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Nascimento do Príncipe da Beira: Beija-mão

Publicado: Quinta, 21 de Junho de 2018, 14h38 | Última atualização em Quinta, 06 de Mai de 2021, 21h00

Ofício remetido a todos os tribunais, convocando o comparecimento ao Palácio Real da Quinta da Boa Vista para o beija-mão, realizado por ocasião do nascimento do príncipe da Beira d. João Carlos.  

 

Conjunto documental: Papéis relativos aos batizados dos príncipes da Casa Imperial
Notação: códice 567
Data-limite: 1763-1881
Título do fundo: Casa Real e Imperial / Mordomia-mor
Código do fundo: Ø0
Argumento de pesquisa: Portugal, Casa Real 
Data do documento: 9 de março de 1821
Local: s.l.
Folha(s): 43

 

"Audiência dos tribunais

Para Antônio José da Cunha e Almeida

Ilustríssimo reverendíssimo senhor - Com o plausível motivo do feliz parto da sereníssima senhora princesa real: há El Rei[1] nosso senhor por bem que domingo 11 do corrente pela uma hora da tarde possam os tribunais ir ao palácio da Real Quinta da Boa Vista[2] beijar a sua real mão[3] sem precedência. O que vossa ilustríssima fará presente na Mesa do Desembargo do Paço[4] para que assim se observem. Deus guarde a vossa ilustríssima. Paço em 9 de março de 1821.

G. da C. Quintella

Nesta mesma conformidade se expediu a todos os mais tribunais."

Carolina Josefa Leopoldina[5]

 

[1] JOÃO VI, D. (1767-1826): segundo filho de d. Maria I e d. Pedro III, se tornou herdeiro da Coroa com a morte do seu irmão primogênito, d. José, em 1788. Em 1785, casou-se com a infanta Dona Carlota Joaquina, filha do herdeiro do trono espanhol, Carlos IV que, na época, tinha apenas dez anos de idade. Tiveram nove filhos, entre eles d. Pedro, futuro imperador do Brasil. Assumiu a regência do Reino em 1792, no impedimento da mãe que foi considerada incapaz. Um dos últimos representantes do absolutismo, d. João VI viveu num período tumultuado. Foi sob o governo do então príncipe regente que Portugal enfrentou sérios problemas com a França de Napoleão Bonaparte, sendo invadido pelos exércitos franceses em 1807. Como decorrência dessa invasão, a família real e a Corte lisboeta partiram para o Brasil em novembro daquele ano, aportando em Salvador em janeiro de 1808. Dentre as medidas tomadas por d. João em relação ao Brasil estão a abertura dos portos às nações amigas; liberação para criação de manufaturas; criação do Banco do Brasil; fundação da Real Biblioteca; criação de escolas e academias e uma série de outros estabelecimentos dedicados ao ensino e à pesquisa, representando um importante fomento para o cenário cultural e social brasileiro. Em 1816, com a morte de d. Maria I, tornou-se d. João VI, rei de Portugal, Brasil e Algarves. Em 1821, retornou com a Corte para Portugal, deixando seu filho d. Pedro como regente.

[2]QUINTA DA BOA VISTA: propriedade doada por Elias Antônio Lopes, rico comerciante luso-libanês e negociante de escravos, ao príncipe regente d. João, poucos meses depois da chegada da família real ao Rio de Janeiro, era a melhor morada do Rio de Janeiro à época. Em troca do presente, Elias Antônio Lopes obteve inúmeros benefícios, como a nomeação para comendador da Ordem de Cristo, fidalgo da Casa Real e administrador da referida propriedade. Nos séculos XVI e XVII as terras faziam parte de uma grande sesmaria, de propriedade dos jesuítas, e foram desmembradas quando da expulsão da ordem em 1759, e vendidas pelo Estado a particulares. Localizada no bairro de São Cristóvão, a Quinta da Boa Vista contava com uma casa senhorial, sede da fazenda, de aspecto arquitetônico típico do período colonial, erguida em torno de 1803. Como o prédio era considerado pequeno e modesto para abrigar toda a corte portuguesa, foram planejadas reformas para o edifício e as áreas no entorno, secando pântanos para facilitar o acesso ao centro da cidade, preparando os jardins e construindo novos blocos, como a cozinha, nos fundos. O palácio sofreu reformas entre 1816 e 1821, para o casamento de d. Pedro com a princesa Maria Leopoldina da Áustria, com a construção do torreão norte. Entre 1826 e 1831, durante o primeiro reinado, houve novas intervenções que imprimiram o estilo neoclássico ao prédio, que vinha se tornando um palácio suntuoso, ao nível de moradia de um monarca. Outras reformas foram feitas ao longo do reinado de d. Pedro II, nascido no palácio, e merece destaque o grande remodelamento que foi encomendado pelo imperador ao arquiteto e paisagista francês Auguste François Marie Glaziou, que deu ao parque um ar de jardim inglês, com a construção de lagos, alamedas e grutas artificiais. Foi a partir dessa época que, com a abertura de linhas de transporte, a população passou a frequentar os jardins do paço para diversão e passeios. Em 1889, com a proclamação da República, o palácio foi confiscado pelo governo e quase todo o seu conteúdo interior, móveis e objetos, foi leiloado. Entre 1890 e 1891 abrigou a Assembleia Constituinte reunida para elaboração da carta de 1891. Em 1892 foi transformado em sede do Museu Nacional, papel que ocupa até os dias de hoje, mesmo depois do incêndio que quase destruiu toda a edificação e seu acervo em 2018. Nos terrenos da Quinta da Boa Vista fica ainda o Zoológico do Rio de Janeiro (desde os anos 1940).

