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Viviane Gouvêa
Mestre em Ciencias Politicas UFRJ
Pesquisadora do Arquivo NacionalO fundo Polícia da Corte do Arquivo Nacional contém uma série de conjuntos documentais que registram os procedimentos de buscas de escravos fugidos, procura e eliminação de quilombos, prisões de escravos pelos motivos mais variados – desordens urbanas, entre as quais a prática do jogo da casquinha e da capoeira, assassinatos de senhores, roubos e desacato à autoridade –, formando um amplo conjunto de informações de interesse crucial para o estudo de como os escravos negros – africanos ou nascidos no Brasil – demonstravam a sua não-submissão à condição que lhes era imposta.
As formas de resistência e insubordinação variavam enormemente, e nem sempre surgiam como um ato deliberado, planejado ou organizado de rebeldia mas, como em alguns casos de crimes de assassinato ou roubo, como manifestação individual e, às vezes, espontânea de recusa à situação de violência e exploração a que estavam submetidos. Na verdade, os traços e manifestações de inconformismo e rebeldia assumiam tantas formas que é difícil abordá-las como se fossem um todo coerente. Portanto, individuais ou coletivas, organizadas ou sob a forma de explosões espontâneas momentâneas, abertas ou sub-reptícias, tais manifestações expressavam as diferenças e variações presentes nas relações entre os cativos e seus senhores, entre os diversos grupos de cativos e entre as atividades econômicas nas quais se inseriam.
Quando se levanta a discussão em torno de resistência ou insurreição escrava de uma maneira geral, a primeira palavra que vem à cabeça dos brasileiros é “quilombo,” muitas vezes especificada como “quilombo dos Palmares.” Considerado o maior e mais longevo dos quilombos brasileiros, o quilombo dos Palmares, contudo, não constitui o padrão para estas aglomerações de escravos fugidos que, em sua maioria, dependendo da época e do lugar, poderiam ser descritos como aglomeração de, no mínimo, apenas 6 pessoas. Vários deles não passavam de acampamentos em que poucos indivíduos sobreviviam à custa de roubos e furtos a viajantes.
Tais aglomerações ocorreram nas Américas onde quer que houvesse escravidão em sistema de grandes lavouras: palenques, ou cumbes, na América espanhola; maroons, na América inglesa; e grand marronage, na América francesa. No Brasil, foram adotados termos africanos para definir as aglomerações: kilombo (em banto, fortaleza), e mukambu (na língua quimbundo).
Os quilombos não eram um enclave isolado da sociedade e, exatamente por raramente sobreviver de forma autônoma, em geral se localizavam em áreas não muito distantes das regiões habitadas em que atividades econômicas eram desenvolvidas, embora obviamente se instalassem em pontos propícios para ocultação e fuga rápida, caso fosse necessário. Representavam um mundo dentro do universo mais amplo que era a sociedade escravista colonial e com esta mantinham uma relação complexa que incluía não apenas roubos de fazendas e organizações de fugas, mas trocas de produtos roubados ou gêneros alimentícios produzidos nos quilombos por outros gêneros necessários como favores, acoitamento, transporte e outros tipos de facilitação que comerciantes e homens pobres livres poderiam fornecer.
Embora fosse ameaça latente ao modo de vida então dominante – não apenas devido aos roubos, assaltos e fugas, mas exatamente pela interação e proximidade com as “franjas” da sociedade legal, que representavam um desafio à ordem vigente – a existência de agrupamentos de escravos fugidos “não necessariamente significava um estado de guerra sem fim” entre estes e os núcleos de povoamento e/ou de produção em torno dos quais os quilombos se formavam – como afirma Flávio dos Santos em Histórias de Quilombolas[1] –, até porque a existência destas aglomerações chegava a ser endêmica em muitos lugares, não só no período colonial, mas no Brasil Império também.
Pode-se ter uma noção tanto das estratégias de combate aos quilombos como das estratégias de sobrevivência destes em alguns ofícios do fundo Polícia da Corte, em especial os códices 323, 326, 327, 329, 403. Uma das questões específicas colocadas pela intendência de polícia diz respeito ao papel das tabernas e taberneiros na sobrevivência de negros fugidos e quilombolas, acusados muitas vezes de apoiarem os foragidos em troca de gêneros que estes lhes forneciam. Tentava-se controlar o horário de funcionamento destas tabernas, assim como sua localização – sendo aconselhado, por exemplo, que tais estabelecimentos se instalassem nas estradas gerais, onde seriam úteis aos viajantes de fato, e não aos fugitivos.
De fato, uma série de ofícios do fundo cita as tabernas também como ponto de encontro de negros e pardos, libertos ou não, alguns deles em fuga ou vindos de quilombos, onde muitas vezes eram acusados de desordem e manifestações impróprias – leia-se: dança e música. Os “batuques” de que eram acusados eram vistos, muitas vezes, como elemento de união de negros de variadas origens, que de outra forma não encontrariam oportunidade ou espaço para partilhar experiências festivas e culturais.
Os “batuques” incluíam práticas religiosas de origem africana, mas também podiam se referir apenas a música e dança. Assim, expressões culturais acabavam por tornar-se um elemento de resistência, na medida em que muitas vezes eram encaradas pelas autoridades e sociedade branca em geral como um desafio ou desrespeito às tradições dominantes, além de representar um momento oportuno de encontro entre indivíduos geralmente afastados por antigas rixas e rivalidades originadas dos conflitos étnicos na África. Uma dessas manifestações ganhou especial importância no cenário urbano, onde a relação do escravo com seu senhor e com o trabalho apresentava peculiaridades que tornavam a resistência, coerentemente, um pouco diferente daquela que ocorria nas áreas rurais: a capoeira.
A fuga permanente, por exemplo, não era um expediente tão utilizado na cidade, embora fosse comum o “sumiço” de um escravo por alguns dias, em especial no caso dos “escravos ao ganho,” que usufruíam uma liberdade de movimentos maior. No caso da capoeira, é difícil precisar quando e como ela surgiu, mas sabe-se que por volta de 1810 já era “moda” entre os jovens escravos e, poucos anos depois, uma das principais dores de cabeça das autoridades da corte encarregadas de zelar pela ordem pública.
A capoeira podia ser praticada como luta, dança, brincadeira ou passatempo. Perigosa, representava uma ameaça não apenas por causa dos constantes enfrentamentos entre grupos de capoeiras e forças de repressão, mas por ser uma afronta à população, uma vez que fazia das ruas da cidade palco para que uma população escrava – que explodira no Rio de Janeiro no início do século XIX – exibisse abertamente e com desenvoltura a sua presença e capacidade de se divertir, brigar e resistir.
Nas ruas do Rio de Janeiro, não eram raros apenas os enfrentamentos entre a guarda – chamados “morcegos” pelos negros – e os escravos e forros, tanto pela prática da capoeira como por outras práticas consideradas “ilegais” como o “jogo da casquinha,” denominação genérica de jogos de azar praticados pela população negra nas ruas da cidade. As brigas entre grupos rivais de escravos, ou forros, geralmente relacionados à capoeira, também ocorriam com freqüência e suscitavam igual preocupação por parte das autoridades.
Rivalidades e questões entre grupos de escravos e entre escravos e libertos eram frutos das diferentes vivências dentro do regime escravista. No caso dos escravos não nascidos no Brasil, mas trazidos da África, esta rivalidade – alimentada e utilizada pelos senhores, como fator de desagregação e controle de rebeliões – era normalmente fruto de guerras tribais, em especial no início do século XIX, com a intensificação destas guerras em algumas regiões da África. Estes africanos viam-se inseridos de forma repentina e violenta em uma situação de repressão e trabalhos forçados que fazia com que eles reagissem de uma forma um tanto diversa daquele que, já tendo nascido escravo no Brasil, não conhecia em primeira mão a experiência da liberdade; João José Reis, em A rebelião escrava no Brasil, explica:Os afro-brasileiros haviam nascido e se socializado na escravidão e, portanto, ao contrário dos africanos, não tinham um ponto de referência (e de radical contradição) fora dessa experiência [...], eles viviam suas próprias contradições com a escravidão.
Tais diferenças faziam com que, muitas vezes, os escravos nascidos no Brasil se afastassem daqueles que eram trazidos da África. O mesmo acontecia em relação aos libertos e escravos. Stuart Schwartz afirma, em Segredos Internos que,
[...] em várias ocasiões, negros e mulatos livres e, vez por outra, cativos crioulos, procuraram melhorar suas condições ou realizar mudanças políticas mas [...] sem forjar aliança com a população escrava, por vezes distanciando-se o mais possível daquela população.[3]
A repressão aos movimentos e manifestações de rebeldia e insurreição escrava variava não apenas de acordo com a época e o local onde a atividade econômica na qual o escravo se inseria, mas de acordo com a visão que as autoridades tinham de algumas destas manifestações. Um exemplo disso são os “batuques,” por vezes encarados como uma arruaça e uma oportunidade de organização de revoltas dos negros; os modos diferentes de vestir, dançar e cantar eram elementos de divisão entre grupos que já se reconheciam como diferentes. Estes encontros permitiam, também, um momento de distração e folga que representaria um alívio de um dia a dia muito penoso.
Como os quilombos constituíam um problema público e privado – de uma forma mais clara do que as questões relacionadas à desordem urbana causada por “propriedade particular,” ou seja, os escravos capoeiras – a sua repressão expressava esta dualidade. As tropas de busca e destruição incluíam pessoal contratado, e eram comandados por “capitães-do-mato” especificamente trazidos para este fim, e muitas vezes contavam com a valiosa ajuda de negros ou índios. Os proprietários dos escravos fugidos muitas vezes arcavam com as despesas de busca, ou pagavam pela recuperação das suas “peças”, como atesta a correspondência entre autoridades – inclusive o próprio vice-rei - em solo brasileiro, que hoje pode ser consultada no Arquivo Nacional. Esta correspondência pode ser encontrada em especial nos fundos Vice-reinado e Mesa do Desembargo do Paço, enquanto que as providências tomadas pelo poder público em relação aos quilombolas e escravos fugidos em outras capitanias podem ser estudadas nos ofícios da Série Interior.
As diversas maneiras com que os escravos reagiam a sua condição acabam por extrapolar a mera revolta ou insubordinação, inserindo-se em um cenário bem mais abrangente que mesclava elementos culturais e escolhas políticas variadas. A prática da capoeira, por exemplo, de origem ainda controversa, associava-se à prática de jogos de aposta e festas, sendo também forma de luta e defesa não apenas contra os agentes da ordem mas contra grupos rivais. Segundo Líbano Soares, em A capoeira escrava,seu entorno era a densa cultura urbana forjada por escravos no Rio de Janeiro [...] mais que um fato da resistência escrava, a capoeira informa das transformações étnicas e culturais que envolveram escravos e libertos, africanos e crioulos na cidade colonial, na passagem para a metrópole imperial.[4]
Da mesma forma, as aglomerações de escravos fugidos – quilombos e mocambos – mais do que apenas um meio de proteção física aos fugidos ou tentativa de reproduzir em solo brasileiro o modo de viver da antiga África – apesar da predominância de aspectos africanos, tornaram-se uma nova experiência a abrigar elementos políticos e culturais diversos seguindo uma estratégia muito própria de sobrevivência.
--------------------------------------------------------------------------------[1]Gomes, Flávio dos Santos. Histórias de quilombolas: mocambos e comunidades de senzalas no Rio de Janeiro (século XIX). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1993.
[2] Reis, João José. A rebelião escrava no Brasil: a história do levante dos malês (1835). Brasiliense: São Paulo, 1987.
[3] Schwartz, Stuart B. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial. Companhia das Letras: São Paulo, 1995
[4] Soares, Carlos Eugênio Líbano. A capoeira escrava e outras tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850). Campinas: ed. Unicamp-CECULT, 2001 -
Conjunto documental: Ordens Régias pelo Governo-Geral do Brasil e Governo do Rio de Janeiro
Notação: Códice 128, vol. 19
Datas - limite: 1765-1767
Título do fundo: Secretaria de Estado do Brasil
Código do fundo: 86
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ordem régia determinando a nomeação de Antonio Campos como capitão do mato da vila de Santo Antonio de Sá, que estava, segundo o secretário de estado, Francisco de Almeida Figueiredo, necessitando de um novo capitão do mato, pois era necessário impedir a evasão de escravos, e assim, evitar “os roubos e assassinatos que [os escravos] usam quando se acham nos seus chamados quilombos.”
Data do documento: 23 de novembro de 1765
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 27 - 28Conjunto documental: Correspondência de capitães-mores e comandantes de regimentos de vilas do Rio de Janeiro
Notação: caixa 484, pct.02
Datas - limite: 1771-1808
Título do fundo: Vice-reinado
Código do fundo: D9
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: relato de Ignácio de Andrada Souto Maior Rendon, coronel de milícias, sobre um “criminoso” chamado Narciso, que fugiu das terras de dona Anna Francisca pelas matas rumo a São João Marcos. Oito soldados cercaram a casa à noite e procuraram pela manhã nas matas, mas nada acharam. Dessa forma, sugere que o coronel Fernando Dias ajude nesta diligência e informa que o que facilitou a fuga, dentre outras coisas, foi o fato de existirem caminhos onde não há guardas e, conseqüentemente, rondas.
