Ir direto para menu de acessibilidade.
Início do conteúdo da página

Casa de Correção

Publicado: Sexta, 15 de Junho de 2018, 15h20 | Última atualização em Quinta, 19 de Agosto de 2021, 22h06

Cópia da Carta Régia de 8 de julho de 1769 dirigida ao marquês do Lavradio mandando criar na cidade do Rio de Janeiro uma casa de correção destinada a receber homens e mulheres considerados ociosos e desordeiros pelas autoridades coloniais.

 
Conjunto documental: Secretaria de Estado do Brasil
Notação: códice 67 v. 5, fl. 31
Datas-limite: 1769-1778
Título do fundo: Secretaria de Estado do Brasil
Código do fundo: 86
Argumento de pesquisa: Casa de Correção
Ementa: cópia da Carta Régia de 8 de julho de 1769 dirigida ao marquês do Lavradio mandando criar na cidade do Rio de Janeiro uma casa de correção destinada a receber homens e mulheres considerados ociosos e desordeiros pelas autoridades coloniais.
Data do documento: 8 de julho de 1769
Local: Lisboa
Folha: -
 

Honrado Marquês do Lavradio[1]  V. Rei e Capitão geral de Mar, Terra do Estado do Brasil; Amigo. Eu El Rei vos envio muito saudar, como aquele que prezo. Sendo-me presente os muitos indivíduos de um, e outro sexo, que grassam nessa Cidade[2], e que pela sua ociosidade se acham existentes em uma vida licenciosa pervertendo com o seu mau exemplo aos bons: e considerando eu, o quanto seja indispensavelmente necessária uma providência, que evite os males que daqui se seguem, a que por serviço de Deus, e do bem público devo ocorrer. Sou servido façais praticar nessa Cidade o estabelecimento das calcetas[3]Casa de Correção[4] para os homens, e mulheres, que se acharem nos referidos termos, e na conformidade do que se observa nesta Corte pelos meus reais decretos, de que serão com estas as cópias; esperando eu com esta providência se evitem as perniciosas consequências, que se seguem das ditas gentes e se contenham estas em menos desordem com o medo do castigo. Escrita no Palácio de Nossa Senhora da Ajuda[5] a oito de julho de mil, setecentos e sessenta e nove. Rei // para o marquês do Lavradio. Carta régia de 8 de julho de 1769.

 

[1] MASCARENHAS, D. LUÍS DE ALMEIDA PORTUGAL SOARES ALARCÃO D' EÇA E MELO SILVA E (1729-1790) - MARQUÊS DO LAVRADIO: 5º conde de Avintes e 2º marquês do Lavradio era filho do 1.º marquês do mesmo título d. Antônio de Almeida Soares e Portugal e de d. Francisca das Chagas Mascarenhas. Governador da Bahia entre 1768 e 1769, conseguiu neste curto período apaziguar os conflitos entre as autoridades locais e restabelecer a ordem na guarnição de Salvador. Sua forma de governar se pautava pela prudência na utilização dos recursos procurando manter suas contas sob estrito controle. Foi nomeado décimo primeiro vice-rei do Brasil em 1769, e seu governo durou 10 anos. Durante este período, a cidade colonial do Rio de Janeiro, que abrigava a sede do vice-reinado, passou por uma série de melhorias, como o aterro de pântanos e lagoas que prejudicavam a qualidade do ar, calçamento e abertura de ruas na parte central (inclusive a que leva seu nome), além de incentivos à produção local de alguns itens como o café e o vinho. Também foi responsável pela fundação da Academia Científica, em 1772, obedecendo à política pombalina de fomento às atividades científicas, que incluiu a remessa de coleções de História Natural e a criação de um horto botânico na cidade. No entanto, ao longo de seu governo, medidas impopulares, implementadas por ordem direta da metrópole, foram adotadas, como: o cumprimento das leis do Livro da Capa Verde do Distrito Diamantino – regulamentação da exploração de diamantes na colônia, editado por iniciativa do marquês de Pombal – e a extinção da Companhia de Jesus. Foi também durante sua administração que a situação de crescente instabilidade na região do Rio da Prata, com ocasionais conflitos armados entre forças espanholas e lusas, demandou providências para contornar a situação, como iniciativas de povoamento da região sul do Brasil e a construção de fortalezas na região, com o envio de guarnições. Em 1779, dois anos depois do falecimento do rei d. José I, o marquês do Lavradio deixou o governo do Brasil, sendo substituído por Luís de Vasconcelos e Sousa. De volta a Portugal, tornou-se conselheiro da Guerra, presidente do Desembargo do Paço, inspetor-geral das tropas do Alentejo e Algarve, veador da rainha e recebeu a Grã Cruz da Ordem de Cristo. A correspondência trocada por ele com outras autoridades e membros da nobreza em Portugal gerou as Cartas da Bahia (1768 a 1769), e as Cartas do Rio de Janeiro (1769-1770) publicadas pelo Arquivo Nacional. A instituição conserva ainda o fundo privado Marquês do Lavradio em seu acervo.

