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Marquês do Lavradio

Diversificação de culturas

Escrito por Super User | Publicado: Terça, 06 de Fevereiro de 2018, 11h26 | Última atualização em Quarta, 14 de Abril de 2021, 14h52

Carta do marquês do Lavradio ao marquês de Angeja sobre a remessa de conchas de tatus, conchinhas e búzios, que algumas pessoas consideravam um remédio para "moléstias de pedra". Comenta também sobre os poucos progressos da Academia Botânica e sobre a necessidade de desenvolvê-la para que o comércio baseado no uso das plantas seja iniciado. Finalmente, enumera algumas culturas que principiara durante sua administração, como a da seda e a do trigo.

Conjunto documental: Marquês do Lavradio
Notação: AP-41
Data-limite: 1758-1791
Título do fundo: Marquês do Lavradio
Código do fundo: RD
Argumento de pesquisa: marquês do Lavradio
Data do documento: 5 de outubro de 1772
Local: Rio de Janeiro
Folha(s): carta nº 389

Carta de Amizade Escrita ao Marquês de Angeja[1] a 5 de outubro de 1772 pelo Corsário Santana Carmo e São José Capitão José Gomes

 

Ilm° e Exm° Sr.

 

(...)

Nesta ocasião não remeto a V. Exª mais que duas conchas de tatus, uma pequena, e outra talvez a maior que V. Exª tenha visto: vão também umas conchinhas, que me parecem célebres, e uns búzios, pequeninos, a que dão o nome de em branco que além da sua galantaria, dizem ser um remédio admirável, para as moléstias de pedra[2], fazendo reduzir alguns destes a pó muito sutil, e tomando algumas pequenas porções dele em água, ou em qualquer outra bebida: (...).

Os progressos da Academia Botânica[3], pouco, posso por ora dizer a V. Exª, mais do que continua a trabalhar-se nela, porém vai isto muito devagar, porque como estas gentes, não têm o interesse que os anime, esmorecem com grande (de) facilidade, e se não fosse um tal ou qual respeito de um Vice-Rei[4], já estaria talvez de toda extinta. (...) Se nossa Corte[5] de lá animar este negócio, creio que não só será de muita glória para a nação, mas também de muita utilidade, porque nas admiráveis plantas que temos, encontramos excelentes bálsamos, gomas, óleos, raízes, cascas[6], e finalmente mil outras cousas maravilhosas, que podem aumentar infinitamente o comércio, (...).

 

O objeto de seda[7] tenho eu já bastantemente principiado; o de fabricar anil[8], que aqui são matos, também já se acha principiado a praticar; o da cultura do trigo[9], para evitar que entre na América imensidade de farinhas que os estrangeiros nos trazem do Norte[10] também já este ano teve princípio nesta CapitaL[11], e espero que para o ano em toda esta Capitania, haja uma grande colheita; para a ilha de Santa Catarina e Rio Grande mandei também a receita do modo de fazer queijos, e a manteiga, que nos poderá também fazer desnecessários estes gêneros que compramos aos estrangeiros, porém isto tudo está muito no princípio, e como são cousas de novo, que estas gentes nunca viram, enquanto não tomam o gosto as utilidades custa muito fazê-los trabalhar, porém com modo, e algum jeito tudo se vai conseguindo. A seda pode ser em tal abundância como V. Exª poderá julgar sabendo que em Portugal, só têm as amoreiras[12] folhas três meses no ano, e na América dez, e que os bichos, produzem à mesma proporção além disto o tamanho da folha, é duas e três partes maior que a nossa de Europa, agora considere V. Exª esta facilidade de produção em um País tão vasto, se será capaz de fornecer todo o preciso para as nossas manufaturas[13], sem o mendigarmos dos estrangeiros, e ainda a estes levarmos o que nos for de sobejo.

 

(...). Rio de Janeiro.

 

Ilm° e Exm° Sr. Marquês de Angeja.

 

Marquês do Lavradio[14].