Data do documento: 6 de abril de 1805
Local: Marapicu
Folha(s):-Conjunto documental: Correspondência de capitães-mores e comandantes de regimentos de vilas do Rio de Janeiro.
Notação: caixa 484, pct.02
Datas - limite: 1771-1808
Título do fundo: Vice-reinado
Código do fundo: D9
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: carta de Felicíssimo José Vitorino de Souza, intendente de polícia, pedindo que seja enviado o sustento para a tropa que vem patrulhando as estradas e os matos à procura de “uns negros e de alguns brancos e mulatos” que, armados de espingarda, estariam roubando, matando e ferindo soldados e moradores e, ainda, estimulando vários escravos a fugirem.
Data do documento: 20 de setembro de 1805.
Local: Desterro de Cabo Frio.
Folha(s):-Conjunto documental: Correspondência de capitães-mores e comandantes de regimentos de vilas do Rio de Janeiro
Notação: caixa 484, pct.02
Datas - limite: 1771-1808
Título do fundo: Vice-reinado
Código do fundo: D9
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: carta de Felicíssimo José Vitorino de Souza informando que remete presos Geremias, Aleixo, João, Pedro e Domingos, negros quilombolas, acusados pelas mortes de soldados e de companheiros, a mando de Joaquim, considerado “rei” nos quilombos, e pede, juntamente com os senhores de fazendas, as suas cabeças caso sejam condenados, para que sirvam de exemplo a outros escravos. Informa também que outros negros foram presos e que seis conseguiram escapar. Assim, considera todos os atos ocorridos no distrito como um levante.
Data do documento: 12 de outubro de 1805
Local: Cabo Frio
Folha(s):-Conjunto documental: Correspondência de capitães-mores e comandantes de regimentos de vilas do Rio de Janeiro
Notação: caixa 484, pct.02
Datas - limite: 1771-1808
Título do fundo: Vice-reinado
Código do fundo: D9
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: carta de Felicíssimo José Vitorino de Souza informando que foi preso, ao comprar pólvora e chumbo, Domingos, “homem preto” quilombola, que estava matando, roubando e queimando casas em Cabo Frio. Na ocasião, fora preso também Manoel Ferreira de Santa Anna, acusado de proteger negros foragidos e de mandar matar, por ordem de Joaquim, “capitão do quilombo,” o filho de Miguel da Silva – mas, por engano acabou morrendo o pai – que estava em concubinato com sua mulher. Informa, ainda, que, à medida que os quilombolas são encontrados são presos.
Data do documento: 8 de outubro de 1805.
Local: vila de Nossa Senhora da Assunção de Cabo Frio
Folha(s):-Conjunto documental: Correspondência de Diversas Autoridades com Vice-Reis
Notação: Caixa 485, pct.02
Datas - limite: 1760-1808
Título do fundo: Vice-reinado
Código do fundo: D9
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: correspondência escrita por Luiz de França de Affonso, coronel do quartel de Icaraí, ao conde dos Arcos, d. Marcos de Noronha e Brito, vice-rei do Brasil, relatando a ordem verbal dada pelo vice-rei anterior, d.Fernando José de Portugal, o conde de Aguiar, no sentido de combater os quilombos. A correspondência relata que a diligência impetrada nos matos de Itaocara pelo capitão Paulo Pinto Muniz Brito, juntamente com os dois oficiais inferiores, quatro soldados e oito paisanos conseguiu capturar quatro escravos. Ficara determinado que os seus respectivos donos deveriam pagar 6$400 por cada escravo recuperado.
Data do documento: 3 de junho de 1807
Local: Icaraí
Folha(s): -Conjunto Documental: Registro de avisos, portarias, ordens e ofícios à Polícia da Corte, editais, provimentos, etc.
Notação: códice 318
Data-limite: 1808 - 1809
Código de fundo: Polícia da Corte
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: registro de ofício do intendente de polícia Paulo Fernandes Vianna para o capitão mor da cidade do Rio de Janeiro, José Pereira Guimarães, determinando que todo escravo fugido que for capturado seja preso na cadeia pública da cidade, só podendo ser entregue a seu senhor mediante despacho pago. Ofício foi estendido a Cabo Frio, Macacu, Magé e Rezende.
Data do documento: 13 de julho de 1808
Local: Rio de Janeiro
Folha: 39vConjunto documental: Tribunal do Desembargo do Paço
Notação: caixa 219, pct. 01
Datas - limite: 1809-1826
Título do fundo: Mesa do Desembargo do Paço
Código do fundo: 4K
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: acórdão proferido por Francisco Lopes de Souza de Faria Lemos sobre os autos do réu e preso Albano, oficial de ferreiro. Informa que o réu, por já não estar satisfeito, na manhã do dia 29 de outubro de 1798, ao ser repreendido por seu senhor atacou-o com uma faca dando-lhe vários golpes até a sua morte: um que rasgou da boca até a orelha esquerda, outro que atingiu o coração e os últimos foram em seu ombro. Como a mulher do falecido chegou para acudi-lo, foi atacada pelo réu, que a feriu profundamente no braço, não tendo danos maiores graças à intervenção de Manoel Vieira, aprendiz do réu, que deixou-o tonto com um golpe na cabeça, e do filho da vítima que, com uma espingarda, para se defender e proteger a mãe atirou contra ao escravo. Assim, como o réu confessou judicialmente o delito e pelo perigoso exemplo que poderia dar ao ficar vivo, a pena decretada foi a morte na forca e a posterior mutilação de seu corpo, para ser exposto até que o tempo as consumisse.
Data do documento: 3 de abril de 1810
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): doc. 02Conjunto documental: Registro da correspondência da Polícia. Ofícios da Polícia aos ministros de Estado, juizes do crime, câmaras, etc.
Notação: códice 323, vol. 02
Data-limite: 1810-1812
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: registro do ofício expedido ao ministro de estado dos negócios estrangeiros e da guerra pelo conde de Linhares, em que se discute o trabalho realizado no distrito de Macaé pelo sargento-mor João Luiz Pereira Vianna, que consistia em caçar quilombolas. Este documento fala da importância dos pardos e pretos que integravam as milícias que realizavam estas missões.
Data do Documento: 19 de Dezembro de 1810
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 38v e 39Conjunto documental: Correspondência de Diversas Autoridades com Vice-Reis.
Notação: IJJ9 468
Datas - limite:1806-1813
Título do fundo: Série Interior
Código do fundo: AA
Argumento de pesquisa: revolta de escravos
Ementa: cópia do ofício, escrito pelo conde de Palma, Francisco de Assis Mascarenhas, governador da capitania de Minas Gerais, ao capitão-mor agregado do termo de Vila Rica, Antônio Culalio da Rocha Brandão, determinando, a fim de acabar com os freqüentes ataques dos quilombolas à região de Mariana, a adoção de cinco medidas: averiguar as condições da “esquadra de pedestres;” checar o número completo de capitães do mato e de “pedestres” e se estes estão habilitados; se os comandantes utilizam a “esquadra de pedestres” pelo menos duas vezes por mês; verificar se o povo estava se sentindo seguro; e, por fim, averiguar quais são os distritos mais ‘infestados’ de negros fugidos.
Data do documento: 12 de fevereiro de 1811
Local: Vila Rica
Folha(s): -Conjunto documental: Relação de presos feitos na Polícia
Notação: códice 403, vol. 01
Data-limite: 1812-1816
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa:
Ementa: registro da prisão dos escravos, Felipe Lebolo, Manoel Benguela, José Benguela, Serafim Congo e Augusto Angola, todos por praticarem a capoeira, fazendo tal desordem que quebraram a perna de um negro que teve seu nome ignorado.
Data do documento: 5 de junho de 1811
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 8Conjunto documental: Relação de presos feitos na Polícia
Notação: códice 403, vol. 01
Data-limite: 1812-1816
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa:
Ementa: registro da prisão de Matheus, escravo de Fernando José de Sampaio, por ter corrido atrás de um soldado com um cutelo em sua mão.
Data do documento: 18 de junho de 1811
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 9Conjunto documental: Registro de ordens e ofícios expedidos da Polícia aos ministros criminais dos bairros e comarcas da Corte e ministros eclesiásticos
Notação: Códice 329, vol. 02
Datas - limite: 1811-1812
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE.
Argumento de pesquisa: quilombos.
Ementa: ofício expedido por Paulo Fernandes Vianna a Manoel Francisco Coelho. O autor manda Antônio José Ribeiro ir a diligência prender vários escravos que pertenciam ao coronel Manoel Caetano Pinto. Esses escravos, além de fugirem, ainda roubaram várias pedras preciosas do coronel. Fernandez Vianna ordena que Francisco Coelho auxilie essa diligência e que após a prisão dos escravos, os conduza à corte com segurança para evitar novas fugas. Ordena, também, a apreensão de tudo o que os escravos possuíssem, mesmo que não estivessem mais com as pedras preciosas.
Data do documento: 4 de junho de 1812.
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 166Conjunto documental: Ministério do Reino, Pernambuco, Correspondência do presidente da província
Notação: IJJ9 241
Datas - limite: 1785-1820
Título do fundo: Série Interior
Código do fundo: AA
Argumento de pesquisa: revolta dos escravos
Ementa: carta de Caetano Pinto de Miranda Montenegro informando ao ouvidor-geral da comarca das Alagoas, Antônio Batalha, que, após receber a sua carta no dia 27 de julho, ordenou ao marechal inspetor geral dos corpos milicianos que se dirigisse com uma tropa de linha para essa comarca, a fim de que sejam presos os mais de vinte escravos fugitivos da Bahia - considerados responsáveis “pelas primeiras sementes da sedição.” Os “cabeças” da sedição deveriam ser enviados à cadeia, os que tivessem graves indícios contra si, enviados à ilha de Fernando [de Noronha], já que lá não existem “escravos a quem possam contaminar.”
Data do documento: 2 de agosto de 1815
Local: Recife
Folha(s): 46Conjunto documental: Ministério do Reino, Pernambuco, Correspondência do presidente da província
Notação: IJJ9 241
Datas - limite: 1785–1820
Título do fundo: Série Interior
Código do fundo: AA
Argumento de pesquisa: revolta dos escravos
Ementa: carta de José Roberto Pereira da Silva, marechal inspetor-geral, relatando a Caetano Pinto de Miranda Montenegro, governador da capitania de Pernambuco, os primeiros dias de sua chegada à Vila das Alagoas. Informa que no dia 1 de agosto um grupo de negros armados que estavam saqueando casas em Tuquanduba fugiu pelas matas quando uma tropa pusera-se a combatê-los. Dessa forma, rondas foram distribuídas pela vila e elementos da tropa passaram a ocupar os lugares suspeitosos, a fim de que as munições de guerra ficassem seguras. Conclui, então, que continuará nesta diligência e anseia pela chegada dos índios para que quilombos ou locais onde se refugiam os negros possam ser descobertos.
Data do documento: 18 de agosto de 1815
Local: Vila das Alagoas
Folha(s): 54 e 54vConjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: registro feito por Paulo Fernandes Vianna, intendente de polícia, para o coronel José Maria Rebello de Andrade Vasconcelos e Souza, primeiro comandante da guarda real de polícia da corte, informando o reaparecimento dos negros capoeiras na cidade, trazendo desordens para diversos lugares. O intendente pede que o rei mantenha escoltas, principalmente nos dias santos, para que sejam presos todos que forem encontrados não só jogando mas também envolvidos em desordens.
Data do documento: 6 de abril de 1816
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 67Conjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício de Paulo Fernandes Vianna, intendente de polícia, para o coronel José Maria Rebello de Andrade Vasconcelos e Souza, primeiro comandante da guarda real de polícia da corte, em que defende que as desordens dos negros vinham sendo motivadas pelos jogos de “casquinha”, e que deveriam ser destacadas diferentes patrulhas pela cidade a fim de prender todos os negros que fossem encontrados jogando ou agrupados nas portas das tabernas. Os presos seriam levados a prisão do Calabouço para serem castigados com açoites e serviços de obras públicas.
Data do documento: 09 de Outubro de 1816
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 70Conjunto documental: Ministério do Reino, Pernambuco, Correspondência do presidente da província
Notação: IJJ9 241
Datas - limite: 1785–1820
Título do fundo: Série Interior
Código do fundo: AA
Argumento de pesquisa: revolta dos escravos
Ementa: carta de José Roberto Pereira da Silva, marechal inspetor-geral, relatando a Caetano Pinto de Miranda Montenegro, governador da capitania de Pernambuco, os primeiros dias de sua chegada à Vila das Alagoas. Informa que no dia 1 de agosto um grupo de negros armados que estavam saqueando casas em Tuquanduba fugiu pelas matas quando uma tropa pusera-se a combatê-los. Dessa forma, rondas foram distribuídas pela vila e elementos da tropa passaram a ocupar os lugares suspeitosos, a fim de que as munições de guerra ficassem seguras. Conclui, então, que continuará nesta diligência e anseia pela chegada dos índios para que quilombos ou locais onde se refugiam os negros possam ser descobertos.
