escrava, como a Costa do Marfim. Dois anos depois, d. João VI ratificou a decisão do Congresso de Viena e, por meio de um novo acordo, concedeu à Inglaterra o direito de visita e busca nos navios suspeitos de tráfico em alto mar. Segundo esse acordo, o navio surpreendido em atividade ilegal teria a sua carga jogada ao mar. Apesar dos  acordos firmados em 1810 e 1817, o tráfico intensificou-se no Brasil.

O interesse da Inglaterra em pôr fim ao comércio de escravos explica-se pela restrição que o trabalho escravo representava ao desenvolvimento de um grande mercado consumidor em potencial. Com a proclamação da independência do Brasil (1822), a pressão inglesa também se intensificou, resultando no chamado Bill Abeerden Act – lei que autorizava a apreensão de navios negreiros pela marinha inglesa. A proibição efetiva do tráfico de escravos no Brasil somente ocorreu em 1850, quando da instituição da lei Eusébio de Queirós. No entanto, a lei Eusébio de Queirós implicou na redução significativa do número de negros trazidos à força para o Brasil, mas não o fim das atividades do tráfico, já que alguns navios continuaram atuando na clandestinidade. A extinção do tráfico foi o primeiro passo dado rumo à abolição da escravidão no Brasil, que apenas ocorreria no final do século XIX. 

O Arquivo Nacional dispõe de uma série de documentos sobre o tema distribuídos entre os fundos do Vice-Reinado, da Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, como também do Ministério da Justiça, da Série Interior, Diversos Códices-SDH e Diversos GIFI. Entre os documentos existentes estão cartas e requerimentos variados que relatam desde pedidos de liberdade realizados por escravos até o apresamento de navios pela marinha inglesa, além de termos de contagem dos escravos transportados para o Brasil, feitos pela Intendência da Marinha. Os documentos abordam ainda a questão dos maus tratos sofridos pelos escravos, a legislação proibitiva do tráfico, a atuação de corsários, os problemas encontrados na remessa de escravos para a colônia e aqueles gerados pelas apreensões feitas pelas forças navais britânicas, entre outros. Trata-se, enfim, de um acervo documental que possibilita o enfoque do tema sob diversos ângulos.

 

 

 

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