 

[1] MONIZ, D. JOSÉ XAVIER DE NORONHA CAMÕES DE ALBUQUERQUE DE SOUSA (1741-1811): 6.º conde de Vila Verde e 4.º marquês de Angeja. Filho de uma das principais famílias do reino, rica e influente junto aos monarcas, possuía terras em Vila Verde dos Francos e em Angeja. Casou-se com uma das filhas do 2º marquês do Lavradio, o que lhe trouxe mais influência política, sendo profundo defensor da monarquia e dos reis. Grã-Cruz da Ordem de Santiago e da Torre Espada, Gentil-homem da câmara da rainha d. Maria I, transferiu-se junto com a Corte portuguesa para o Brasil em 1808. Entre as suas atuações na vida pública luso-brasileira destacam-se as suas nomeações como: Conselheiro de Estado e do Conselho Supremo Militar e de Justiça no Rio de Janeiro; presidente da Mesa do Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens; presidente da Junta da Administração do Tabaco, além de ser marechal do exército e governador das armas da Corte.

[2] MOLÉSTIAS DE PEDRA: pedra nos rins, cálculo renal, litíase ou nefrolitíase são formações sólidas compostas pela cristalização de substâncias da urina, que atacam as vias urinárias. Tais moléstias já eram mencionadas em textos médicos desde a antiguidade e a litotomia – intervenção para remoção de pedras – um dos primeiros procedimentos cirúrgicos conhecidos. Podem provocar dores lombares intensas, sangue na urina, suspensão ou diminuição do fluxo urinário, necessidade frequente de urinar e infecções.

[3] ACADEMIA BOTÂNICA: fundada em 18 de fevereiro de 1771 e desativada em 1779, a Academia Científica do Rio de Janeiro foi um espaço de estudo das ciências naturais, debate e socialização de descobertas e informações sobre os recursos naturais do Brasil. Sediada no palácio dos vice-reis, era filiada à Academia Real das Ciências da Suécia. Sua formação se deu sob o patrocínio do vice-rei dom Luís de Almeida Portugal Soares de Alarcão Eça e Melo Silva Mascarenhas, marquês do Lavradio. Foi a primeira academia de ciências no mundo luso-brasileiro, uma vez que as academias organizadas anteriormente eram voltadas à produção de cunho letrado, literária, como a Academia Brasílica dos Esquecidos, de 1724. Formada por médicos, farmacêuticos e cirurgiões entre outros profissionais, a Academia Científica do Rio de Janeiro teve como primeiro presidente o médico José Henriques Ferreira. À Academia coube ainda a manutenção de um horto botânico. A associação ressurgiu em 1786 sob a égide do vice-rei d. Luis de Vasconcelos e Souza como Sociedade Literária do Rio de Janeiro, vindo a sofrer devassa em 1794, na administração do conde de Resende, acusada de conspirar contra a Coroa e a Igreja.

[4] VICE-REI: até o ano de 1720, o posto administrativo mais alto da colônia era habitualmente o de governador-geral, tendo sido por três vezes o título de vice-rei atribuído ao marquês de Montalvão (1640-1641), ao conde de Óbidos (1663-1667) e ao marquês de Angeja (1714-1718), homens de alta fidalguia no Reino. A partir de 1720, a denominação foi substituída definitivamente pelo de vice-rei, tendo sido o primeiro o conde de Sabugosa, Vasco Fernandes César de Meneses (1720-1735). O novo termo, tal como se usava já no estado da Índia desde o século XVI, deixava mais clara a ideia de um império português, constituído por territórios ultramarinos pertencentes a Portugal e a ele submissos. Contudo, em termos concretos, a mudança de nome não trouxe nenhuma alteração significativa, e a administração continuou a mesma. O Brasil não constituiu um vice-reinado unificado e a utilização do título explicita mais uma decisão política do que administrativa. A utilização da nova denominação para o posto mais alto do Estado do Brasil (os estados do Grão-Pará e Maranhão tinham governadores independentes) expressava, na verdade, a nova preponderância dos territórios brasileiros, entre si e em decorrência da expansão aurífera e relativa decadência do vice-reinado da Índia, do que transformações concretas no plano administrativo. Com a chegada da família real portuguesa em 1808, o Brasil passou a ser, em 1815, Reino Unido e acabou com o cargo de vice-rei, tendo o último sido o conde dos Arcos, d. Marcos de Noronha e Brito (1806-1808).