[3] BEIJA-MÃO: função medieval revivida pelos Bragança, a cerimônia de corte do beija-mão era uma representação pública, que punha o monarca em contato direto com o vassalo. Este, por sua vez, lhe apresentava as devidas reverências e suplicava por alguma mercê, frequentemente concedida pelo rei. Pleno de significado simbólico, o cerimonial reforçava a autoridade paternal do soberano protetor da nação, bem como o respeito à monarquia, confirmado pela postura altamente reverencial diante dos reis e pelo fascínio que exercia sobre o povo em geral. Regras prescritas determinavam a sequência de atos que levava ao ponto mais alto da cerimônia do beija-mão: chegando junto à sua majestade, por meio de uma reverência, que consistia em dobrar um pouco ambos os joelhos (genuflexão), ficando o corpo inteiro, punha-se um joelho em terra e lhe beijava a mão. Após levantar, tornava-se a fazer outra genuflexão e, voltando-se para o lado direito, retirava-se da sala. No Brasil, o ritual do beija-mão adquiriu um caráter fundamental nas cerimônias celebradas por d. João VI. O rei recebia o público todas as noites, exceto domingos e feriados, no palácio de São Cristóvão, acompanhado por uma banda musical. Este ritual “antiquado”, como foi observado por convidados austríacos na corte carioca, fez parte de todo o cerimonial restaurado por d. João que adotou, aqui no Brasil, um papel tradicional de monarca absoluto. Sua preocupação era manter um contato direto com súditos que nunca o haviam visto e, consequentemente, aumentar a sua popularidade concedendo alguma mercê. O beija-mão se tornara, assim, uma forma de aproximação dos representantes da Corte com o povo da colônia e de afirmação da autoridade real.

[4] MESA DO DESEMBARGO DO PAÇO E DA CONSCIÊNCIA E ORDENS (RIO DE JANEIRO): criada no Rio de Janeiro, após a transferência da Corte portuguesa ao Brasil, pelo alvará de 22 de abril de 1808, era um órgão superior da administração judiciária. O recém-criado tribunal encarregava-se dos negócios que, em Portugal, pertenciam a quatro secretarias: os tribunais da Mesa do Desembargo do Paço, da Mesa da Consciência e Ordens, do Conselho do Ultramar e da Chancelaria-Mor da Corte e do Reino. O alvará de criação do Desembargo do Paço e da Mesa da Consciência e Ordens, definia ambos como um mesmo tribunal, no entanto, na prática, mantiveram funcionamento e normas distintas. Referente ao Conselho Ultramarino, sua jurisdição englobava apenas os temas que não fossem militares, uma vez que estes já eram contemplados pelo Supremo Conselho Militar, uma de suas atribuições foi a confirmação das sesmarias da Corte e província do Rio de Janeiro, que até então eram dadas pelos vice-reis, pelos governadores e pelos capitães-generais de diversas capitanias.

[5] LEOPOLDINA, D. (1797-1826): nascida na Áustria, Carolina Josefa Leopoldina Francisca Fernanda de Habsburgo-Lorena era filha de Francisco II da Alemanha, que depôs a Coroa eletiva do Santo Império Germânico e se fez proclamar, em 1806, imperador da Áustria, da Hungria e da Boêmia, com o nome de Francisco I; e de Maria Teresa, filha de Fernando IV, rei das duas Sicílias. Arquiduquesa de Áustria, princesa real do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves e primeira imperatriz do Brasil, d. Leopoldina passou a infância em Viena e foi educada nos moldes de uma corte do Antigo Regime em tempos de guerras napoleônicas. Inteligente e instruída, falava alemão, francês, inglês, italiano e aprendeu o português por ocasião do seu matrimônio com o príncipe real d. Pedro, com quem teve nove filhos. O casamento foi realizado por procuração, em 13 de maio de 1817, na corte de Viena, em cumprimento ao compromisso diplomático matrimonial firmado entre Francisco I e d. João VI. Leopoldina desembarcou no Brasil em novembro do mesmo ano e desempenhou uma participação ativa na cultura e na política locais. Acompanhada por naturalistas, desenhistas e pintores, encarregou-se da reorganização da extinta Casa de História Natural, trabalho que resultou na criação, em 1818, de um museu real destinado ao estudo e à divulgação das ciências naturais no Brasil. No campo da política, a imperatriz exerceu grande influência sobre d. Pedro durante todo o processo de independência e, após 1822, incumbiu-se de convencer a corte de Viena quanto à necessidade de reconhecer o império, com o argumento de que este preservava o sistema monárquico na América. Além disso, durante as viagens de d. Pedro I, assumiu a regência e a presidência do Conselho de Estado, sendo a última vez, dias antes de seu falecimento, em 8 de dezembro de 1826. Embora frequentemente lembrada em virtude dos casos amorosos do imperador, d. Leopoldina foi responsável por um papel importante na história luso-brasileira. Sua presença no continente americano representava uma grande parte da Europa de seu tempo na América portuguesa, tornando a imperatriz um agente de comunicação do Brasil com as nações europeias, além de um elo com a corte vienense.

 

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