[2]RIO DE JANEIRO: a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro foi fundada tendo como marco de referência uma invasão francesa. Em 1555, a expedição do militar Nicolau Durand de Villegaignon conquista o local onde seria a cidade e cria a França Antártica. Os franceses, aliados aos índios tamoios confederados com outras tribos, foram expulsos em 1567 por Mem de Sá, cujas tropas foram comandadas por seu sobrinho Estácio de Sá, com o apoio dos índios termiminós, liderados por Arariboia. Foi Estácio que estabeleceu “oficialmente” a cidade e iniciou, de fato, a colonização portuguesa na região. O primeiro núcleo de ocupação foi o morro do Castelo, onde foram erguidos o Forte de São Sebastião, a Casa da Câmara e do governador, a cadeia, a primeira matriz e o colégio jesuíta. Ainda no século XVI, o povoamento se intensifica e, no governo de Salvador Correia de Sá, verifica-se um aumento da população no núcleo urbano, das lavouras de cana e dos engenhos de açúcar no entorno. No século seguinte, o açúcar se expande pelas baixadas que cercam a cidade, que cresce aos pés dos morros, ainda limitada por brejos e charcos. O comércio começa a crescer, sobretudo o de escravos africanos, nos trapiches instalados nos portos. O ouro que se descobre nas Minas Gerais do século XVIII representa um grande impulso ao crescimento da cidade. Seu porto ganha em volume de negócios e torna-se uma das principais entradas para o tráfico atlântico de escravos e o grande elo entre Portugal e o sertão, transportando gêneros e pessoas para as minas e ouro para a metrópole. É também neste século, que a cidade vive duas invasões de franceses, entre elas a do célebre Duguay Trouin, que arrasa a cidade e os moradores. Desde sua fundação, esta cidade e a capitania como um todo desempenharam papel central na defesa de toda a região sul da América portuguesa, fato demonstrado pela designação do governador do Rio de Janeiro Salvador de Sá como capitão-general das capitanias do Sul (mais vulneráveis por sua proximidade com as colônias espanholas), e pela transferência da sede do vice-reinado, em Salvador até 1763, para o Rio de Janeiro quando a parte sul da colônia tornou-se centro de produção aurífera e, portanto, dos interesses metropolitanos. Ao longo do setecentos, começam os trabalhos de melhoria urbana, principalmente no aumento da captação de água nos rios e construção de fontes e chafarizes para abastecimento da população. Um dos governos mais significativos deste século foi o de Gomes Freire de Andrada, que edificou conventos, chafarizes, e reformou o aqueduto da Carioca, entre outras obras importantes. Com a transferência da capital, a cidade cresce, se fortifica, abre ruas e tenta mudar de costumes. Um dos responsáveis por essas mudanças foi o marquês do Lavradio, cujo governo deu grande impulso às melhorias urbanas, voltando suas atenções para posturas de aumento da higiene e da salubridade, aterrando pântanos, calçando ruas, construindo matadouros, iluminando praças e logradouros, construindo o aqueduto com vistas a resolver o problema do abastecimento de água na cidade. Lavradio, cuja administração se dá no bojo do reformismo ilustrado português (assim como de seu sucessor Luís de Vasconcelos e Souza), ainda criou a Academia Científica do Rio de Janeiro. Foi também ele quem erigiu o mercado do Valongo e transferiu para lá o comércio de escravos africanos que se dava nas ruas da cidade. Importantíssimo negócio foi o tráfico de escravos trazidos em navios negreiros e vendidos aos fazendeiros e comerciantes, tornando-se um dos principais portos negreiros e de comércio do país. O comércio marítimo entre o Rio de Janeiro, Lisboa e os portos africanos de Guiné, Angola e Moçambique constituía a principal fonte de lucro da capitania. A cidade deu um novo salto de evolução urbana com a instalação, em 1808, da sede do Império português. A partir de então, o Rio de Janeiro passa por um processo de modernização, pautado por critérios urbanísticos europeus que incluíam novas posturas urbanas, alterações nos padrões de sociabilidade, seguindo o que se concebia como um esforço de civilização. Assume definitivamente o papel de cabeça do Império, posição que sustentou para além do retorno da Corte, como capital do Império do Brasil, já independente.