[5] PORTUGAL: país situado na Península Ibérica, localizada na Europa meridional, cuja capital é Lisboa. Sua designação originou-se de uma unidade administrativa do reino de Leão, o condado Portucalense, cujo nome foi herança da povoação romana que ali existiu, chamada Portucale (atual cidade do Porto). Compreendido entre o Minho e o Tejo, o Condado Portucalense, sob o governo de d. Afonso Henriques, deu início às lutas contra os mouros (vindos da África no século VIII), das quais resultou a fundação do reino de Portugal no século XIII. Tornou-se o primeiro reino a constituir-se como Estado Nacional após a Revolução de Avis em 1385. A centralização política foi um dos fatores que levaram o reino a ser o precursor da expansão marítima e comercial europeia, constituindo vasto império com possessões na África, nas Américas e nas Índias ao longo dos séculos XV e XVI. Os séculos seguintes à expansão foram interpretados na perspectiva da Ilustração e por parte da historiografia contemporânea como uma lacuna na trajetória portuguesa, um desvio em relação ao impulso das navegações e dos Descobrimentos e que sobretudo distanciou os portugueses da Revolução Científica. Era o “reino cadaveroso”, dominado pelos jesuítas, pela censura às ideias científicas, pelo ensino da Escolástica. Para outros autores tratou-se de uma outra via alternativa, a via ibérica, sem a conotação do “atraso”. O século XVII é o da união das coroas de Portugal e Espanha, período que iniciado ainda em 1580 se estendeu até 1640 com a restauração e a subida ao trono de d. João IV. Do ponto de vista da entrada de novas ideias no reino deve-se ver que independente da perspectiva adotada há um processo, uma transição, que conta a partir da segunda metade do XVII com a influência dos chamados “estrangeirados” sob d. João V, alterando em parte o cenário intelectual e mesmo institucional luso. Um momento chave para a história portuguesa é inaugurado com a subida ao trono de d. José I e o início do programa de reformas encetado por seu ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, o marquês de Pombal. Com consequências reconhecidas a longo prazo, no reino e em seus domínios, como se verá na América portuguesa, é importante admitir os limites dessa política, como adverte Francisco Falcon para quem “por mais importantes que tenham sido, e isso ir-se-ia tornar mais claro a médio e longo prazo, as reformas de todos os tipos que formam um conjunto dessa prática ilustrada não queriam de fato demolir ou subverter o edifício social” (A época pombalina, 1991, p. 489). O reinado de d. Maria I a despeito de ser conhecido como “a viradeira”, pelo recrudescimento do poder religioso e repressivo compreende a fundação da Academia Real de Ciências de Lisboa, o empreendimento das viagens filosóficas no reino e seus domínios, e assiste a fermentação de projetos sediciosos no Brasil, além da formação de um projeto luso-brasileiro que seria conduzido por personagens como o conde de Linhares, d. Rodrigo de Souza Coutinho. O impacto das ideias iluministas no mundo luso-brasileiro reverberava ainda os acontecimentos políticos na Europa, sobretudo na França que alarmava as monarquias do continente com as notícias da Revolução e suas etapas. Ante a ameaça de invasão francesa, decorrente das guerras napoleônicas e face à sua posição de fragilidade no continente, em que se reconhece sua subordinação à Grã-Bretanha, a família real transfere-se com a Corte para o Brasil, estabelecendo a sede do império ultramarino português na cidade do Rio de Janeiro a partir de 1808. A década de 1820 tem início com o questionamento da monarquia absolutista em Portugal, num movimento de caráter liberal que ficou conhecido como Revolução do Porto. A exemplo do que ocorrera a outras monarquias europeias, as Cortes portuguesas reunidas propõem a limitação do poder real, mediante uma constituição. Diante da ameaça ao trono, d. João VI retorna a Portugal, jurando a Constituição em fevereiro de 1821, deixando seu filho Pedro como príncipe regente do Brasil. Em 7 de setembro de 1822, d. Pedro proclamou a independência do Brasil, perdendo Portugal, sua mais importante colônia.

