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Questão Cisplatina

Carta do Barão de Laguna ao Visconde de Lages

Escrito por Super User | Publicado: Terça, 06 de Fevereiro de 2018, 18h11 | Última atualização em Quinta, 12 de Agosto de 2021, 18h23

Carta do barão de Lages na qual relata a situação do Exército e do recrutamento na região do Rio Grande do Sul. Nessa carta, também descreve o desespero dos habitantes da região com os constantes fracassos do exército e avisa que se isso não fosse feito "em lugar de uma província, haveria de pacificar duas". 

 

Conjunto documental: Coleção Cisplatina
Notação: caixa 978
Data-limite: 1824-1828
Título do fundo: Coleção Cisplatina
Código do fundo: 1A
Argumento de pesquisa: Questão Cisplatina
Data: 10 de outubro de 1826
Local: Quartel General de São Francisco de Paula
Folha: pct. 27 doc. 2

 

Ilmo. Exmo. Senhor

 Tendo oficiado a V. Exa em data de 13 de setembro próximo passado, participando a minha chegada a esta província, e o estado em que achei o recrutamento; cumpre-me agora, para o conhecimento de sua majestade o imperador[1], fazer a V. Exa. uma narração mais extensa sobre diferentes objetos, para que o mesmo augusto senhor fique inteirado das circunstâncias desta província. Logo que cheguei à vila do Rio Grande[2] encontrei uma grande satisfação em seus habitantes, por se persuadirem que a minha presença poderia fazer terminar os males que oprimiam a todos em geral, e prestando atenção às autoridades e pessoas ao fato de tudo, conheci que o recrutamento se torna muito dificultoso por vários motivos. 1º Por que os capitães mores apenas agora principiam a formar listas de habitantes dos seus distritos e ignoram por consequência o número de recrutas que podem dar. 2º Por que os filhos de famílias sujeitas ao recrutamento andam refugiados pelos bosques e é impossível descobri-los. 3º Por que uma parte destes está alistada na 2ª linha. 4ª e última por que há uma geral repugnância a entrar no serviço. Os desertores são inumeráveis e decididos a continuar neste crime; pois tendo feito publicar a ordem do dia, que tenho a honra de remeter inclusa a V. Exa, ainda não me consta ter-se apresentado um só individuo. As cavalhadas estão bastante arruinadas de sorte que o Exército[3] muito mal a este respeito só em grandes esforços pode melhorar. Não apareciam carretas para conduzir víveres ao Exército. ...; porém a antiga má organização de todos os ramos desta província não pode mudar de figura de repente; e com particularidade nas atuais circunstâncias, em que tornando-se como único ponto de vista formar tropas para debelar os rebeldes da província Cisplatina[4], e destruir um inimigo numeroso, não é possível remover com a celeridade precisa os obstáculos que se opõem a esta medida quando em tempo de paz é que se devia ter dado uma ordem tal a marcha das coisas que na guerra não houvessem mais atenções que cuidar do seu termo. Além disso, os habitantes escarmentados[5] dos passados vexames, e de outros bem recentes quase tem chegado a desesperação, vendo arruinar, e perder suas carretas, bois e cavalos, que eles prestariam de boa vontade, sempre que tivessem certeza de que os seus interesses eram olhados com consideração, e que as autoridades militares puniam os agressores, porém infelizmente tem experimentado o contrário, e por isso primeiro que tudo é preciso infundir-lhes confiança, e fazer-lhes ver, que sua majestade imperial, só exige sacrifícios, quando se tornam indispensáveis, no que tenho empregado os meus desvelos, e posso assegurar a V. Exa. que a não ser assim, talvez que em lugar de uma província, haveria que pacificar duas.

...

Em quanto à 2ª linha, devo participar a V. Exa., que em tendo-se me apresentado algumas praças, que por suas circunstâncias nenhuma utilidade podem causar ao serviço, oferecendo em seu lugar pardos para a 1ª linha, eu os tenho aceitado e já fiz organizar uma companhia de cavalaria, depois a agregar a um regimento de cavalaria, de empregá-la como foi mais conveniente do serviço; o que desejareis seja da soberana aprovação de sua majestade imperial; pois aproveitando-se estes indivíduos que não estão sujeitos ao recrutamento, se segue uma conhecida vantagem, ficando não obstante obrigados ao serviço das ordenanças os indivíduos que ofereceram.