Data do documento: 18 de agosto de 1815
Local: Vila das Alagoas
Folha(s): 54 e 54vConjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício de Paulo Fernandes Vianna, intendente de polícia, para o coronel José Maria Rebello de Andrade Vasconcelos e Souza, primeiro comandante da guarda real de polícia da corte, ordenando a prisão de todos os negros e mulatos que fossem encontrados em jogos ou capoeiras, pelos Rocios da Sé, Carioca, Santa Rita, São Domingos, Praça do Capim, São Francisco de Paula, São Joaquim e Praia dos Mineiros, cercando, prendendo e os conduzindo a prisão do Calabouço para ali ser dada a ‘correção que merecem’.
Data do documento: 05 de Setembro de 1817
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 76vConjunto documental: Ministério da Justiça
Notação: caixa 774, pct.03
Datas - limite: 1808-1817
Título do fundo: Ministério da Justiça
Código do fundo: 4v
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: carta de Antonio Felipe Soares de Andrada de Brederode, inspetor de crime da corte e casa, relatando que Manoel de Jesus, conhecido pela alcunha de “Cassamba” e escravo da Real Fazenda de Santa Cruz, está preso no Rio de Janeiro desde 19 de agosto de 1817 pela sua má conduta – fugas, roubos, dentre outros. Comunica também que o barão do Rio Seco e o administrador João Fernandes suplicam que o escravo não mais retorne, por considerar prejudicial a sua volta.
Data do documento: 21 de setembro de 1817
Local: Rio de Janeiro
Folha(s):-Conjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: registro do ofício de Paulo Fernandes Vianna, intendente de polícia, para o brigadeiro José Maria Rebello de Andrade Vasconcelos e Souza, primeiro comandante da guarda real de polícia da corte, no qual cita a prisão ilegal de Francisco, escravo de João dos santos Cardoso, preso e punido com 300 açoites, por estar jogando capoeira no Matadouro. O intendente averiguou o caso e constatou se tratar na verdade de vingança dos soldados contra o verdadeiro dono do negro, o senhor Francisco Batista, não existindo assim culpa nenhuma e nem capoeiragem. Paulo Fernandes defende a punição dos soldados, pedindo que no futuro a verdade seja averiguada na antes de ser dada punição aos suspeitos de crimes.
Data do documento: 14 de Março de 1818
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 77vConjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício de Paulo Fernandes Vianna, intendente de polícia, para o brigadeiro José Maria Rebello de Andrade Vasconcelos e Souza, primeiro comandante da guarda real de polícia da corte, na qual anuncia que ao serem feitas as buscas de armas portadas por negros, que sejam revistados os coletes e jalecos, pois estes estavam escondendo as armas em bolsos falsos nas golas. Tais buscas deveriam ser realizadas tanto de dia como de noite.
Data do documento: 09 de Julho de 1818
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 79Conjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício de Paulo Fernandes Vianna, intendente de polícia, para o brigadeiro José Maria Rebello de Andrade Vasconcelos e Souza, primeiro comandante da guarda real de polícia da corte, informando que os jogadores de casquinha continuavam se excedendo nos Rocios dos Ciganos, Carioca, Sé, Praia do [ilegível ] e de D. Manoel.
Data do documento: 26 de Janeiro de 1819
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 82 e 82vConjunto documental: Registros de Ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Conjunto documental: Registro de ofícios expedidos da Polícia para o governo das Armas da Corte, Marinha e mais patentes militares e ordenanças
Notação: Códice 326, vol.03
Datas - limite: 1818-1822
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício expedido ao comandante do distrito de Inhomerim, coronel Francisco Ramos Fialho pelo intendente da Polícia Paulo Fernandes Viana. Alerta sobre a aparente tolerância da polícia em relação aos quilombos e a consternação dos moradores com os quilombolas. Por isso, era necessária uma perseguição permanente da polícia contra os quilombos, intimando a cada freguesia do distrito de Inhomerim um homem para capitão-do-mato e doze homens para soldados, todos, obrigatoriamente, “com vigor e saúde, não devendo ser inúteis, estropiados, nem tão pequenos”.
Data do documento: 7 de janeiro de 1819
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 13 e13vConjunto documental: Registro de ofícios expedidos da Polícia para o governo das Armas da Corte, Marinha e mais patentes militares e ordenanças
Notação: Códice 326, vol.03
Datas - limite: 1818-1822
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício expedido ao coronel Domingos Francisco Ramos Fialho pelo intendente da Polícia, Paulo Fernandes Viana. Ordena o fechamento da taberna de Tristão José Duarte e a “conservação da grota em mato na circunferência de dez braços” próximo de nascentes. Tais providências objetivam o fim do provimento dos quilombos pelas tabernas próximas. Os taberneiros deveriam se estabelecer nas estradas gerais, onde podiam ser úteis aos viandantes.
Data do documento: 13 de junho de 1819
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 40Conjunto documental: Registro de ofícios expedidos da Polícia para o governo das Armas da Corte, Marinha e mais patentes militares e ordenanças
Notação: Códice 326, vol.03
Datas - limite: 1818-1822
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício expedido ao comandante do distrito de Taguaí, Luiz Barbosa de Sá Freire, pelo intendente da polícia, Paulo Fernandes Vianna. Alerta para o levantamento e fuga de escravos do comendador Antônio Gomes Barroso em Taguaí, além de escravos da fazenda do Mazomba, totalizando trinta e oito fugitivos. Ordena também o auxílio na captura dos escravos, fazendo respeitar “o direito dos senhores sobre os escravos,” através de batidas no mato e prisões de escravos, buscando o sossego e a tranqüilidade nessas fazendas.
Data do documento: 26 de janeiro de 1821
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 94vConjunto documental: Registro de ofícios expedidos da Polícia para o governo das Armas da Corte, Marinha e mais patentes militares e ordenanças
Notação: Códice 326, vol.03
Datas - limite: 1818-1822
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício expedido ao barão de Itanhaen pelo intendente da Polícia, Paulo Fernandes Viana, acusando os taberneiros de “acoitarem os ajuntamentos de negros em troca da venda de gêneros,” recebendo de volta artigos furtados por estes, nas estradas ou dos senhores de escravos. Tal contrabando resulta em muita desordem e mortes: por isso, o intendente da Polícia determina que as tabernas deveriam fechar às oito horas da noite, exceto as que estiverem no arraial ou nos portos públicos, aonde chegam as embarcações, podendo estas estar abertas até às dez horas da noite. Ameaça com a prisão, imposição de penas e ida a intendência da polícia aos taberneiros que admitirem nas tabernas os ajuntamentos de negros e jogos.
Data do documento: 6 de fevereiro de 1821
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 97 e 97vConjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: requerimento de João Inácio da Cunha, em que pede ao coronel Miguel Nunes Vidigal, que se acabe com todos os bailes de negros, pois deles resultam desordens e bebedeiras que incomodam os moradores da cidade.
Data do documento: 03 de Abril de 1821
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 95vConjunto documental: Registro de ofícios expedidos da Polícia para o governo das Armas da Corte, Marinha e mais patentes militares e ordenanças
Notação: Códice 326, vol.3
Datas - limite: 1818-1822
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício expedido ao comandante de São Gonçalo, coronel Luiz de França Machado de Fonseca pelo governador das armas da corte, Antônio Luiz Pereira da Cunha, em 29 de maio de 1821, do Rio de Janeiro. Constata a presença de quilombos pelos matos do distrito de São Gonçalo e de pretos fugidos que insultam os povos do local, ordenando a presença de uma escolta de capitães do mato para darem uma batida nos lugares suspeitos de existirem quilombos, no intuito de prenderem os malfeitores, ou seja, os pretos fugidos.
Data do documento: 29 de maio de 1821
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 110Conjunto documental: Registro de ofícios expedidos da Polícia para o governo das Armas da Corte, Marinha e mais patentes militares e ordenanças
Notação: Códice 326, vol.3
Datas - limite: 1818-1822
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício expedido ao capitão-mor da aldeia de Mangaratiba pelo senhor João Ignácio da Cunha. Ordena a prisão dos escravos fugitivos que estiverem acoitados, pelos indígenas e capitães do mato e avisa àquelas pessoas que se recusarem a colaborar, que serão presas e remetidas à Intendência da Polícia da Corte também. Além disso, os escravos presos serão remetidos às cadeias da corte, declarando-se os nomes dos seus senhores, no intuito de que estes dêem certo prêmio aos apreensores de seus escravos fugidos.
Data do documento: 2 de abril de 1822
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 133Conjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício de João Inácio da Cunha para o brigadeiro Miguel Nunes Vidigal, no qual informa a eventual existência de uma casa de quilombo de negros fugidos, no bico da rua da Guarda Velha, pedindo que sejam apreendidos todos os negros que se encontrarem nela e que sejam mandados para prisão do Calabouço, assim como dos donos desta casa.
Data do documento: 04 de Setembro de 1822
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 99vConjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício de João Inácio da Cunha, para o brigadeiro Miguel Nunes Vidigal, informando que por ocasião da prisão de quatro escravos furtados na Praia Pequena, foi levado ao seu conhecimento que na Pedreira de São Diogo, há um negro “canteiro e Monjollo” que alicia escravos para fugirem de seus senhores e os vende aos ciganos. Ordenando que caso seja encontrado este canteiro deverá ser preso.
Data do documento: 01 de Março de 1823
local: Rio de Janeiro
Folha(s): -Conjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício de Estevão Ribeiro de Resende para o brigadeiro Miguel Nunes Vidigal, que acompanha a cópia da ordem expedida pelo príncipe regente que se faça o ataque ao quilombo do Catumbi. Resende sugere fazer uma “batida e cerco” por metade da serra da Tijuca, mas acertará os detalhes e as medidas necessárias para o sucesso desta diligência em uma conferência que teria posteriormente com o brigadeiro.
Data do documento: 20 de Setembro de 1823
local: Rio de Janeiro
Folha(s): 110vConjunto documental: Relação de presos feitos na Polícia
Notação: códice 403, vol. 01
Data-limite: 1812-1816
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: escravos, punição
Ementa: registro de prisão do escravo João Benguela, pertencente a Jerônimo José, por gritar insultos contra uma patrulha, chamando-a de morcegos.
Data do documento: s.d
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 2Conjunto documental: Relação de presos feitos na Polícia
Notação: códice 403, vol. 01
Data-limite: 1812-1816
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: escravos, punição
Ementa: registro de prisão de Antônio Freitas, pardo forro; Francisco; Felício, pardo pertencente ao C. João Vieira, e Bento, crioulo pertencente a dona Maria Leonarda, por terem sido pegos jogando a casquinha e terem roubado no dito jogo.
Data do documento: s.d
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 3vConjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Ementa: ofício de Paulo Fernandes Vianna, intendente de polícia, para o brigadeiro José Maria Rebello de Andrade Vasconcelos e Souza, primeiro comandante da guarda real de polícia da corte, informando que no adro do palácio episcopal, costumava durante a noite juntarem-se negros fugidos e marinheiros para fazerem desordens, permanecendo ali até o amanhecer. O intendente pede que sejam mandados oficiais para este local á noite e que prendam todos que forem encontrados neste local.
Data do documento: s.d
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 83 -
Insurreição
Carta do marechal inspetor-geral, José Roberto Pereira da Silva, ao governador da capitania de Pernambuco, Caetano Pinto de Miranda Montenegro, informando sobre um grupo de negros armados que estavam saqueando casas em Tuquanduba. O documento revela o temor gerado pelos escravos fugitivos nas populações locais, além de possibilitar o conhecimento de algumas das medidas tomadas pelas autoridades para conter a suas ações e destruir os seus locais de refúgio.