[6] BÁLSAMOS, GOMAS, ÓLEOS, RAÍZES, CASCAS: Produtos usados como medicamentos no Brasil colonial. Dentre estes grupos, destacam-se também os fungos, flores, frutas, sementes, minerais, cozimentos, conservas, unguentos, entre outros, que eram comercializados pelos boticários e pelos droguistas responsáveis pela sua produção e circulação na colônia, sob a inspeção do físico-mor. Esses agrupamentos eram ainda exportados, já que muitos formavam gêneros característicos da colônia, não existindo em outras partes do mundo. A partir da segunda metade do século XVIII, esses itens foram ainda mais valorizados pelas autoridades luso-brasileiras, conforme as diretrizes metropolitanas de fomento à exploração científica da natureza.

[7] SEDA: fibra natural bastante resistente, de origem animal, usada na fabricação de tecidos comercialmente valorizados. É obtida a partir do casulo do bicho-da-seda – um inseto cujo ciclo de vida é formado por quatro estágios morfológicos: ovo; lagarta ou larva; pupa ou crisálida e adultos. Na fase larvar, produz o fio de seda ao redor de seu corpo, formando o casulo que é transformado em fios e tecidos. A China é considerada o berço da sericicultura. Acredita-se que os chineses começaram a produzir seda por volta do ano 2700 a.C. Seriam os gregos, durante o período de expansionismo, que levariam o luxuoso tecido para o continente através da rota da seda – caminhos que ligavam a Europa ao Oriente. Tais rotas tinham um tráfego comercial intenso desde o século III a.C. e receberam esse nome pois, dentre todos os produtos que eram negociados, a exemplo do jade, especiarias, folhas de chá, incenso e algodão, a seda tornou-se o mais procurado. Os europeus só conseguiriam produzir a seda, desvendando o mistério em torno de sua fabricação. A princípio acreditavam que o fio era proveniente da fibra de uma árvore. Em 552 o Imperador Justiniano enviou dois monges à China, com o objetivo de descobrir o processo de confecção do tecido, que retornaram com ovos do bicho-da-seda em sua bagagem. A cultura da seda ou sericicultura foi uma atividade econômica de grande importância para Portugal até meados do século XX, quando entrou em decadência. Entre as mais de 500 espécies de bichos-da-seda em estado selvagem destaca-se a domesticação dos bichos-da-seda da amoreira, Bombyx mori (Linnaeus, 1758), que tinham nas folhas dessa árvore em Portugal o seu único alimento com o objetivo de produzir o fio da seda. As amoreiras foram objeto de trabalhos científicos e memórias como a "Instrução sobre a cultura das amoreiras, e criação dos bichos da seda: dirigida a conservação, e aumento das manufaturas da seda", do padre Rafael Bluteau, publicada em 1679 (AZEVEDO, Jorge et alii. História da sericicultura em Portugal. Origem e utilização atual dos bichos-da-seda e da seda. 1º Encontro de História da Ciência no Ensino, 2015. https://www.researchgate.net/publication/277403873). No século XVIII, houve tentativas de introdução da cultura da amoreira na América portuguesa para a criação do bicho-da-seda principalmente pelo marquês do Lavradio. Porém o projeto não prosperou, em grande parte devido à assinatura, em 1703, de um tratado com a Inglaterra obrigando as colônias portuguesas a importar tecidos ingleses, o que protelou o surgimento da indústria brasileira