...

Deus Guarde a V. Exa. = Quartel General de São Francisco de Paula 10 de outubro de 1826.

Ilmo. Exmo. Senhor Barão de Lages[6]

Visconde de Laguna[7]

 

[1]PEDRO I, D. (1798-1834): batizado como Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon, d. Pedro I era filho de d. João VI e de d. Carlota Joaquina. Tornou-se herdeiro da Coroa portuguesa após a morte do primogênito Antônio, recebendo o título de príncipe real no mesmo ano da sagração de d. João como rei de Portugal, em 1816. Casou-se com a arquiduquesa da Áustria, Carolina Josefa Leopoldina em 1817, que veio a falecer no Brasil nove anos depois. Contraiu segundas? núpcias com a duquesa alemã Amélia Augusta em 1829. Com o retorno da família real a Portugal, em 1821, d. Pedro tornou-se príncipe regente do Brasil. Os planos políticos que as cortes de Lisboa destinavam ao Brasil levaram d. Pedro a romper definitivamente com Portugal, proclamando a independência do Brasil em setembro de 1822, quando foi sagrado e coroado imperador e defensor perpétuo do Brasil. O reinado de d. Pedro I (1822-1831) foi marcado por acontecimentos importantes como a convocação e dissolução da Assembleia Constituinte (1823); a outorga da primeira constituição do Brasil (1824); a criação do Conselho de Estado e a Guerra Cisplatina (1825-1828). Com a morte de d. João, em 1826, d. Pedro ascendeu ao trono, recebendo o título de Pedro IV. Forçado a abdicar em favor de sua filha primogênita, Maria da Glória, nomeou seu irmão d. Miguel como regente. Em 1831, foi a vez de d. Pedro abdicar do trono no Brasil, em favor do seu filho Pedro de Alcântara. A esta altura o monarca já havia dado várias demonstrações de seu caráter autoritário, a exemplo da dissolução da Assembleia Legislativa e do afastamento dos irmãos Andrada do governo por defenderem ideias consideradas radicais como o fim da escravidão e a limitação dos poderes do imperador. Os empréstimos com a Inglaterra, conflitos internos e a Guerra da Cisplatina agravaram a situação financeira do recém-criado Império, além das disputas entre os grupos políticos formados pelos partidos português, brasileiro e radical, que incendiavam ainda mais o contexto instável do governo e contribuíam para a impopularidade do imperador que, também no aspecto pessoal, era visto como boêmio e mantinha um famoso caso extraconjugal com a marquesa de Santos. Todos esses fatores levaram à abdicação do trono brasileiro e, ao regressar a Portugal, d. Pedro assumiu a liderança nas lutas contra seu irmão pelo trono. Amante da música, d. Pedro I compôs o hino da Carta (posteriormente adotado como hino nacional português até 1910) e o hino da independência do Brasil. Morreu tuberculoso em 1834.

[2] RIO GRANDE DE SÃO PEDRO: situado ao sul do estuário do rio da Prata, foi uma região descoberta ainda no século XVI, quando Martim Afonso de Souza realizou expedições para assegurar a manutenção dos territórios sob o domínio português, expulsando corsários franceses e fixando novos núcleos de povoamento. A capitania do Rio Grande de São Pedro do Sul teve sua ocupação estabelecida tardiamente e ao longo do período colonial viveu sob intensas disputas territoriais, por se tratar de uma região limítrofe do império português na América, era uma base de operações militares e motivo de preocupação aos administradores do reino. Em agosto de 1736, foi criada a freguesia de São Pedro, pertencente a capitania de Santa Catarina, subalterna ao Rio de Janeiro. No ano seguinte, deu-se oficialmente o início de sua colonização, com o estabelecimento de fortificações militares para resguardar a região, sob o comando do brigadeiro José da Silva Paes. Em 1750, com a vinda de colonos provenientes dos Açores e Ilha da Madeira, o povoado de São Pedro foi elevado à condição de vila. Inicialmente, propunha-se que esta imigração se baseasse na agricultura familiar de pequena propriedade, em convivência estreita com as grandes estâncias pecuaristas. As dificuldades enfrentadas pelas famílias, contudo (pragas, falta de segurança, escasso mercado para seus produtos) empurraram a grande maioria delas para uma integração com o sistema predominante. Dez anos mais tarde, devido ao crescimento populacional, é criada a capitania do Rio Grande de São Pedro, ainda sob a dependência do Rio de Janeiro. As relações socioeconômicas do Rio de Janeiro com o território do Rio Grande de São Pedro referem-se a todo um esforço de manutenção da Colônia do Sacramento como entreposto do comércio luso-brasileiro, os comerciantes do Rio de Janeiro eram os mais interessados na manutenção daquele porto no rio da Prata. Apenas em 1807, o governo do Rio Grande se separou do Rio de Janeiro como divisão administrativa subalterna, tornando-se capitania geral e assumindo o comando da capitania de Santa Catarina. A capitania aderiu a causa brasileira pela independência, e ao longo do período