Conjunto documental: Ministério do Reino, Pernambuco
Correspondência do presidente da província
Notação: IJJ9 241
Datas – limite: 1785–1820
Título do fundo: Série Interior
Código do fundo: AA
Argumento de pesquisa: escravos, revolta de
Data do documento: 18 de agosto de 1815
Local: Vila das Alagoas
Folha(s): 54 e54v“Il.mo. Ex.mo senhor, no dia 16 do corrente imediato em que participei a vossa excelência a minha chegada a esta vila, saiu dela o ouvidor-geral[1] dando as providências para alojar a tropa, e dando-me em breves horas a certeza que pouco havia que recear dos negros sublevados, e que por ter de ultimar a correição[2] da Atalaya precisava ir ali para com a possível brevidade ver devassar e autuar os presos compreendidos, ou suspeitosos deste ilegível, a um magistrado tão ativo, e zeloso como me mostrou no ofício de participação que dirigiu a v.ex.ª o mês passado sobre este mesmo objeto, não me pareceu convincente embaraçá-lo por saber tão bem naquela vila tem presos desta natureza, aos quais seria preciso acarear. Cuidei no mesmo dia em dar algumas providências, não só para acautelar qualquer insurreição dos negros[3] de fora, como para tranquilizar estes povos até a nossa chegada bastantemente assustados ainda mesmo pelos de dentro, e passando a ordem acontecida na cópia junta, pretendi no dia 18 ensaiar todos os corpos para ao toque de rebate saber cada um o posto que devia ocupar, porque com pequenas corporações, e as mais delas indisciplinadas, e armas desiguais supere a boa disposição de os arranjar, e instruir. Cumpridas as primeiras providências, e não concluída a segunda, eis que no dia 17 pelas onze horas da manhã, vejo o povo correr em aluvião, gritando que número de negros armados vinham cometer a Vila, saqueando casas pelo lugar de Tuquanduba distante meia légua; mandei logo tocar a rebate, e juntando-se para mais de duzentas praças milicianas e ordenanças que apoiadas pela tropa de Linha puseram-nos em fuga para dento das matas, e lugares por onde a mesma Tropa não os pôde vir, nem seguir.
Com aquela retirada recolheu-se a força armada, e dando-lhe tempo para se refazer, pelas quatro horas da tarde juntaram-se para mais de quatrocentas praças, que mandei dividir em corpos de todas as armas, e postá-los pelos lugares suspeitosos, distribuí rondas por todas a vila, recolhendo, e pondo em segurança as munições de guerra, e o cofre da conservatória das matas, por assim no requerer o respectivo ministro.
Depois da saída do ouvidor para Atalaya, algumas pessoas de reconhecido crédito, mas receosas de não se comprometerem com outros senhores de escravos[4] em que há indícios, (...), vieram delatá-los, e não obstante a ausência daquele ministro, para não aumentar-se o número dos sediciosos, mandei-os recolher a cadeia para logo que chegue serem interrogados, acareados e autuados. (...) Entre os presos, é incluída uma negra que já a denominavam Rainha, e recebia homenagens de tal; (...)Continuarei nesta diligência, como devo, e quando chegarem os índios que já pedi para os unir as armas de fogo, com eles cometeres o interior, para descobrir algum quilombo[5], ou emboscada onde se refugiem, ou se acutelem de que só aqueles são capazes (...) Confio muito nos oficiais que me acompanham pelas provas que me deram do seu zelo, e a atividade neste primeiro rebate, e não menos dos soldados de linha, milicianos e ordenanças, que aporfia imitam os primeiros. Neste momento se me apresentam duas companhias da 3º linha armadas com as armas (...) e deles me hei de servir segundo as circunstâncias o permitirem. Deus guarde a v.ex.ª (...) Quartel da vila de Alagoas, 18 de agosto de 1815. Il.mo ex.mo senhor Caetano Pinto de Miranda Montenegro Governador Capitão General desta Capitania de Pernambuco, e mais anexas. José Roberto Pereira da Silva Marechal Inspector Geral. O Secretário de Governo José Carlos Mairink da Silva Ferrão.”
[1] OUVIDOR: o cargo de ouvidor foi instituído no Brasil em 1534, como a principal instância de aplicação da justiça, atuando nas causas cíveis e criminais, bem como na eleição dos juízes e oficiais de justiça (meirinhos). Até 1548, a função de justiça, entendida em termos amplos, de fazer cumprir as leis, de proteger os direitos e julgar, era exclusiva dos donatários e dos ouvidores por eles nomeados. Neste ano foi instituído o governo-geral e criado o cargo de ouvidor-geral, limitando-se o poder dos donatários, sobretudo em casos de condenação à morte, entre outros crimes, e autorizando a entrada da Coroa na administração particular, observando o cumprimento da legislação e inibindo abusos. Cada capitania possuía um ouvidor, que julgava recursos das decisões dos juízes ordinários, entre outras ações. O ouvidor-geral, por sua vez, julgava apelações dos ouvidores e representava a autoridade máxima da justiça na colônia. Sua nomeação era da responsabilidade do rei, com a exigência de que o nomeado fosse letrado. Dentre as suas muitas atribuições, cabia-lhe informar ao rei do funcionamento das câmaras e, caso fosse necessário, tomar qualquer providência de acordo com o parecer do governador-geral. Ao longo do período colonial, o cargo de ouvidor sofreu uma série de especializações em função das necessidades administrativas coloniais. Dentre os cargos instituídos a partir de então, podemos citar o de ouvidor-geral das causas cíveis e crimes em 1609 (quando da criação da Relação do Brasil, depois desmembrada em Relação da Bahia e do Rio de Janeiro); o de ouvidor-geral do Maranhão em 1619, quando há a criação do Estado do Maranhão; e o de ouvidor-geral do sul em 1608, quando foi criada a Repartição do Sul.
[2] CORREIÇÃO: realizada pelos corregedores, cuja tarefa era percorrer a sua jurisdição para verificar o bom andamento da justiça, se os juízes de primeira instância – que lhes estavam subordinados – realizavam seu trabalho a contento. Os juízes de primeira instância não necessitavam de estudos formais, mas os corregedores precisavam ser formados em leis.
[3] INSURREIÇÃO DE ESCRAVOS: as insurreições de escravos já aconteciam no período colonial, mas apenas no código criminal do Império ela foi explicitamente definida. Nesse código criminal, definia-se insurreição como reunião de vinte ou mais escravos, que buscavam liberdade por meio de força, e para este crime estava prevista a morte dos principais líderes e açoite aos demais envolvidos. O pavor destas rebeliões no Brasil foi alimentado pela sangrenta revolta ocorrida no Haiti em fins do século XVIII. A formação de quilombos – aglomerações de escravos fugidos – nas franjas da sociedade colonial também inspirava medo permanente – apesar de tais aglomerações, de várias formas terem interagido com a sociedade legal, através do comércio –, não apenas por geralmente sobreviverem de um tipo de saques e roubos (quando não havia possibilidade de produção própria), mas principalmente pelo exemplo que representavam. Outras formas de expressão de não submissão à situação de cativo eram mais dispersas e individuais – e, algumas, mais radicais – como assassinatos de senhores e feitores, abortos provocados, diminuição do ritmo de trabalho, automutilação, infanticídios, morosidade, quebra dos instrumentos de trabalho, sabotagem da unidade produtora, tentativas de retorno à África entrando escondidos em navios, e suicídio.
[4] ESCRAVOS [AFRICANOS]: pessoas cativas, desprovidas de direitos, sujeitas a um senhor, como propriedades dele. Embora a escravidão na Europa existisse desde a Antiguidade, durante a Idade Média ela recuou para um estado residual. Com a expansão ultramarina, no século XV, revigorou-se, mas adquiriu contornos bem diferentes e proporções muito maiores. No mundo moderno, um grupo humano específico, que traria na pele os sinais de uma inferioridade na alma estaria destinado à escravidão. Diferentemente da escravidão greco-romana, onde certos indivíduos eram passíveis de serem escravizados, seja através da guerra ou por dívidas, o sistema escravocrata moderno era mais radical, onde a escravidão passa a ser vista como uma diferença coletiva, assinalada pela cor da pele, nas palavras do historiador José d'Assunção Barros, “um grupo humano específico traria na cor da pele os sinais de inferioridade” (“A Construção Social da Cor - Desigualdade e Diferença na construção e desconstrução do Escravismo Colonial. XIII Encontro de História da Anpuh-Rio, 2008). Muitos foram os esforços no sentido de construir uma diferenciação negra, buscando no discurso bíblico, justificativas para a escravidão africana. No Brasil, de início, utilizou-se a captura de nativos para formar o contingente de mão de obra escrava necessária a colonização do território. Por diversos motivos – lucro com a implantação de um comércio de escravos importados da África; dificuldade em forçar o trabalho do homem indígena na agricultura; morte e fuga de grande parte dos nativos para áreas do interior ainda inacessíveis aos europeus – a escravidão africana começou a suplantar a indígena em número e importância econômica quando do início da atividade açucareira em grande extensão do litoral brasileiro. Apesar disso, a escravidão indígena perduraria por bastante tempo ainda, marcando a vida em pontos da colônia mais distantes da costa e em atividades menos extensivas. O desenvolvimento comercial no Atlântico gerou, por três séculos, a transferência de um vasto contingente de africanos feitos escravos para a América. A primeira movimentação do tráfico de escravos se fez para a metrópole, em 1441, ampliando-se de tal modo que, no ano de 1448, mais de mil africanos tinham chegado a Portugal, uma contagem que aumentou durante todo o século XV. Tal comércio foi um dos empreendimentos mais lucrativos de Portugal e outras nações europeias. Os negros cativos eram negociados internacionalmente pelos europeus, mas estes, poucas vezes, tomavam para si a tarefa de captura dos indivíduos. Uma vez que o aprisionamento de inimigos e sua redução ao estado servil eram práticas anteriores ao estabelecimento de rotas comerciais ultramarinas, em geral consequência de guerras e conflitos entre diferentes reinos ou tribos, os comerciantes passaram a trocar estes prisioneiros por produtos de interesse dos grandes líderes locais (os potentados) e por apoio militar nos conflitos locais. Embora a escravização de inimigos fosse uma prática anterior à chegada dos europeus, deve-se salientar que o estatuto do escravo na África era completamente diferente daquele que possuía o escravo apreendido e vendido para trabalho nas Américas. Nos reinos africanos, a condição não era indefinida e nem hereditária, e senhores chegavam a se casar com escravas, assumindo seus filhos. O comércio com os europeus transformou os homens e sua descendência em mercadoria sem vontade, objeto de negociação mercantil. Os europeus passaram a instigar guerras e conflitos locais, de forma a aumentar a captura de possíveis escravos, desintegrando a antiga estrutura econômica e social dos reinos africanos. A produção historiográfica sobre a escravidão vem crescendo nos últimos anos, não só escravismo colonial, mas também o comércio de cativos para a própria Europa, sobretudo na bacia mediterrânea, têm sido estudados. A presença de escravos negros em Portugal tornar-se-ia uma constante no campo mas, sobretudo, nas cidades e vilas, onde podiam trabalhar em obras públicas, nos portos (carregadores), nas galés, como escravos de ganhos e domésticos, entre outros. No século XV, os negros africanos já tinham suas habilidades reconhecidas tanto em Portugal quanto nas ilhas atlânticas (arquipélagos de Madeira e Açores). Localizadas estrategicamente e com solo de origem vulcânica, logo foi implantado um sistema de colonização assentado na exploração de bens primários, como o açúcar. A escravidão foi um dos alicerces essenciais do sucesso desse empreendimento, que acabou sendo transferido para o Brasil, quando essa colônia se mostrou economicamente vantajosa. Dessa forma, no litoral da América portuguesa logo seria implantado o sistema de plantation açucareiro, com a introdução da mão de obra africana. E, ao longo do processo de colonização luso, o trabalho escravo tornou-se a base da economia colonial, presente nas mais diversas atividades, tanto no campo quanto nas cidades. Uma das peculiaridades da escravidão nesse período é representada pelos altos gastos dos proprietários com a mão de obra, muitas vezes mais cara do que a terra. Iniciar uma atividade de lucro demandava um alto investimento inicial em mão de obra, caso se esperasse certeza de retorno. A escravidão e a situação do escravo variavam, dentro de determinados limites, de atividade para atividade e de local para local. Mas de uma forma geral, predominavam os homens, já que o tráfico continuou suas atividades intensamente pois, ao contrário do que ocorria na América inglesa, por exemplo, houve pouco crescimento endógeno entre a população escrava na América portuguesa. Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco foram os principais centros importadores de escravos africanos do Brasil. Além de formarem a esmagadora maioria da mão de obra nas lavouras, nas minas, nos campos, e de ganharem o sustento dos senhores menos abastados realizando serviços nas ruas das vilas e cidades (escravos de ganho), preenchendo importantes nichos da economia colonial, os escravos negros também eram recrutados para lutar em combates. A carta régia de 22 de março de 1766, pela qual d. José I ordenou o alistamento da população, inclusive de pardos e negros para comporem as tropas de defesa, fez intensificar o número dessa parcela da população nos corpos militares. Ingressar nas milícias era um meio de ascensão social, tanto para o negro escravo quanto para o forro. A escravidão é um tema clássico da historiografia brasileira e ainda bastante aberto a novas abordagens e releituras. A perspectiva clássica em torno do tema é a do “cativeiro brando” e o caráter benevolente e não violento da escravidão brasileira, proposta por Gilberto Freyre em Casa Grande e senzala no início da década de 1930. Contestações a essa visão surgem na segunda metade do século XX, nomes como Florestan Fernandes, Emília Viotti, Clóvis Moura, entre outros, desenvolvem a ideia de “coisificação” do negro e as circunstâncias extremamente árduas em que viviam, bem como a existência de movimentos de resistência ao cativeiro, como é o caso das revoltas de escravos e a formação dos quilombos. Já perspectivas historiográficas recentes reviram essa despersonalização do escravo, considerando-o como agente histórico, com redes de sociabilidade, produções culturais e concepções próprias sobre as regras sociais vigentes e como os negros buscaram sua liberdade, contribuindo decisivamente para o fim da escravidão.