[8] ANIL: as anileiras designam uma grande variedade de espécies, a maior parte delas pertencentes ao gênero botânico Indigofera. Arbusto típico das regiões de clima tropical, de cujas folhas se obtinha uma tintura azul altamente cobiçada pela indústria têxtil até o século XIX, quando foi substituído pelo anil sintético. No Brasil, as primeiras tentativas de cultivo ocorreram entre os séculos XVII e meados do XVIII com pouco sucesso. A intensificação dessa produção se deu a partir da segunda metade do Setecentos, principalmente devido à promoção do cultivo a partir do governo do marquês do Lavradio (1760), no âmbito da política fomentista do marquês de Pombal, quando é promovida a produção do anil na capitania do Rio de Janeiro Além do declínio aurífero e do incentivo à atividade agrícola, a Revolução industrial inglesa gerou um mercado propício à exportação do anil, cujo auge foi alcançado na década de 1790, quando o monopólio real foi relaxado. Devido ao reavivamento promovido pela Inglaterra na indústria indiana e às guerras napoleônicas, o anil produzido no Brasil sofreu forte concorrência e deixou de ser exportado a partir de 1818.

[9] TRIGO: gramínea cujo grão está presente na alimentação da humanidade e de animais desde a surgimento da agricultura, cuja origem provável é o Oriente Médio. Da Mesopotâmia, o trigo se espalhou pelo mundo, chegando à Europa durante o expansionismo romano. E, através das navegações do século XVI, os europeus levariam o trigo ao Novo Mundo. Chegou às terras brasileiras em 1534, trazido por Martim Afonso de Souza, que desembarcou na capitania de São Vicente. O clima quente dificultou a expansão da cultura, sendo seu consumo restrito, já que havia também uma preferência pela farinha de mandioca. A partir do século XVIII, começou a se expandir comercialmente para o sul da colônia.

[10] EUROPA: parte ocidental do supercontinente eurasiático, é limitada a norte pelo oceano Glacial Ártico, a oeste pelo oceano Atlântico, a sul pelo mar Mediterrâneo, pelo mar Negro, pelas montanhas do Cáucaso e pelo mar Cáspio, e a Leste, pelos Montes Urais e pelo Rio Ural. É o menor dos cinco continentes do mundo, contudo, o mais densamente povoado. A despeito da hegemonia europeia no mundo por muitos séculos, o continente apresenta grande diversidade de formações políticas, de desenvolvimento científico e sensíveis desigualdades econômicas, sendo esse desequilíbrio uma das características marcantes na história de Portugal e seu império ultramarino, na qual contrasta, para alguns autores, a frágil posição do reino no contexto europeu e sua força na expansão e conquista. . Conhecida como “Velho Mundo” desde o período das grandes navegações do século XV e XVI – em função do termo “Novo Mundo”, descoberto no período –, irradiou pelo globo sua cultura e mesmo uma narrativa histórica predominante, sobretudo no continente americano, onde Estados europeus fundaram colônias. As principais mudanças na vida política, econômica, social e cultural da Europa repercutiam poderosamente na América. Foi o caso do movimento iluminista de contestação do antigo regime absolutista na Europa, cujos princípios serviram de base teórica para a Revolução norte-americana, e para os movimentos liberais, como a Revolução Pernambucana de 1817, que eclodiram no Brasil em fins do século XVIII até o século XIX.