[3]EXÉRCITO: A presença militar na colônia mostrou-se, desde o início, crucial para a administração dos domínios ultramarinos de Portugal, já que estes territórios careciam de estrutura governativa e ordem político-jurídica bem estabelecidas. Sua trajetória data da criação do governo-geral ainda no século XVI, visando efetivar diferentes planos de defesa e de expansão territorial. As forças militares buscavam enquadrar a população em uma ordem que permitiria o “bom funcionamento” da sociedade colonial. A estrutura militar lusitana, que se transferiu para o Brasil, se dividia em três tipos específicos de força: 1a linha – corpos regulares, conhecidos também por tropa paga ou de linha; 2a linha – as milícias ou corpo de auxiliares e a 3a linha – as ordenanças ou corpos irregulares. Os corpos regulares, criados em 1640 em Portugal, constituíam-se no exército “profissional” português, sendo a única força paga pela Fazenda Real, e seus comandantes eram fidalgos nomeados pelo rei. Essa força organizava-se em terços e companhias, cujo comando também pertencia a fidalgos nomeados pelo rei. Teoricamente, dedicar-se-iam exclusivamente às atividades militares, estando em constante treinamento. Todavia, na colônia, foram comumente empregadas em ações policiais de manutenção da ordem pública, ajudando na prisão de foragidos e na captura de escravos fugidos. As tropas de linha enviadas de Portugal, muitas vezes, careciam de efetivos, momento este em que a coroa lançava mão do recrutamento compulsório, terror da população branca colonial. As milícias, criadas em 1641, eram tropas não-remuneradas, compostas por civis e de alistamento obrigatório entre a população da colônia. Organizaram-se primeiramente por terços (antiga unidade portuguesa que vigorou até a segunda metade do século XVIII) e, depois, em regimentos. Funcionavam como forças de apoio às tropas pagas, e em geral, eram treinadas e disciplinadas para substituí-las caso necessário. Na segunda metade do século XVIII, as milícias no Rio de Janeiro estavam organizadas por regimentos alistados por três freguesias: da Candelária, de São José e de Santa Rita. Em Pernambuco, foi criado o “terço dos Henriques” para lutar nas guerras holandesas de 1648 e 1649. Neste “terço” predominou o alistamento de homens pretos forros e escravos recrutados por empréstimo, mas havia também mestiços, mulatos e mamelucos. O negro forro Henrique Dias (início século XVII-1662) comandou essas tropas auxiliares, daí chamarem-se "dos henriques". Nas demais capitanias se formaram "terços" com as mesmas características também denominados "henriques". Sob a denominação de tropas urbanas, as milícias na Bahia eram compostas pelos regimentos dos úteis (comerciantes e caixeiros) e de infantaria (artífices, vendeiros, taberneiros) todos formados por homens brancos. O medo dos proprietários de terras e escravos de que a experiência de Palmares se alastrasse por toda a colônia levou à criação de uma força de repressão nas capitanias, organizada na forma de milícia especializada na caça de escravos fugidos e na destruição de quilombos, em que se destacou a figura do capitão do mato ou "capitão de assalto" ou "capitão de entrada e assalto" entre outras variações que o posto recebeu de região para região. Já os corpos de ordenanças foram criados em 1549 por d. João III, e seu sistema de recrutamento abrangia toda a população masculina entre 18 e 60 anos que ainda não tivesse sido recrutada pelas duas primeiras forças, excetuando-se os privilegiados e os padres. Somente em caso de as autoridades considerarem haver uma grave perturbação da ordem pública, abandonavam suas atividades costumeiras. Recebiam treinamento de forma esporádica. Buscava-se, escapar ao alistamento de todas as maneiras, devido às péssimas condições da vida do soldado. A população civil temia o recrutamento militar obrigatório que era realizado pelos agentes recrutadores. Os possíveis recrutas, isto é, os homens brancos e não militares considerados aptos a engrossarem os efetivos das tropas de linha eram detidos a qualquer hora e local (dentro de suas casas e nas salas de aula) e conduzidos à cadeia para uma triagem. Diante de tais arbitrariedades, só restava aos homens a fuga para longe do local em que habitavam uma vez que o recrutamento acarretava o afastamento de suas atividades por tempo indeterminado. Os postos militares mais elevados eram, em geral, preenchidos por homens que já haviam provado ao rei sua qualidade, ou seja, serviços relevantes prestados, o que costumava ser mais importante do que experiência ou saber de guerra. Em 1648, ao sul do Recife, ocorre uma batalha que pode ser considerada marco na organização de forças locais: sob o comando de André Vidal Negreiros, Felipe Camarão e Henrique Dias, tropas formadas por brancos locais, indígenas e negros (organizados em destacamentos diferentes) lutaram contra tropas holandesas, formadas igualmente por brancos, negros e índios e lideradas por Domingos Fernandes Calabar e Johan van Dorth. A data da batalha de Guararapes, 19 de abril de 1648, é comemorada como o aniversário do Exército Brasileiro. Com a instalação da corte no Rio de Janeiro, a estrutura militar sofreu nova organização, modernizando-se e ampliando seus estabelecimentos. Foram criadas Academias Militares, indústrias de armas, fábricas de pólvoras, arsenais de guerras e hospitais militares.