[3]CALCETAS: argolas de ferro, fixadas no tornozelo, ligavam-se à cintura por meio de corrente de ferro ou ao pé de outro cativo. Embora a tortura tenha sido oficialmente abolida no Brasil pouco depois da independência, este instrumento não era considerado como tal e sua utilização estava prevista no artigo 44 do código penal de 1830: “A pena de galés sujeitará os réus a andarem com calceta no pé, e corrente de ferro, juntos ou separados, e a empregarem-se nos trabalhos públicos da província, onde tiver sido cometido o delito, à disposição do Governo. ” Longe de ser aplicado apenas nas prisões comuns, o uso deste instrumento foi disseminado durante todo o período colonial e parte do Império, onde quer que houvesse escravos, como forma de tortura, humilhação e limitação dos seus movimentos.

[4] CASA DE CORREÇÃO: A noção de uma casa “corretiva” para os delinquentes não integrava as noções de justiça do Antigo Regime, preocupado em punir e castigar o corpo dos réus. Daí a ausência, em especial no Brasil colonial, de qualquer instituição penal que fosse além de amontoar de indivíduos à própria sorte em celas escuras e fétidas. Mas na segunda metade do século XVIII encontram-se esboços de uma concepção de prisão com fins de correção do transgressor, propostas pelo poder público metropolitano. A denominação Casa de Correção já explicita uma preocupação em recolher o delinquente não apenas para isolá-lo e puni-lo, mas reeducá-lo de forma a que não tornasse a cometer os mesmos crimes. Em oposição às tradicionais prisões insalubres, escuras, cuja organização espacial e método de recolhimento e encarceramento não seguiam nenhuma lógica além da mera punição pelo isolamento, as Casas de Correção, ao menos teoricamente, propunham-se a utilizar o espaço de reclusão como meio de evitar que o preso reincidisse na infração, especialmente através do trabalho. Para tal, a disciplina e a arquitetura da instituição mostrar-se-iam fundamentais. Apesar de propostas no sentido de concretizar uma Casa de Correção no Rio de Janeiro surgirem na segunda metade do século XVIII, somente em 1833 ela começou de fato a ser erguida na região onde atualmente encontra-se o bairro do Catumbi. Não à toa erguida em um momento em que a presença das classes populares ganhava as ruas da capital do Império, exercendo suas atividades laborais, envolvidas em rixas políticas ou simplesmente “vadiando”, a Casa de Correção tinha por objetivo transformar o detento em súdito “probo e laborioso”.

[5]PALÁCIO REAL DA AJUDA: foi construído em Lisboa, no século XVIII, em função da destruição do Paço da Ribeira, então sede do governo, causada pelo terremoto de 1755, durante o reinado de d. José I. O Palácio da Ajuda foi edificado em madeira para melhor resistir aos abalos sísmicos e serviu residência oficial da monarquia portuguesa durante cerca de três décadas. Durante seu governo, marquês de Pombal mandou construir à volta do palácio o primeiro jardim botânico de Portugal. Em 1794, um incêndio destruiu por completo a habitação real e outro palácio em pedra e cal foi projetado. A construção do novo palácio se estendeu por mais de sessenta anos, durante os quais o palácio ora serviu de residência real (quando monarcas escolhiam alas já habitáveis do palácio como moradia), ora assumia plano secundário. As obras na estrutura do edifício foram concluídas em 1861, durante o reinado de d. Luís I.

Fim do conteúdo da página