[11] RIO DE JANEIRO: a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro foi fundada tendo como marco de referência uma invasão francesa. Em 1555, a expedição do militar Nicolau Durand de Villegaignon conquista o local onde seria a cidade e cria a França Antártica. Os franceses, aliados aos índios tamoios confederados com outras tribos, foram expulsos em 1567 por Mem de Sá, cujas tropas foram comandadas por seu sobrinho Estácio de Sá, com o apoio dos índios termiminós, liderados por Arariboia. Foi Estácio que estabeleceu “oficialmente” a cidade e iniciou, de fato, a colonização portuguesa na região. O primeiro núcleo de ocupação foi o morro do Castelo, onde foram erguidos o Forte de São Sebastião, a Casa da Câmara e do governador, a cadeia, a primeira matriz e o colégio jesuíta. Ainda no século XVI, o povoamento se intensifica e, no governo de Salvador Correia de Sá, verifica-se um aumento da população no núcleo urbano, das lavouras de cana e dos engenhos de açúcar no entorno. No século seguinte, o açúcar se expande pelas baixadas que cercam a cidade, que cresce aos pés dos morros, ainda limitada por brejos e charcos. O comércio começa a crescer, sobretudo o de escravos africanos, nos trapiches instalados nos portos. O ouro que se descobre nas Minas Gerais do século XVIII representa um grande impulso ao crescimento da cidade. Seu porto ganha em volume de negócios e torna-se uma das principais entradas para o tráfico atlântico de escravos e o grande elo entre Portugal e o sertão, transportando gêneros e pessoas para as minas e ouro para a metrópole. É também neste século, que a cidade vive duas invasões de franceses, entre elas a do célebre Duguay Trouin, que arrasa a cidade e os moradores. Desde sua fundação, esta cidade e a capitania como um todo desempenharam papel central na defesa de toda a região sul da América portuguesa, fato demonstrado pela designação do governador do Rio de Janeiro Salvador de Sá como capitão-general das capitanias do Sul (mais vulneráveis por sua proximidade com as colônias espanholas), e pela transferência da sede do vice-reinado, em Salvador até 1763, para o Rio de Janeiro quando a parte sul da colônia tornou-se centro de produção aurífera e, portanto, dos interesses metropolitanos. Ao longo do setecentos, começam os trabalhos de melhoria urbana, principalmente no aumento da captação de água nos rios e construção de fontes e chafarizes para abastecimento da população. Um dos governos mais significativos deste século foi o de Gomes Freire de Andrada, que edificou conventos, chafarizes, e reformou o aqueduto da Carioca, entre outras obras importantes. Com a transferência da capital, a cidade cresce, se fortifica, abre ruas e tenta mudar de costumes. Um dos responsáveis por essas mudanças foi o marquês do Lavradio, cujo governo deu grande impulso às melhorias urbanas, voltando suas atenções para posturas de aumento da higiene e da salubridade, aterrando pântanos, calçando ruas, construindo matadouros, iluminando praças e logradouros, construindo o aqueduto com vistas a resolver o problema do abastecimento de água na cidade. Lavradio, cuja administração se dá no bojo do reformismo ilustrado português (assim como de seu sucessor Luís de Vasconcelos e Souza), ainda criou a Academia Científica do Rio de Janeiro. Foi também ele quem erigiu o mercado do Valongo e transferiu para lá o comércio de escravos africanos que se dava nas ruas da cidade. Importantíssimo negócio foi o tráfico de escravos trazidos em navios negreiros e vendidos aos fazendeiros e comerciantes, tornando-se um dos principais portos negreiros e de comércio do país. O comércio marítimo entre o Rio de Janeiro, Lisboa e os portos africanos de Guiné, Angola e Moçambique constituía a principal fonte de lucro da capitania. A cidade deu um novo salto de evolução urbana com a instalação, em 1808, da sede do Império português. A partir de então, o Rio de Janeiro passa por um processo de modernização, pautado por critérios urbanísticos europeus que incluíam novas posturas urbanas, alterações nos padrões de sociabilidade, seguindo o que se concebia como um esforço de civilização. Assume definitivamente o papel de cabeça do Império, posição que sustentou para além do retorno da Corte, como capital do Império do Brasil, já independente.