[4] CISPLATINA: os interesses da Coroa portuguesa na Banda Oriental, atual República do Uruguai, eram antigos e foram reforçados com a vinda da Corte para o Brasil em 1808 e pela conjuntura política europeia após a derrota de Napoleão Bonaparte. A conquista da região platina era vista como uma forma de compensação das perdas que Portugal sofreu no Congresso de Viena (1814-15): a restituição de Caiena à França e a recusa por parte da Espanha em restituir a vila de Olivença aos portugueses. Por outro lado, o processo de emancipação das colônias hispano-americanas deu lugar a uma série de novas composições políticas e rupturas, como a do governador de Montevidéu, Francisco Javier de Elío que em 1808 rompe com o vice-rei, se alia a Madri e forma uma junta de governo autônoma. Pressionado pela reação de Buenos Aires, que se aliara ao estancieiro José Artigas, da elite local, Elío aceitou a força “pacificadora” enviada pelo príncipe regente, em 1811. O mesmo Artigas se voltaria contra Buenos Aires, controlando Montevidéu e outras províncias. Mais uma vez as tropas de d. João, sob os protestos da Inglaterra e da Espanha, invadem a Banda Oriental em nome do risco representado pelo projeto de Artigas, de formar uma confederação e que poderia contaminar o sul da América portuguesa, área sensível dessa fronteira. A conquista de Montevidéu pelas tropas luso-brasileiras comandadas pelo general Carlos Frederico Lecor ocorreu em 1817. O território se tornaria província do Brasil com o nome de Província Cisplatina (província de Montevidéu) após a realização do Congresso Cisplatino que votou a favor da sua anexação ao Reino Unido de Portugal e Algarves em 1821. Com a independência do Brasil, a Província Cisplatina continuou a integrar o Império e seria ainda objeto de outros conflitos na região do Prata. Em 1828 a Banda Oriental ou Província Cisplatina se tornou a República Oriental do Uruguai.