[5] QUILOMBO: o termo quilombo, derivado do banto kilombo, (acampamento ou fortaleza) foi usado pelos portugueses para designar as comunidades e povoações de escravos fugidos construídas em áreas rurais e urbanas ao longo do território da colônia. O mocambo (derivado do quimbundo mukambu), como também era conhecido aqui no Brasil, possuía uma estrutura social, política e cultural original, que procurava recompor as relações sociais e as identidades dos aquilombados, que haviam sofrido todo tipo de violência no seu cotidiano nas senzalas. O mais antigo mocambo que se tem registro no Brasil data de 1575, no interior da Bahia. A primeira legislação colonial que procura definir o que é o quilombo e estabelecer formas de repressão surge em 1740, quando o Conselho Ultramarino determina que os mocambos eram qualquer habitação de escravos fugidos que passassem de cinco pessoas. Principal foco de resistência dos negros fugidos de seus cativeiros, os quilombos foram duramente reprimidos pelas autoridades coloniais e depois imperiais, o que levou grande parte dos estudos em torno do tema a se basearem em informações retiradas de fontes militares, dificultando, em parte, as análises de aspectos não registrados por estes documentos. É o caso de alguns movimentos e formas de resistência de grupos, que pelas suas características e pelas circunstâncias, deixaram poucos registros escritos ou que se perderam. Apesar disto, pesquisas revelaram que estes espaços possibilitaram aos seus agentes a redefinição das diásporas africanas através de continuidades e rupturas com experiências trazidas não apenas da África, mas também das vivenciadas nos próprios cativeiros. Diferentemente do que muitos imaginam, as comunidades de quilombolas não eram apenas uma “reação” – via isolamento radical – ao regime escravocrata. Elas se integravam às suas regiões estabelecendo comércio com escravos e livres, entre esses negociantes locais, lavradores, mascates, taverneiros, sendo assim, quase reconhecidas, por partes destes, como comunidades de camponeses autônomos, que produziam principalmente mandioca (e derivados), legumes, cana, peixe e caça, entre outros produtos. Além disso, os aquilombados construíram uma rede de alianças com outros grupos sociais e até movimentos políticos, o que dificultou as tentativas de reescravização promovidas pelas autoridades locais, forçando-as à negociação. O maior e mais longevo quilombo foi o de Palmares, organizado em meio às densas florestas de palmeiras na Serra da Barriga em Pernambuco desde finais do século XVI. Palmares resistiu às incursões portuguesas e holandesas, sobrevivendo com o conhecimento de agricultura, pecuária, metalurgia, entre outras atividades, trazidas pelos seus integrantes. Apesar dos esforços do governo, a fuga e formação de quilombos continuaram a ocorrer, alcançando o século XIX como uma contínua ameaça ao sistema escravista.
Desordens Urbanas
Ofício de Paulo Fernandes Vianna, intendente de Polícia, para o coronel José Maria Rebello de Andrade Vasconcelos e Souza, primeiro comandante da guarda real de polícia da corte, em que defende que as desordens dos negros vinham sendo motivadas pelos jogos de “casquinha”, e que deveriam ser destacadas diferentes patrulhas pela cidade a fim de prender todos os negros que fossem encontrados jogando ou agrupados nas portas das tabernas. Os presos seriam levados a prisão do Calabouço para serem castigados com açoites e serviços de obras públicas.
Conjunto documental: Registro de ofícios da Polícia ao comandante da Real e depois Imperial Guarda da Polícia
Notação: códice 327, vol. 01
Data-limite: 1811-1815
Título do fundo: Polícia da Corte
Código do fundo: ØE
Argumento de pesquisa: quilombos
Data do documento: 9 de Outubro de 1816
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): 70Leia esse documento na íntegra
As desordens dos negros por esta cidade têm tido excesso, motivados pelos jogos de casquinha[1], que há publicamente nos Rocios[2], e pelos cantos, principalmente onde há tabernas, e já com motim e escândalo dos moradores, pelos alaridos, que fazem com excesso de bebidas. Deve Vossa Senhoria destacar diferentes patrulhas pela cidade, e dar ordens para todos aqueles que forem encontrados nos jogos forem presos, e conduzidos imediatamente à prisão do Calabouço[3] para serem castigados com açoites e serviço de obras públicas. Estas mesmas prisões se farão em todos os negros que forem encontrados à porta das tavernas assentados sobre os barris em que conduzem água, e aí em ajuntamento, donde se tem seguido imensas desordens: e por que em muitas das tabernas consta que os taberneiros consentem tais ajuntamentos pela utilidade que tira-o da venda de bebidas espirituosas, e outros gostos, que fazem nas tabernas, deve Vossa Senhoria isto mesmo recomendar as patrulhas para igualmente serem presos os mesmos taberneiros, pois resulta descrédito a polícia que havendo inúmeras patrulhas pela cidade, e um oficial que ronda sobre estas, ajuntamentos tais nos rocios, e portas de tavernas, resultando deles tais desordens continuadas, e mesmo queixas dos moradores. Recomendo muito a Vossa Senhoria que tenha todos os cuidados no bom êxito destas diligências, para que os povos conheçam quanto a polícia se entrega na segurança pública, e que para tais providências não precisa que se representem pelos moradores. Rio de Janeiro 9 de outubro de 1816 = Paulo Fernandes Vianna[4]= Senhor coronel José Maria Rebelo de Andrade.
[1] JOGOS DE CASQUINHA: denominação genérica para jogos de azar praticados, especialmente, pela população negra nas ruas do Rio de Janeiro. Sofria forte repressão por parte dos órgãos oficiais, não apenas por dar origem de aglomerações de indivíduos considerados “perigosos” pelas forças da ordem (escravos, escravos fugidos, capoeiras), mas também por muitas vezes incorporarem práticas ilegais características de jogos de azar, como a fraude, de onde os negros conseguiam obter algum ganho. Os jogos de casquinha, assim como a capoeiragem, aconteciam nas praças e esquinas, principalmente próximo a tabernas. Para tentar sanar o problema, em 1816 a Guarda Real foi advertida a destacar patrulhas para prender aqueles que fossem encontrados praticando esses jogos.
[2] ROSSIO: o termo rossio, por vezes grafado rocio, deriva de roça, de um terreno roçado, usado para usufruto coletivo. Os rossios eram campos de serventia pública, usados para pasto de animais, paragem de carruagens, feiras e atividades coletivas. Muitos tornaram-se largos e praças com a urbanização das cidades e conservaram o nome rossio. No Rio de Janeiro, havia dois importantes, o Rossio Grande, também chamado de Campo dos Ciganos, Campo da Lampadosa, Praça da Constituição e, como é chamada até os dias atuais, praça Tiradentes, e o Rossio Pequeno, a antiga praça Onze (praça 11 de junho), demolida no início dos anos 1940 para abertura da avenida Presidente Vargas. O Rossio Grande, quando da chegada da família real em 1808, era um campo com poucas casas ao redor, onde fora instalado o pelourinho da cidade e se faziam exercícios de artilharia, que, segundo o padre Luís Gonçalves dos Santos (o padre Perereca) na Memória para servir à História do Reino do Brasil, virava um lamaçal quando chovia. Já em 1813, época da construção do Teatro de São João, o Rossio já estava cercado de mais casas e construções, mais bem demarcado e urbanizado.
[3] CALABOUÇO: prisão subterrânea, naturalmente úmida e escura, onde os acusados de um delito eram postos em cárcere. No Rio de Janeiro, havia também uma prisão que recebia apenas escravos, embora estes também fossem encerrados em outros estabelecimentos. Localizada ao pé do Morro do Castelo, essa prisão era denominada Calabouço. Suas condições de insalubridade superavam as de outras cadeias, e escravos que haviam sido enviados pelos seus senhores, para que recebessem o castigo devido, dividiam o espaço exíguo com escravos fugidos e recuperados que aguardavam que seus senhores viessem buscá-los. Os presos tinham em comum o estatuto jurídico: eram todos propriedade de outrem. Por vezes, os escravos ali depositados permaneciam indefinidamente, pois seus senhores não estavam dispostos a arcar com as despesas devidas à sua manutenção. [ver CADEIA]
[4] VIANA, PAULO FERNANDES (1757-1821): nascido no Rio de Janeiro, Paulo Fernandes Viana era filho de Lourenço Fernandes Viana, comerciante de grosso trato, e de Maria do Loreto Nascente. Casou-se com Luiza Rosa Carneiro da Costa, da eminente família Carneiro Leão, proprietária de terras e escravos que teve grande importância na política do país já independente. Formou-se em Leis em Coimbra em 1778, onde exerceu primeiro a magistratura, e no final do Setecentos foi intendente do ouro em Sabará. Desembargador da Relação do Rio de Janeiro (1800) e depois do Porto (1804), e ouvidor-geral do crime da Corte foi nomeado intendente geral da Polícia da Corte pelo alvará de 10 de maio de 1808. De acordo com o alvará, o intendente da Polícia da Corte do Brasil possuía jurisdição ampla e ilimitada, estando a ele submetidos os ministros criminais e cíveis. Exercendo este cargo durante doze anos, atuou como uma espécie de ministro da ordem e segurança pública. Durante as guerras napoleônicas, dispensou atenção especial à censura de livros e impressos, com o intuito de impedir a circulação dos textos de conteúdo revolucionário. Tinha sob seu controle todos os órgãos policiais do Brasil, inclusive ouvidores gerais, alcaides maiores e menores, corregedores, inquiridores, meirinhos e capitães de estradas e assaltos. Foi durante a sua gestão que ocorreu a organização da Guarda Real da Polícia da Corte em 1809, destinada à vigilância policial da cidade do Rio de Janeiro. Passado o período de maior preocupação com a influência dos estrangeiros e suas ideias, Fernandes Viana passou a se ocupar intensamente com policiamento das ruas do Rio de Janeiro, intensificando as rondas nos bairros, em conjunto com os juízes do crime, buscando controlar a ação de assaltantes. Além disso, obrigava moradores que apresentavam comportamento desordeiro ou conflituoso a assinarem termos de bem viver – mecanismo legal, produzido pelo Estado brasileiro como forma de controle social, esses termos poderiam ser por embriaguez, prostituição, irregularidade de conduta, vadiagem, entre outros. Perseguiu intensamente os desordeiros de uma forma geral, e os negros e os pardos em particular, pelas práticas de jogos de casquinha a capoeiragem, pelos ajuntamentos em tavernas e pelas brigas nas quais estavam envolvidos. Fernandes Viana foi destituído do cargo em fevereiro de 1821, por ocasião do movimento constitucional no Rio de Janeiro que via no intendente um representante do despotismo e do servilismo colonial contra o qual lutavam. Quando a Corte partiu de volta para Portugal, Viana ficou no país e morreu em maio desse mesmo ano. Foi comendador da Ordem de Cristo e da Ordem da Conceição de Vila Viçosa, seu filho, de mesmo nome, foi agraciado com o título de barão de São Simão.
Levante
Carta de Felicíssimo José Victorino de Souza informando a prisão dos negros quilombolas Geremias, Aleixo, João, Pedro e Domingos, acusados de vários roubos e mortes, incluindo de um soldado. Segundo o documento, os assassinatos ocorreram a mando do negro Joaquim, considerado “rei” no quilombo, que também foi morto pelos prisioneiros. As agitações causadas por negros insurretos e quilombolas marcaram o período colonial deixando registrado em documentos como este, a violência do confronto entre brancos e negros, bem como a necessidade de que fossem aplicadas punições severas e exemplares.