[12] AMOREIRA: árvore frutífera originária da Ásia, a espécie Morus Alba (amoreira-branca), natural da China, é a mais indicada para a sericicultura. As amoreiras foram introduzidas na Península Ibérica pelos mouros, ainda no século VIII, para o cultivo do bicho-de-seda, que se alimenta exclusivamente de suas folhas. No entanto, foi no século XVII que o governo português adotou importantes medidas para impulsionar o cultivo de amoreiras, a instalação de fábricas de seda no Reino e a vinda de artífices italianos para o aperfeiçoamento do fabrico do tecido. O cultivo da árvore e a criação do bicho-da-seda foram atividades de grande interesse de naturalistas e autoridades lusas, gerando também alguns estudos científicos sobre o tema. Membro de diversas academias lusas e autor do Vocabulário português e latino, o padre francês Rafael Bluteau elaborou, em 1679, uma Instrução sobre a cultura das Amoreiras e Criação dos Bichos da Seda, primeiro livro escrito em português acerca da sericicultura, com o objetivo de incrementar o plantio de amoreira e o consequente aumento na produção de seda portuguesa, atividade extremamente lucrativa. No Brasil, o estímulo ao cultivo das amoreiras deu-se em decorrência da crise do ouro e da procura de novas riquezas, sobretudo aquelas provenientes da agricultura. Na segunda metade do século XVIII, no governo do marquês do Lavradio, houve fomento ao cultivo da espécie. No Horto Botânico do Rio de Janeiro, foram plantadas amoreiras, destinadas à produção de bicho-da-seda para abastecer as fábricas de tecidos em Portugal. Consta que d. João, em 1808, também teria trazido mudas da árvore para plantio no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Porém, a sericicultura brasileira só deu os primeiros passos como atividade agrícola e industrial no reinado do imperador d. Pedro II com a criação da Companhia Seropédica Fluminense.

[13] MANUFATURA: o termo frequentemente é associado à indústria e a fábricas, por vezes, sendo usado indiscriminadamente. Manufatura, mais apropriadamente, seria a incipiente indústria do Brasil colonial. Ao longo desse período, verificou-se uma discreta presença de atividades manufatureiras (de caráter doméstico e artesanal) graças, sobretudo, à repressão operada pela Coroa portuguesa, pois este tipo de prática feria a estrutura do sistema colonial e a lógica mercantilista: onde a colônia exportaria produtos primários e importaria bens manufaturados de sua metrópole. Essa repressão culminou com a assinatura do alvará de 5 de janeiro de 1785, que proibiu a atividade manufatureira à exceção da produção de tecidos grosseiros de algodão, que serviam para ensacar gêneros agrícolas e para vestuário dos escravos. Esse setor da indústria colonial não foi afetado, mas não constituía uma atividade relevante do ponto de vista econômico. As manufaturas que se pretendiam combater, as que produzissem gêneros que rivalizassem com os produtos finos ingleses no mercado europeu, praticamente inexistiam na colônia. Somente depois da transferência da Corte e da sede do Império português para o Brasil em 1808, por meio do alvará de 1º de abril do mesmo ano, o príncipe regente revogou a lei de 1785 e, não apenas autorizou como passou a incentivar a instalação de fábricas no Brasil, concedendo isenção de direitos de importação de matérias-primas e subsídios para a construção das primeiras manufaturas, sobretudo no setor têxtil e de ferro. Ainda assim, boa parte das manufaturas criadas não vingaria, devido, principalmente, a impossibilidade das pequenas fábricas, sem mão de obra especializada e sem uma verdadeira organização fabril, de competir com as importações inglesas, mais baratas e de qualidade muito superior, preferidas pela maioria da população em condições de consumir. Sem capital para investimento em melhorias e sem um mercado consumidor interno, a maior parte delas acabou falindo. Entre as manufaturas que mais se destacaram ao longo do período colonial, podemos citar a construção naval favorecida pela grande oferta de madeiras de boa qualidade proporcionada pela colônia; a produção de têxteis, principalmente dos tecidos grossos de algodão para consumo interno, atividade doméstica e feminina, muito disseminada pelo Brasil (sobretudo em Minas Gerais) e que constituía a fonte de renda para muitos colonos; e atividades artesanais diversas, urbanas e rurais, voltada para a produção de artigos necessários à vida cotidiana, como móveis, cerâmica, instrumentos de ferro, sapatos, ourivesaria, entre outros, exercidas sobretudo por escravos de ganho e libertos. A autorização das manufaturas e sua promoção em todo Império português por d. João, em abril de 1808, faziam parte de toda uma política de cunho liberal defendida por intelectuais como José da Silva Lisboa, visconde de Cairu. Posteriormente, uma série de alvarás que concediam isenções e privilégios, foram assinados, com o objetivo de impulsionar a produção manufatureira no Brasil e nos domínios ultramarinos portugueses.