[5]HABITANTES ESCARMENTADOS: A‌ ‌província‌ ‌do‌ ‌‌Rio‌ ‌Grande‌ ‌de‌ ‌São‌ ‌Pedro‌ ‌serviu‌ ‌como‌ ‌base‌ ‌para‌ ‌operações‌ ‌militares‌ ‌durante‌ ‌as‌ ‌tentativas‌ ‌de‌ ‌ocupação‌ ‌da‌ ‌Banda‌ ‌Oriental‌ ‌do‌ ‌‌Rio‌ ‌da‌ ‌Prata‌ ‌–‌ ‌atual‌ ‌Uruguai.‌ ‌No início do século XIX, foi ‌também,‌ ‌o‌ ‌ambiente‌ ‌de‌ ‌convocações‌ ‌compulsórias‌ ‌e‌ ‌contratação‌ ‌de‌ ‌mercenários‌ ‌para‌ ‌a‌ ‌manutenção‌ ‌da‌ ‌campanha‌ ‌militar‌ ‌depois‌ ‌de‌ ‌derrotas‌ ‌das‌ ‌forças‌ ‌luso-brasileiras.‌ ‌A‌ ‌expressão‌ ‌“habitantes‌ ‌escarmentados”‌ ‌refere-se‌ ‌às‌ ‌experiências‌ ‌de‌ ‌danos‌ ‌sofridos‌ ‌pela‌ ‌população‌ ‌rio‌ ‌grandense,‌ ‌castigada‌ ‌pelos‌ ‌conflitos‌ ‌impostos‌ ‌na‌ ‌região;‌ ‌denotava‌ ‌desesperança‌ ‌e‌ ‌desilusão.‌ ‌Embora,‌ ‌em‌ ‌1826,‌ ‌tanto‌ ‌a‌ ‌‌Cisplatina‌ ‌quanto‌ ‌o‌ ‌Rio‌ ‌Grande‌ ‌fossem‌ ‌províncias‌ brasileiras,‌ ‌os‌ ‌conflitos‌ ‌de‌ ‌interesses‌ ‌nessa‌ ‌região‌ ‌atravessavam‌ ‌a‌ ‌emergência‌ ‌de‌ ‌projetos‌ ‌nacionais‌ ‌para‌ ‌a província de Buenos Aires e demais províncias adjacentes e para Banda do Uruguai.‌ ‌À‌ ‌ocupação‌ ‌luso-brasileira‌ ‌em‌ ‌Montevidéu‌ ‌iniciada‌ ‌em‌ ‌1817‌ pelas tropas de d. João, ‌seguiu-se‌ ‌a‌ ‌anexação‌ ‌da‌ ‌Província‌ ‌Cisplatina‌ ‌em‌ ‌1821‌ ‌e‌ ‌a‌ ‌subordinação‌ ‌ao‌ ‌governo‌ ‌do‌ ‌‌Rio‌ ‌de‌ ‌Janeiro‌ ‌a‌ ‌partir‌ ‌de‌ ‌1822.‌ ‌As‌ ‌repercussões‌ ‌do‌ ‌envolvimento‌ ‌do‌ ‌Rio‌ ‌Grande‌ ‌com‌ ‌os‌ ‌conflitos‌ ‌na‌ ‌região‌ ‌do‌ ‌Prata‌ ‌se‌ ‌evidenciaram‌ ‌na‌ ‌presença‌ ‌significativa‌ ‌de‌ ‌desertores,‌ ‌tanto‌ ‌das‌ ‌forças‌ ‌de‌ ‌ocupação,‌ ‌como‌ ‌também‌ ‌da‌ ‌resistência‌ ‌organizada,‌ ‌que‌ ‌se‌ ‌abrigaram‌ ‌na‌ ‌província.‌ ‌Na‌ ‌prática,‌ ‌os‌ ‌enfrentamentos‌ ‌e‌ ‌a‌ ‌instabilidade‌ ‌na‌ ‌ordem‌ ‌pública‌ ‌na‌ ‌Banda‌ ‌Oriental‌ ‌transbordaram‌ para‌ ‌as‌ ‌províncias‌ ‌meridionais,‌ ‌como‌ ‌Rio‌ ‌Grande‌ ‌e‌ ‌‌Santa‌ ‌Catarina‌,‌ ‌onde‌ ‌a‌ ‌desordem‌ ‌social‌ proveniente‌ ‌do‌ ‌afluxo‌ ‌de‌ ‌refugiados‌ ‌e‌ ‌desertores‌ ‌da‌ ‌campanha‌ ‌militar‌ ‌na‌ ‌Cisplatina‌ ‌se‌ ‌fazia‌ ‌presente.‌ ‌Ao‌ ‌longo‌ ‌das‌ ‌primeiras‌ ‌décadas‌ ‌do‌ ‌século‌ ‌XIX,‌ ‌verifica-se‌ ‌a‌ ‌difusão‌ ‌das‌ ‌ideias‌ ‌liberais‌ ‌deste‌ ‌lado‌ ‌do‌ ‌Atlântico‌ ‌e,‌ ‌no‌ ‌território‌ ‌onde‌ ‌atualmente‌ ‌é‌ ‌o‌ ‌Uruguai.‌ ‌As‌ ‌disputas‌ ‌se‌ ‌travaram‌ entre:‌ ‌soluções‌ ‌de‌ ‌subordinação‌ ‌a‌ ‌Espanha;‌ ‌autonomia‌ ‌local;‌ ‌incorporação‌ ‌a‌ ‌Buenos‌ ‌Aires;‌ ‌anexação‌ ‌luso-brasileira;‌ ‌união‌ ‌com‌ ‌o‌ ‌governo‌ ‌independente‌ ‌do‌ ‌Rio‌ ‌de‌ ‌Janeiro‌ ‌e‌ ‌vinculação‌ ‌a‌ ‌Lisboa.‌ ‌Nesse‌ ‌contexto,‌ ‌a‌ ‌proximidade‌ ‌geográfica,‌ ‌somada‌ ‌às‌ ‌movimentações‌ ‌guerrilheiras,‌ e aos interesses pecuários do Brasil, ‌expressa‌ ‌um‌ ‌contágio‌ ‌da‌ ‌província‌ ‌de‌ ‌Rio‌ ‌Grande‌ ‌com‌ ‌o‌ ‌ambiente‌ ‌de‌ ‌ocupação‌ ‌e‌ ‌resistência‌ ‌local‌ ‌em‌ ‌Montevidéu, com implicações futuras para a região ao longo de todo o Oitocentos.‌ ‌