Conjunto documental: Correspondência de capitães-mores e comandantes de regimentos de vilas do Rio de Janeiro
Notação: caixa 484, pct.02
Datas – limite: 1771-1808
Título do fundo: Vice-reinado
Código do fundo: D9
Argumento de pesquisa: Quilombos
Data do documento: 12 de outubro de 1805
Local: Cabo Frio
Folha(s): -
“Pelo Alferes de granadeiros do regimento do meu comando, João de Souza Braga, remeto presos os negros aquilombados[1], que constam da relação, que ponho na respeitável presença de V.Ex.ª, os quais foram uns presos, na ocasião em que roubaram no engenho[2] do capitão Antonio Gonçalves, e outros em um distante quilombo[3], no qual se levantaram com armas de fogo, por cuja causa mataram os soldados um negro, que dizem ser da viúva d. Teresa Gonçalves; e o mesmo levante fizeram os que roubaram a fazenda, os quais dispararam armas de fogo, escapando por felicidade os soldados sem maior incômodo. Do referido quilombo se escaparam seis, indo com eles um dos que capturaram ilegível nas ocasiões dos insultos, os quais tem sido tantos, que se considera ser um levante de negros, os quais tem inquietado todo este Distrito. Eu continuo nas mais eficazes diligências para as quais me é inteiramente necessário que V.Ex.ª se digne mandar que a Câmara assista com algum sustento para a tropa, sendo assim do agrado de V.Ex.ª . Os principais matadores dos que remeto presos, são Geremias, Aleixo, João, Pedro e Domingos, que já remeti com a parte á presença de V.Ex.ª , datada em oito do corrente, os quais fizeram várias mortes por mandado de um negro Joaquim a quem no Quilombo chamavam = Rei = e como tal o obedeciam, cujo rei, eles o mataram há poucos dias na ocasião, em que repartiam o roubo que fizeram a Joaquim Manoel, ao qual roubaram tudo quanto possuía, e o deixaram mortalmente ferido (...) Igualmente confessa o Geremias que foi ele quem matou o soldado do meu regimento, o que já participei a V.Ex.ª , sendo companheiro o negro Domingos, o qual pela confissão dos mesmos companheiros, se achava em todos os distúrbios, e também confessam, fizeram (...) várias mortes em alguns seus companheiros, o que tudo declararam perante várias testemunhas. São tantos os distúrbios, que estes insultadores têm feito, que não me posso dispensar de rogar a V.Ex.ª queira mandar vir para este Distrito as cabeças dos que forem justiçados, para exemplo, o que igualmente me requerem alguns senhores de fazendas, que julgam algum levante dos escravos[4] pelos distúrbios, que diariamente fazem os mesmos escravos, ao quais tem dado motivo de bem se suspeitar o referido. V.Ex.ª mandará o que for servido, a cujas determinações se humilhará sempre constante a minha fiel obediência. Deus guarde a V.Ex.ª . Cabo Frio[5], doze de Outubro de mil oitocentos e cinco. Felicíssimo José Victorino de Souza. ”
[1] AQUILOMBADOS: os aquilombados eram os escravos fugitivos que se refugiavam em quilombos. [Ver QUILOMBOS]
[2] ENGENHO DE AÇÚCAR: durante o período colonial o termo “engenho” designava o mecanismo usado para moer a cana, no início do processo de preparo do açúcar. Passa a referir-se ao complexo no qual se fabricava açúcar e toda área da fazenda – as terras, as plantações, a capela, a casa senhorial, a senzala, as ferramentas, e a moenda – posteriormente, desde a segunda metade do século XIX, conceito cunhado por historiadores e estudiosos da agricultura e economia coloniais. Os engenhos de cana (moendas) se dividiam em dois tipos: os engenhos reais, movidos a água – que apresentavam maior riqueza e complexidade, empregavam um grande número de oficiais de serviço e trabalhadores especializados, contavam com grande contingente de mão de obra escrava, grande plantação própria (além de comprar a produção de engenhos menores) e possuíam toda a maquinaria para produzir o açúcar, cobrindo todo o processo – e os movidos a tração animal – menores em tamanho e capacidade de produção, exigiam investimentos inferiores, também chamados engenhocas ou trapiches, e mais utilizados na produção de aguardente. Os engenhos, como unidades produtivas, tiveram um papel central na colonização, ocupação e povoamento do território da colônia. A maior parte da primeira geração de senhores de engenho não era formada por nobres ou grandes investidores, mas por plebeus que auxiliaram na conquista e povoamento da costa brasileira. Com o tempo, a expansão do açúcar e o consequente aumento da sua importância para a economia metropolitana, o status do senhor de engenho cresceu proporcionalmente. Os engenhos constituíam verdadeiros núcleos populacionais, em torno dos quais e de suas capelas, se formavam vilas e se construíam as defesas das fronteiras das capitanias. Os grandes engenhos tinham em torno de 60 a 100 escravos, e muito poucos ultrapassavam a marca de 150-200 cativos, dos quais, em média, 75% trabalhavam nos campos, 10% na manufatura do açúcar, e o restante dedicava-se a atividades domésticas ou não relacionadas ao trato açucareiro. Os engenhos, assim como o açúcar, tinham grande valor, mas um alto custo: as terras, o beneficiamento, os instrumentos, os escravos, as construções encareciam a produção, que apresentava, em geral, baixos rendimentos, descontados os gastos do senhor. A maior parte dos engenhos era muito pouco ou não lucrativa, fazia o suficiente para sua subsistência, ou lucrava mesmo com a produção da aguardente. Algumas poucas unidades geraram fortunas; a maioria rendia pouco e muitos acumularam grandes dívidas. Ao contrário do que comumente se pensa, a capitania que mais concentrava engenhos, em quantidade e grandeza, era a Bahia, e não Pernambuco, seguida pelo Rio de Janeiro, e então por aquela. A lucratividade variava muito, de acordo com: a safra de cana (influenciada pelas condições climáticas e de solo); as epidemias que assolavam vez ou outra a população escrava e de trabalhadores pobres; a falta de gêneros (como lenha, água, animais) e as dívidas que se acumulavam. Apesar das dificuldades, os engenhos não eram abandonados, e a produção açucareira, embora oscilasse de acordo com as ofertas e demandas do mercado europeu e suas colônias, não perdeu sua importância no Brasil. Os engenhos representavam um microcosmo da sociedade aristocrática rural, apoiada no poder patriarcal e político do senhor, base da sociedade brasileira em construção, bem analisada por Gilberto Freyre em sua obra. Mais do que representação de riqueza, o engenho tinha grande importância simbólica, um signo de poder e um sinal de distinção. Os senhores de engenho dominaram a política local durante décadas e, até o século XVIII, ocuparam a maior parte dos postos de oficial nas milícias locais, formando durante todo o período colonial um poderoso grupo de pressão, uma vez que a metrópole precisava de sua lealdade e de seus investimentos para manter a colônia e torná-la rentável. Havia uma hierarquia entre os senhores de engenho, que dependia basicamente da tradição da família e do tipo de propriedade que possuíam. Embora a maior parte dos lucros resultantes da produção de açúcar se concentrasse na atividade comercial, era a produção agrícola que concedia prestígio e poder.
[3] QUILOMBO: o termo quilombo, derivado do banto kilombo, (acampamento ou fortaleza) foi usado pelos portugueses para designar as comunidades e povoações de escravos fugidos construídas em áreas rurais e urbanas ao longo do território da colônia. O mocambo (derivado do quimbundo mukambu), como também era conhecido aqui no Brasil, possuía uma estrutura social, política e cultural original, que procurava recompor as relações sociais e as identidades dos aquilombados, que haviam sofrido todo tipo de violência no seu cotidiano nas senzalas. O mais antigo mocambo que se tem registro no Brasil data de 1575, no interior da Bahia. A primeira legislação colonial que procura definir o que é o quilombo e estabelecer formas de repressão surge em 1740, quando o Conselho Ultramarino determina que os mocambos eram qualquer habitação de escravos fugidos que passassem de cinco pessoas. Principal foco de resistência dos negros fugidos de seus cativeiros, os quilombos foram duramente reprimidos pelas autoridades coloniais e depois imperiais, o que levou grande parte dos estudos em torno do tema a se basearem em informações retiradas de fontes militares, dificultando, em parte, as análises de aspectos não registrados por estes documentos. É o caso de alguns movimentos e formas de resistência de grupos, que pelas suas características e pelas circunstâncias, deixaram poucos registros escritos ou que se perderam. Apesar disto, pesquisas revelaram que estes espaços possibilitaram aos seus agentes a redefinição das diásporas africanas através de continuidades e rupturas com experiências trazidas não apenas da África, mas também das vivenciadas nos próprios cativeiros. Diferentemente do que muitos imaginam, as comunidades de quilombolas não eram apenas uma “reação” – via isolamento radical – ao regime escravocrata. Elas se integravam às suas regiões estabelecendo comércio com escravos e livres, entre esses negociantes locais, lavradores, mascates, taverneiros, sendo assim, quase reconhecidas, por partes destes, como comunidades de camponeses autônomos, que produziam principalmente mandioca (e derivados), legumes, cana, peixe e caça, entre outros produtos. Além disso, os aquilombados construíram uma rede de alianças com outros grupos sociais e até movimentos políticos, o que dificultou as tentativas de reescravização promovidas pelas autoridades locais, forçando-as à negociação. O maior e mais longevo quilombo foi o de Palmares, organizado em meio às densas florestas de palmeiras na Serra da Barriga em Pernambuco desde finais do século XVI. Palmares resistiu às incursões portuguesas e holandesas, sobrevivendo com o conhecimento de agricultura, pecuária, metalurgia, entre outras atividades, trazidas pelos seus integrantes. Apesar dos esforços do governo, a fuga e formação de quilombos continuaram a ocorrer, alcançando o século XIX como uma contínua ameaça ao sistema escravista.
[4] ESCRAVOS [AFRICANOS]: pessoas cativas, desprovidas de direitos, sujeitas a um senhor, como propriedades dele. Embora a escravidão na Europa existisse desde a Antiguidade, durante a Idade Média ela recuou para um estado residual. Com a expansão ultramarina, no século XV, revigorou-se, mas adquiriu contornos bem diferentes e proporções muito maiores. No mundo moderno, um grupo humano específico, que traria na pele os sinais de uma inferioridade na alma estaria destinado à escravidão. Diferentemente da escravidão greco-romana, onde certos indivíduos eram passíveis de serem escravizados, seja através da guerra ou por dívidas, o sistema escravocrata moderno era mais radical, onde a escravidão passa a ser vista como uma diferença coletiva, assinalada pela cor da pele, nas palavras do historiador José d'Assunção Barros, “um grupo humano específico traria na cor da pele os sinais de inferioridade” (“A Construção Social da Cor - Desigualdade e Diferença na construção e desconstrução do Escravismo Colonial. XIII Encontro de História da Anpuh-Rio, 2008). Muitos foram os esforços no sentido de construir uma diferenciação negra, buscando no discurso bíblico, justificativas para a escravidão africana. No Brasil, de início, utilizou-se a captura de nativos para formar o contingente de mão de obra escrava necessária a colonização do território. Por diversos motivos – lucro com a implantação de um comércio de escravos importados da África; dificuldade em forçar o trabalho do homem indígena na agricultura; morte e fuga de grande parte dos nativos para áreas do interior ainda inacessíveis aos europeus – a escravidão africana começou a suplantar a indígena em número e importância econômica quando do início da atividade açucareira em grande extensão do litoral brasileiro. Apesar disso, a escravidão indígena perduraria por bastante tempo ainda, marcando a vida em pontos da colônia mais distantes da costa e em atividades menos extensivas. O desenvolvimento comercial no Atlântico gerou, por três séculos, a transferência de um vasto contingente de africanos feitos escravos para a América. A primeira movimentação do tráfico de escravos se fez para a metrópole, em 1441, ampliando-se de tal modo que, no ano de 1448, mais de mil africanos tinham chegado a Portugal, uma contagem que aumentou durante todo o século XV. Tal comércio foi um dos empreendimentos mais lucrativos de Portugal e outras nações europeias. Os negros cativos eram negociados internacionalmente pelos europeus, mas estes, poucas vezes, tomavam para si a tarefa de captura dos indivíduos. Uma vez que o aprisionamento de inimigos e sua redução ao estado servil eram práticas anteriores ao estabelecimento de rotas comerciais ultramarinas, em geral consequência de guerras e conflitos entre diferentes reinos ou tribos, os comerciantes passaram a trocar estes prisioneiros por produtos de interesse dos grandes líderes locais (os potentados) e por apoio militar nos conflitos locais. Embora a escravização de inimigos fosse uma prática anterior à chegada dos europeus, deve-se salientar que o estatuto do escravo na África era completamente diferente daquele que possuía o escravo apreendido e vendido para trabalho nas Américas. Nos reinos africanos, a condição não era indefinida e nem hereditária, e senhores chegavam a se casar com escravas, assumindo seus filhos. O comércio com os europeus transformou os homens e sua descendência em mercadoria sem vontade, objeto de negociação mercantil. Os europeus passaram a instigar guerras e conflitos locais, de forma a aumentar a captura de possíveis escravos, desintegrando a antiga estrutura econômica e social dos reinos africanos. A produção historiográfica sobre a escravidão vem crescendo nos últimos anos, não só escravismo colonial, mas também o comércio de cativos para a própria Europa, sobretudo na bacia mediterrânea, têm sido estudados. A presença de escravos negros em Portugal tornar-se-ia uma constante no campo mas, sobretudo, nas cidades e vilas, onde podiam trabalhar em obras públicas, nos portos (carregadores), nas galés, como escravos de ganhos e domésticos, entre outros. No século XV, os negros africanos já tinham suas habilidades reconhecidas tanto em Portugal quanto nas ilhas atlânticas (arquipélagos de Madeira e Açores). Localizadas estrategicamente e com solo de origem vulcânica, logo foi implantado um sistema de colonização assentado na exploração de bens primários, como o açúcar. A escravidão foi um dos alicerces essenciais do sucesso desse empreendimento, que acabou sendo transferido para o Brasil, quando essa colônia se mostrou economicamente vantajosa. Dessa forma, no litoral da América portuguesa logo seria implantado o sistema de plantation açucareiro, com a introdução da mão de obra africana. E, ao longo do processo de colonização luso, o trabalho escravo tornou-se a base da economia colonial, presente nas mais diversas atividades, tanto no campo quanto nas cidades. Uma das peculiaridades da escravidão nesse período é representada pelos altos gastos dos proprietários com a mão de obra, muitas vezes mais cara do que a terra. Iniciar uma atividade de lucro demandava um alto investimento inicial em mão de obra, caso se esperasse certeza de retorno. A escravidão e a situação do escravo variavam, dentro de determinados limites, de atividade para atividade e de local para local. Mas de uma forma geral, predominavam os homens, já que o tráfico continuou suas atividades intensamente pois, ao contrário do que ocorria na América inglesa, por exemplo, houve pouco crescimento endógeno entre a população escrava na América portuguesa. Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco foram os principais centros importadores de escravos africanos do Brasil. Além de formarem a esmagadora maioria da mão de obra nas lavouras, nas minas, nos campos, e de ganharem o sustento dos senhores menos abastados realizando serviços nas ruas das vilas e cidades (escravos de ganho), preenchendo importantes nichos da economia colonial, os escravos negros também eram recrutados para lutar em combates. A carta régia de 22 de março de 1766, pela qual d. José I ordenou o alistamento da população, inclusive de pardos e negros para comporem as tropas de defesa, fez intensificar o número dessa parcela da população nos corpos militares. Ingressar nas milícias era um meio de ascensão social, tanto para o negro escravo quanto para o forro. A escravidão é um tema clássico da historiografia brasileira e ainda bastante aberto a novas abordagens e releituras. A perspectiva clássica em torno do tema é a do “cativeiro brando” e o caráter benevolente e não violento da escravidão brasileira, proposta por Gilberto Freyre em Casa Grande e senzala no início da década de 1930. Contestações a essa visão surgem na segunda metade do século XX, nomes como Florestan Fernandes, Emília Viotti, Clóvis Moura, entre outros, desenvolvem a ideia de “coisificação” do negro e as circunstâncias extremamente árduas em que viviam, bem como a existência de movimentos de resistência ao cativeiro, como é o caso das revoltas de escravos e a formação dos quilombos. Já perspectivas historiográficas recentes reviram essa despersonalização do escravo, considerando-o como agente histórico, com redes de sociabilidade, produções culturais e concepções próprias sobre as regras sociais vigentes e como os negros buscaram sua liberdade, contribuindo decisivamente para o fim da escravidão.