[14] MASCARENHAS, D. LUÍS DE ALMEIDA PORTUGAL SOARES ALARCÃO D' EÇA E MELO SILVA E (1729-1790) - MARQUÊS DO LAVRADIO: 5º conde de Avintes e 2º marquês do Lavradio era filho do 1.º marquês do mesmo título d. Antônio de Almeida Soares e Portugal e de d. Francisca das Chagas Mascarenhas. Governador da Bahia entre 1768 e 1769, conseguiu neste curto período apaziguar os conflitos entre as autoridades locais e restabelecer a ordem na guarnição de Salvador. Sua forma de governar se pautava pela prudência na utilização dos recursos procurando manter suas contas sob estrito controle. Foi nomeado décimo primeiro vice-rei do Brasil em 1769, e seu governo durou 10 anos. Durante este período, a cidade colonial do Rio de Janeiro, que abrigava a sede do vice-reinado, passou por uma série de melhorias, como o aterro de pântanos e lagoas que prejudicavam a qualidade do ar, calçamento e abertura de ruas na parte central (inclusive a que leva seu nome), além de incentivos à produção local de alguns itens como o café e o vinho. Também foi responsável pela fundação da Academia Científica, em 1772, obedecendo à política pombalina de fomento às atividades científicas, que incluiu a remessa de coleções de História Natural e a criação de um horto botânico na cidade. No entanto, ao longo de seu governo, medidas impopulares, implementadas por ordem direta da metrópole, foram adotadas, como: o cumprimento das leis do Livro da Capa Verde do Distrito Diamantino – regulamentação da exploração de diamantes na colônia, editado por iniciativa do marquês de Pombal – e a extinção da Companhia de Jesus. Foi também durante sua administração que a situação de crescente instabilidade na região do Rio da Prata, com ocasionais conflitos armados entre forças espanholas e lusas, demandou providências para contornar a situação, como iniciativas de povoamento da região sul do Brasil e a construção de fortalezas na região, com o envio de guarnições. Em 1779, dois anos depois do falecimento do rei d. José I, o marquês do Lavradio deixou o governo do Brasil, sendo substituído por Luís de Vasconcelos e Sousa. De volta a Portugal, tornou-se conselheiro da Guerra, presidente do Desembargo do Paço, inspetor-geral das tropas do Alentejo e Algarve, veador da rainha e recebeu a Grã Cruz da Ordem de Cristo. A correspondência trocada por ele com outras autoridades e membros da nobreza em Portugal gerou as Cartas da Bahia (1768 a 1769), e as Cartas do Rio de Janeiro (1769-1770) publicadas pelo Arquivo Nacional. A instituição conserva ainda o fundo privado Marquês do Lavradio em seu acervo.

Sugestões de uso em sala de aula:

Utilização(ões) possível(is):
- No eixo temático do ensino fundamental do 3º Ciclo "História das relações sociais da cultura e do trabalho"
- Ao trabalhar o tema transversal "meio ambiente"

Ao tratar dos seguintes conteúdos:

 

- Economia colonial
- Práticas sociais e do trabalho
- Brasil colonial: culturas naturais e seu comércio

 

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