[6] CARVALHO, JOÃO VIEIRA DE (1781-1847): nascido em Portugal, o barão de Lages destacou-se como militar e político na América portuguesa. Estudou em Lisboa e formou-se em engenharia. Recebeu os títulos de barão, conde e marquês de Lages. Foi ministro da Guerra em diferentes ocasiões entre 1822 e 1840; ocupou o cargo de senador a partir de 1829, sendo o presidente do Senado no período de 1844-1847. Publicou cartas topográficas sobre a fronteira do sul do Brasil, além de participar das campanhas militares na região Cisplatina em 1811. Em 1826, Carvalho era brigadeiro e ministro da Guerra do Império do Brasil.

[7] LECOR, CARLOS FREDERICO (1764-1836): nascido na cidade de Lisboa, era considerado um cidadão luso-brasileiro por sua destacada atuação militar a serviço de Portugal e, após 1822, em favor do Brasil. Recebeu os títulos de único barão de Laguna por Portugal e primeiro barão com grandeza e visconde com grandeza de Laguna pelo Brasil. Iniciou sua carreira militar na última década do século XVIII e defendeu Portugal na Guerra Peninsular (1808-1814), onde obteve brilhante atuação, alçando ao posto de comandante da Divisão de Voluntários Reais em 1815.No ano seguinte, a divisão parte para Santa Catarina com a missão de conquistar e manter Montevidéu e todo território a leste do rio Uruguai. A conquista da cidade ocorreu em 20 de janeiro de 1817, mas, só em 1821, a região passou a chamar-se Província Cisplatina, ligada diretamente ao governo português, com sede no Rio de Janeiro. Após a independência do país, em 1822, comandou as forças brasileiras contra o exército português até 1824, quando este capitulou. Em 1825, inicia-se o movimento de independência da Cisplatina e a reunião desta com as Províncias Unidas.  Desencadearam-se as lutas com os insurgentes, culminando na declaração de guerra do Brasil às Províncias Unidas do Rio da Prata, em dezembro de 1825. Lecor fica no comando do Exército do Sul, mas é logo exonerado pelo Imperador, substituindo-o o marquês de Barbacena. Voltou ao cargo em janeiro de 1828, onde ficaria até o final da guerra, em agosto do mesmo ano, quando retornou ao Rio de Janeiro.

 

Sugestões de uso em sala de aula
- No eixo temático "História das representações e das relações de poder"
- No sub-tema "Nações, povos, lutas, guerras e revoluções"

Ao tratar dos seguintes conteúdos:

- Guerra da Cisplatina (1825-1828)
- Estados Modernos: política e diplomacia (tratados) no período colonial
- A expansão territorial e as fronteiras do Brasil
- América: os conflitos luso-castelhanos

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