[5] CABO FRIO: região litorânea no sudeste da América portuguesa descoberta em 1503, por ocasião da segunda expedição exploradora enviada pelo rei de Portugal d. Manuel I. Sob o comando de Gonçalo Coelho, contou com a participação do navegador Américo Vespúcio, responsável pela fundação da feitoria de Cabo Frio, destinada à exploração do pau-brasil existente na praia do Cabo da Rama, atual praia dos Anjos em Arraial do Cabo. Junto com a feitoria, foi edificada uma fortaleza com a finalidade de guarnecer o litoral. A cidade de Nossa Senhora da Esperança de Cabo Frio foi fundada em 1615, pelo capitão Constantino Menelau após a expulsão de cinco naus holandesas da região. Além da abundância de pau-brasil, Cabo Frio se destacava por ser um porto de fácil atracagem de navios para o embarque de produtos, em especial madeiras, corantes e gêneros do reino animal, como peixes, tartarugas, óleo de baleias etc. Cabo Frio foi palco da Confederação dos Tamoios, conflito violento entre os índios Tamoios, aliados dos franceses, e os Tupiniquim e portugueses. No final do século XVI, os Tamoios de Cabo Frio tinham sido de tal modo dizimados que já não havia notícias deles.
Pena de Morte
Acórdão proferido por Francisco Lopes de Souza de Faria Lemos sobre os autos do réu, Albano, oficial de ferreiro. Segundo o documento, réu teria atacado com uma faca o seu senhor, golpeando-o até a morte, e ferido a mulher do falecido. Tendo confessado judicialmente o delito, o réu foi condenado à pena de morte na forca com a posterior mutilação do seu corpo para não se tornar um exemplo perigoso.
Conjunto documental: Tribunal do Desembargo do Paço
Notação: caixa 219, pct.01
Fundo ou coleção: Mesa do Desembargo do Paço
Datas limites: 1809-1826
Código de fundo: 4K
Argumento de pesquisa: quilombos
Data do documento: 3 de abril de 1810
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): doc. 02Leia esse documento na íntegra
“Acórdão[1] em relação V.Sª . Vistos estes autos, que com o parecer do seu regedor[2] se fizeram sumários ao réu preso Albano, oficial de ferreiro, por haver morto seu senhor Manoel de Oliveira dos Santos, e ferir sua senhora, mulher deste, d. Thomásia Theodora do Rosário. Mostra-se que o réu, trazendo má vontade ao dito seu senhor por não querer consentir no quartamento[3] por ele pretendido, fizera uma faca, que trazia sempre consigo para se aproveitar da primeira ocasião que tivesse de executar o bárbaro desígnio de se vingar do falecido, e que de fato oferecendo-se-lhe esta manhã do dia 29 de outubro de 1798, pelo repreender o dito seu senhor, se lançou sobre ele com aquela própria faca, como reconheceu no auto (...), até o matar, dando-lhe o primeiro golpe no rosto, que rasgou do canto da boca até a orelha esquerda; segundo no peito da parte esquerda, que penetrou até o coração, que se via, abrindo-se os lábios de tão cruel ferida; e o terceiro golpe no ombro, ao tempo de cair morto, o que presenciavam todas as testemunhas (...). Mostra-se mais, que o animo do réu era o de matar toda aquela família, se o pudesse conseguir; porquanto, acudindo a mulher do morto, para livrar seu marido, se voltou também contra ela o réu com a mesma faca, procurando, e forcejando quanto lhe foi possível para o matar, o que não conseguiu pela fortuna, que sua senhora teve de receber grave todas as facadas em um capote, que trazia aos ombros, e de que se valeu para as aparar, ficando crivado delas, exceto uma facada que a feriu profundamente no braço, varando-o de parte a parte, e de lhe acudir a testemunha (...) Manoel Vieira, que assim jura de fato próprio, o qual era aprendiz do réu, e lhe descarregou então uma bordoada na cabeça, que o tonteou; motivo porque não pôde ultimar seu intento, e por acudir também um filho dela, tomando o réu a deliberação de se ir valer de uma espingarda, que de antemão tinha pronta, e carregada em sua senzala[4], para de uma vez acabar com todos, como ele ameaçou praticar; pelo que o dito filho temeroso de ser morto com sua mãe, lançou mão de outra espingarda, e com ela prevenindo-se, atirou logo sobre o réu, ferindo-lhe gravemente, e a ponto de o derrubar por terra; do que resultou não poder ele continuar nos seus execrandos atentados como juram uniformemente de notoriedade, e publicidade constante todas as testemunhas do sumário, e da devassa[5], e de vista as testemunhas (...). O réu não se atreveu a negar, ou a obscurecer a enormidade do delito no auto (...), fazendo uma confissão judicial justa, clara, espontânea, e absolutamente uniforme com o juramento das testemunhas presentes, que super abundantemente atestam a existência do mesmo delito, e o deliberado ânimo, com que o réu o perpetrou, estendendo-se a sua ferocidade até contra a mulher, e filho do morto, seu senhor: pelo que resulta do processo a prova inteira, e segura, que o Direito requer para a imposição da pena de que o réu não pode ser relevado, quando consumou não só um homicídio, que é crime atrocíssimo, de que se horroriza a natureza, porém um homicídio que na censura de direito equivale ao parricídio, atentando contra a segurança pública, e até contra aquela da própria família, de que ele fazia parte, e rompendo a subordinação, que o mesmo Direito estabelece do Escravo para o Senhor, e que manda que se regulem as penas à proporção da gravidade do delito, a qual se conhece pelo dano que recebe a Sociedade Civil da Sua perpetração; sendo certo, que é tanto mais execrável, quanto são mais respeitáveis os direitos perfeitos, que se quebrantam: Do que se infere, que o réu cometeu uma morte violenta, que deu a seu senhor, um delito de funestíssimas conseqüências, e pela impunidade do qual se dará um perigosíssimo exemplo em dano da existência política deste Estado, que se faz a Suprema Lei em todos os casos.Portanto, e pelo mais dos outros, condenem ao réu a que com baraço e pregão seja conduzido ao lugar da forca, e nela morra morte natural para sempre, e que separada depois a cabeça, e decepadas as mãos, sejam postas na mesma forca, até que o tempo as consuma, e pague as custas. Rio, 3 de abril de 1810.= Como Reg.or Botelho = Souza = Baptista Rodrigues = D. Amorim = Saraiva = Negrão Coelho = Ordonhes =. Francisco Lopes de Souza de Faria Lemos.”
[1] ACÓRDÃO: trata-se de uma decisão emitida em grau de recurso por um tribunal coletivo, administrativo ou judicial.
[2] REGEDOR: autoridade administrativa civil nomeada pela Câmara Municipal para manter a ordem em determinada freguesia. Eram cargos providos pelo presidente da Câmara e tinham função de autoridade policial.
[3] QUARTAMENTO: também chamado de coartação, era um sistema de pagamento parcelado da alforria devido ao senhor pelo escravo. As alforrias podiam ser concedidas ou compradas, e neste caso, nem sempre o escravo conseguia amealhar todo o valor de uma vez, então fazia a coartação, na qual parcelava o valor, habitualmente por ano ou semestre (ao menos nas Minas Gerais, onde foi bastante comum entre os séculos XVIII e XIX), em um total de quatro a seis anos, podendo haver variações. Enquanto pagava, o estatuto permanecia sendo escravo – caso uma escrava tivesse filhos nesse intervalo, seriam também cativos, até que o pagamento fosse finalizado. Os escravos conseguiam reunir algum pecúlio quando trabalhavam ao ganho ou por jornada (na qual já pagavam ao senhor uma parcela do resultado obtido com seu trabalho); quando faziam trabalhos fora de suas atividades habituais; na região de minas ou rurais, com o garimpo e a criação de animais ou produção de alimentos; e também com a ajuda de irmandades negras ou de esmolas.
[4] SENZALA: alojamento destinado à moradia dos escravos de uma fazenda ou de uma casa senhorial. O termo senzala é originário da língua banto (ramo de vários idiomas da África centro ocidental) e popularizou-se no Brasil através destes povos, sobretudo a partir do final do século XVIII. As moradas dos cativos também eram chamadas pelos viajantes e pela população local de choça, cabana, choupana, palhoça e mocambo, sendo ainda denominadas simplesmente de “casa de negros”. Robert Slenes, em Na Senzala, uma flor (2011), distingue três tipos de moradia: as senzalas " pavilhão”, edifício único com pequenos recintos ou cubículos separados para os escravos solteiros e casados, as senzalas " barracão”, onde viveriam escravos e escravas solteiros em grandes recintos separados, e as senzalas " cabana" , onde viveriam escravos casados ou solteiros de um mesmo sexo. Havia também a senzala em quadra, isto é, edifícios contínuos erigidos em formato retangular e subdivididos em compartimentos ou cubículos, todos voltados para um terreiro ou pátio com entrada única guardada por um portão de ferro. No Brasil, as senzalas geralmente ficavam próximas da habitação da família proprietária, ao contrário de outros lugares das Américas. Essa proximidade permitia maior vigilância sobre os escravos, mas também abria caminho para que os diferentes grupos – brancos e negros – partilhassem alguns traços culturais e linguísticos. A senzala acabou por se tornar local de reconstrução, na medida do possível, de uma identidade partida, onde laços entre grupos oriundos de regiões e etnias diferentes acabavam se formando em consequência da convivência forçada.
[5] DEVASSA: a devassa era um processo ou rito processual judicial estabelecido nas Ordenações do Reino, de natureza criminal, com características inquisitoriais, que concedia pouco ou nenhum direito de defesa ao acusado. Esse rito processual vigorou no Brasil até a promulgação do Código Criminal do Império, em 1830. Nas Ordenações Filipinas, assim como previsto nas Manuelinas, as devassas se dividiam em gerais e especiais: as gerais versavam sobre delitos incertos e eram realizadas anualmente, sendo de competência do juiz de fora, ordinários e corregedores; as devassas especiais supunham a existência de um delito já cometido, cuja a autoria era incerta. A primeira tinha por objetivo o delito de autor incerto e eram tiradas uma vez por ano; a segunda se ocupava somente da autoria incerta. (Lucas Moraes Martins. Uma Genealogia das Devassas na História do Brasil. http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3245.pdf). Havia também as devassas eclesiásticas, instrumento extrajudicial e temporário acionado por ocasião da presença do visitador do Tribunal Eclesiástico a uma localidade, em geral longe dos centros, com o objetivo de observar o controle dessa população no tocante ao cumprimento da doutrina católica e à conduta atentatória à família e aos bons costumes. Um Auto de Devassa é uma peça produzida no decorrer do processo judicial que reúne as petições, termos de audiências, certidões, entre outros itens.
Punições
Carta de Antônio Felipe Soares d’Andrada de Brederode pedindo a punição de negros capoeiras cativos em praça pública. Segundo o documento, eram conhecidos por capoeiras negros forros, livres e cativos, que eram procurados pela Polícia por cometerem delitos frequentes no Rio de Janeiro. Em função do temor que a sociedade colonial nutria de levantes de escravos, a punição aos delitos cometidos pelos negros deveria servir de exemplo aos outros. Através desta carta, percebe-se ainda uma certa distinção feita entre negros forros e cativos quanto aos castigos recebidos, embora a intenção do exemplo fosse a mesma.
Conjunto documental: Ministério da Justiça
Notação: caixa 774, pct.03
Datas – limite: 1808-1817
Título do fundo: Ministério da Justiça
Código do fundo: 4v
Argumento de pesquisa: Revolta de escravos
Data do documento: 27 de fevereiro de 1817
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): -“Senhor, Sendo frequentes os delitos preparados por indivíduos desta cidade, forros[1] e livres uns; cativos outros; conhecidos pela denominação de capoeiras[2]; tem a vigilante Polícia[3] buscado capturá-los, as Justiças processá-los, e a Casa da Suplicação[4] sentenciá-los com exemplar zelo e interesse do Chanceler que serve de Regedor[5], especialmente nas visitas da Cadeia em que é juiz. Quanto aos forros é uma das penas aflitivas a de açoites pelas ruas públicas; quanto aos cativos na grade da cadeia, e no calabouço. Mas como o principal fim seja o exemplo aterrador dos cativos parecia conseguir-se melhor, sendo dados os açoites nos cativos[6] em Praças mais públicas, e lugares onde estes maus indivíduos capoeiras costumam fazer suas paradas e depois suas desordens e delitos. Mas, como não esteja em uso prático serem açoitados no Pelourinho[7] e Praça do Rossio, na do Capim, na da Sé, e outras, não me atrevendo a fazer esta inovação, posto que a julgue necessária, e haja agora ocasião com dois escravos, um crioulo, outro de Nação condenados em açoites, sou a pedir a Vossa Majestade pelo expediente desta Secretaria de Estado dos Negócios do Brasil queira expedir as ordens a este respeito ao Chanceler que serve de Regedor, (...) para este informar, e ficarem registrados nos livros da Relação para terem o seu devido efeito. Vossa Majestade mandará o que justo lhe parecer ao seu Real Serviço. Rio de Janeiro, 27 de fevereiro de 1817. O Corregedor do Crime da Corte e Casa Antônio Felipe Soares de Andrade de Brederode”
[1] FORROS: eram considerados forros os ex-escravizados que haviam obtido a alforria, por meio de uma carta, por testamento ou no momento do batismo. Até a segunda metade do século XVII encontra-se a expressão “índio forro” com o sentido de libertar gentio como eram chamados os indígenas da suposta barbárie em que viviam, pela ótica cristã. Para Eduardo França Paiva, as alforrias são um componente da escravidão e já no mundo antigo eram praticadas com frequência. Alforria, como lembra esse autor, é um termo de origem árabe e equivale a libertar. Mas no mundo romano as libertações de escravos já ocorriam com frequência, chamadas de manumissões. Entre os ibéricos, com a escravidão introduzida no Novo Mundo, os forros ou resgatados foram sua imediata contrapartida. A ideia de resgate era bem conhecida dos portugueses que haviam tido que resgatar cristãos cativos no Norte da África. A partir do século XVII o aumento de africanos escravizados na América portuguesa provocou também a quantidade e variedade de tipos de alforrias, compradas, obtidas por negociação entre senhor e escravo, prometidas. A área das minas foi um catalizador para entrada de um imenso contingente de escravos no Brasil e fez surgir outra configuração social, com vilas e arraiais nos quais a maioria era de escravos, forros e nascidos livres. Ao final do setecentos torna-se comum que libertos passassem a possuir escravos, que da mesma forma lograram ser alforriados dentro da mesma lógica dos seus proprietários forros. Mas, como conclui França, a ascensão desses forros não apagava o seu passado naquela sociedade escravista. A combinação do nome com a categoria imposta e a condição jurídica acompanhava os “pretos forros” ou “mulato forro” até que acabasse por se dissipar. (Cf. FRANÇA, E. O. Alforria. In: GOMES, F., SCHWARCZ, Lilia M. Dicionário da escravidão e liberdade, 2018)
[2] CAPOEIRA: o termo remete a algumas versões quanto à sua origem. Capoeiras eram campos abertos onde escravos fugidos praticavam uma espécie de luta ritual. Atribuía-se também a denominação a um tipo de cesto usado pelos escravos de ganho para transportar aves e verduras pelas ruas da cidade. A luta que praticavam entre si teria recebido o nome dos cestos. De uma forma ou de outra, a capoeira floresceu nas cidades e arredores de Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro, sendo sempre alvo de repressão e inspirador de temor. Se a origem da prática é rural ou urbana permanece pouco clara; foi, contudo, no início do século XIX, que ela se espalhou de forma avassaladora entre os escravos da cidade do Rio de Janeiro – transformada em corte –, tornando-se um problema de ordem pública de proporções inesperadas. Uma forma de dança e luta ritualizada, representava um momento de congraçamento, mas também de enfrentamento entre diversas etnias africanas, colocadas todas, à força, sob um mesmo rótulo e vivendo no mesmo local. Além disso, passou a ser um meio de ataque e defesa fundamental na resistência à repressão dos movimentos, manifestações e presença dos negros nas ruas da cidade. Em 2014, a UNESCO reconheceu a capoeira como patrimônio cultural imaterial da humanidade.
[3] INTENDENTE DE POLÍCIA: a Intendência de Polícia foi uma instituição criada pelo príncipe regente d. João, através do alvará de 10 de maio de 1808, nos moldes da Intendência Geral da Polícia de Lisboa. A competência jurisdicional da colônia foi delegada a este órgão, concentrando suas atividades no Rio de Janeiro, sendo responsável pela manutenção da ordem, o cumprimento das leis, pela punição das infrações, além de administrar as obras públicas e organizar um aparato policial eficiente e capaz de prevenir as ações consideradas perniciosas e subversivas. Na prática, entretanto, a Polícia da Corte esteve também ligada a outras funções cotidianas da municipalidade, atuando na limpeza, pavimentação e conservação de ruas e caminhos; na dragagem de pântanos; na poda de árvores; aterros; na construção de chafarizes, entre outros. Teve uma atuação muito ampla, abrangendo desde a segurança pública até as questões sanitárias, incluindo a resolução de problemas pessoais, relacionados a conflitos conjugais e familiares como mediadora de brigas de família e de vizinhos, entre outras atribuições. O aumento drástico da população na cidade do Rio de Janeiro, e consequentemente, da população africana circulando nas ruas da cidade a partir de 1808, esteve no centro das preocupações das autoridades portuguesas, e nela reside uma das principais motivações para a estruturação da Intendência de Polícia que, ao contrário do que vinha ocorrendo no Velho Mundo, deu continuidade aos castigos corporais junto a uma parcela específica da população. Foi a estrutura básica da atividade policial no Brasil na primeira metade do século XIX, e apresentava um caráter também político, uma vez que vigiava de perto as classes populares e seu comportamento, com ou sem conotação ostensiva de criminalidade. Um dos traços mais marcantes da manutenção desta ordem política, sobreposta ao combate ao crime, se expressa em sua atuação junto à população negra – especialmente a cativa – responsabilizando-se inclusive pela aplicação de castigos físicos por solicitação dos senhores, mediante pagamento. O primeiro Intendente de Polícia da Corte foi Paulo Fernandes Vianna, que ocupou o cargo de 1808 até 1821, período em que organizou a instituição. Subordinava-se diretamente a d. João VI, e a ele prestava contas através dos ministros. Durante o período em que esteve no cargo, percebe-se que muitas funções exercidas pela Intendência ultrapassavam sua alçada, em especial àquelas relacionadas à ordem na cidade e às despesas públicas, por vezes ocasionando conflitos com o Senado da Câmara. Desde a sua criação, a Intendência manteve uma correspondência regular com as capitanias, criando ainda o registro de estrangeiros.
[4] CASA DA SUPLICAÇÃO: era o órgão judicial responsável pelo julgamento das apelações de causas criminais envolvendo sentenças de morte. A Casa da Suplicação de Lisboa era o tribunal de segunda instância ganhou estatuto das mãos de Filipe I em fins do século XVI, embora a sua constituição tivesse ocorrido ao longo das décadas anteriores. Era a corte suprema diante da qual respondiam os tribunais de relação. Compunha-se de diversos órgãos, com funções distintas. Os cargos mais altos da Casa eram o de regedor e o de chanceler. Atuava nas comarcas da metade sul do país e nos territórios de além-mar, com exceção da América portuguesa e da Índia. No Brasil, este órgão foi instalado na Corte pelo alvará de 10 de maio de 1808, com atribuições semelhantes à Casa da Suplicação de Lisboa e em substituição ao Tribunal da Relação, existente na cidade desde 1752. Considerada como Supremo Tribunal de Justiça, nela eram resolvidos todos os juízos e apelações em última instância, como as sentenças de morte. Suas atribuições eram similares às da Casa da Suplicação de Lisboa. Nesse sentido, compunha-se de vários órgãos com funções distintas de caráter jurídico-administrativo, destacando-se o Juízo dos Agravos e Apelações; a Ouvidoria do Crime; o Juízo dos Feitos da Coroa e da Fazenda; o Juízo do Crime da Corte; o Juízo do Cível da Corte e o Juízo da Chancelaria. O distrito de atuação compreendia as áreas do centro-sul da América, além da superposição dos agravos provenientes do Pará, Maranhão, Ilha dos Açores e Madeira e Relação da Bahia. Era composta por um regedor, um chanceler da Casa, oito desembargadores dos Agravos, um corregedor do Crime da Corte e da Casa, um juiz dos Feitos da Coroa e da Fazenda, um procurador, um corregedor do Cível da Corte, um juiz da Chancelaria, um ouvidor do Crime, um promotor de Justiça e seis extravagantes.
[5] REGEDOR: autoridade administrativa civil nomeada pela Câmara Municipal para manter a ordem em determinada freguesia. Eram cargos providos pelo presidente da Câmara e tinham função de autoridade policial.
[6] CATIVO: os conflitos entre europeus cristãos e os povos islâmicos da África e Oriente Médio desde o final da Idade Média tiveram entre suas práticas a captura de reféns, de ambos os lados, com o objetivo de obter regates ou vantagens em negociações posteriores. Não era incomum a troca de reféns e nem a negociação coletiva de cativos. A partir do século XVII, o conflito entre os povos islâmicos e cristãos foi representado, no norte da África, basicamente por esta prática de captura e troca de prisioneiros, muitas vezes envolvendo súditos das coroas ibéricas. Alguns destes cativos passavam anos à espera de resgate, período em que eram mantidos e por vezes negociados como servos de famílias de elite locais. Na sociedade colonial luso-brasileira, o termo era sinônimo de escravo.
[7] PELOURINHO: coluna de pedra colocada em lugar público de cidade ou vila, onde as autoridades municipais exerciam a sua autoridade e justiça. O pelourinho serviu como instrumento de castigo, onde o réu era posto com baraço – tipo de corda – e pregão para, depois de lida a sentença, ser açoitado ao som de tambores que serviam para abafar os gritos do castigado e chamar a atenção dos espectadores. Essa forma de repressão se destinava, principalmente, aos escravos, negros forros, mulatos, mestiços. Dentre os muitos homens isentos do pelourinho estavam o clero, os juízes, os altos administradores e os oficiais de tropa. As primeiras notícias referentes ao levantamento de pelourinhos no Brasil colônia foram fornecidas por Mem de Sá em 1558. Em 1626, foi lembrado pelo ouvidor-geral Luís Nogueira de Brito, a necessidade de ser erguer, no Rio de Janeiro, um pelourinho.
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GOMES, Flávio dos Santos. Histórias de quilombolas: mocambos e comunidades de senzalas no Rio de Janeiro (século XIX). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1993.
Moura, Clóvis. Rebeliões da senzala: quilombos, insurreições, guerrilhas. Conquista: Rio de Janeiro, 1972.
REIS, João José. A rebelião escrava no Brasil: a história do levante dos malês (1835). Brasiliense: São Paulo, 1987.
SCHWARTZ, Stuart B. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial. Companhia das Letras: São Paulo, 1995.
SOARES, Carlos Eugênio Líbano. A capoeira escrava e outras tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850). Campinas: ed. Unicamp-CECULT, 2001.
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