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Praça de comércio dos ingleses

Publicado: Segunda, 23 de Agosto de 2021, 20h15 | Última atualização em Segunda, 23 de Agosto de 2021, 20h15

Ofício do Juiz Antônio Ribeiro Freire ao ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, d. Rodrigo de Souza Coutinho, sobre sua visita ao local no qual os comerciantes ingleses pretendiam construir a Praça de Comércio, o que não causaria nenhum prejuízo à Real Fazenda e à Casa da Alfândega, já que os ingleses arcariam com todas as despesas. Informa ainda que alguns comerciantes estavam dispostos a contribuir e o presidente do corpo do comércio estava pronto para assinar a subscrição de qualquer despesa.

 

Conjunto documental: Missões Diplomáticas
Notação: IR³ 17
Datas-limite: 1807-1849
Título do fundo: Série Relações Exteriores
Código do fundo: BA
Argumento de pesquisa: d. Rodrigo de Souza Coutinho
Data do documento: 14 de julho de 1809
Local: Rio de Janeiro
Folha:-

 

Ilustríssimo Excelentíssimo Senhor,

Passei a ver e examinar o lugar indicado pelos comerciantes ingleses para fabricarem à sua custa, casa que sirva de Praça de Comércio[1]; e com efeito é muito conveniente por não resultar prejuízo a Real Fazenda[2] e a Casa da Alfândega[3].

Porém sou informado agora, por Naylor, presidente do corpo do comércio[4], que ele está pronto para assinar a subscrição de qualquer despesa para a dita obra e pensa estarem dispostos alguns comerciantes, e não todos, sendo necessário ouvi-los para deliberarem sobre esta contribuição; e que no dia 17 do corrente serão convocados para firmarem o seu confirmamento: Logo que eu receber este assinado pelos comerciantes, levarei a presença da vossa alteza[5] para determinar o que for servido. Deus Guarde a vossa excelência.

Rio de Janeiro, em 14 de julho de 1809

Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Conde de Linhares[6]

 

[1]PRAÇA DO COMÉRCIO: espaço ocupado por comerciantes para fazer negócios. Se a origem da ideia está no espaço físico da “praça” como um local público e amplo de reunião de diversos negociantes como uma feira, há um significado moderno que implica não somente o espaço livre, um rocio, mas as construções ao redor dele, onde se concentram bancos, casas de seguro, navegação e outras instituições e órgãos ligados ao comércio de grande monta, tendo como exemplo a Praça do Comércio de Lisboa, construída posteriormente ao terremoto de 1755. No caso do Rio de Janeiro joanino, a Praça do Comércio foi um grande edifício erguido em junho 1819 às margens da baía da Guanabara, próximo à igreja da Candelária, e inaugurado em maio de 1820. O projeto fora do arquiteto francês Grandjean Montigny, vindo para o Brasil integrando a missão artística francesa. Segundo a historiadora Ângela Teles em Grandjean De Montigny: da arquitetura revolucionária à civilização nos trópicos (Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2008), a Praça do Comércio seria, para d. João VI, o “símbolo do projeto político e civilizatório que se pretendia construir na América portuguesa”. O belo prédio em estilo neoclássico abrigou a praça de comércio, também chamada “bolsa” do comércio, durante pouco tempo, até o início das agitações políticas em torno da revolução liberal do Porto e do retorno da Corte portuguesa, que levariam à invasão da praça por tropas e à morte de partidários do liberalismo. Nessa ocasião, em 1821, fora fechado e reabriu somente em 1824, pós independência, como alfândega, funcionando assim até meados do século XX. Na década de 1990 o edifício se tornou um importante centro cultural da cidade, chamado hoje, Casa França-Brasil.

[2]REAL ERÁRIO: instituição fiscal criada em Portugal, no reinado de d. José I, pelo alvará de 22 de dezembro de 1761, para substituir a Casa dos Contos. Foi o órgão responsável pela administração das finanças e cobrança dos tributos em Portugal e nos domínios ultramarinos. Sua fundação simbolizou o processo de centralização, ocorrido em Portugal sob a égide do marquês de Pombal, que presidiu a instituição como inspetor-geral desde a sua origem até 1777, com o início do reinado mariano. Desde o início, o Erário concentrou toda a arrecadação, anteriormente pulverizada em outras instâncias, padronizando os procedimentos relativos à atividade e serviu, em última instância, para diminuir os poderes do antigo Conselho Ultramarino. Este processo de centralização administrativa integrava a política modernizadora do ministro, cujo objetivo central era a recuperação da economia portuguesa e a reafirmação do Estado como entidade política autônoma, inclusive em relação à Igreja. No âmbito fiscal, a racionalização dos procedimentos incluiu também novos métodos de contabilidade, permitindo um controle mais rápido e eficaz das despesas e da receita. O órgão era dirigido por um presidente, que também atuava como inspetor-geral, e compunha-se de um tesoureiro mor, três tesoureiros-gerais, um escrivão e os contadores responsáveis por uma das quatro contadorias: a da Corte e da província da Estremadura; das demais províncias e Ilhas da Madeira; da África Ocidental, do Estado do Maranhão e o território sob jurisdição da Relação da Bahia e a última contadoria que compreendia a área do Rio de Janeiro, a África Oriental e Ásia. Por ordem de d. José I, em carta datada de 18 de março de 1767, o Erário Régio foi instalado no Rio de Janeiro com o envio de funcionários instruídos para implantar o novo método fiscal na administração e arrecadação da Real Fazenda. Ao longo da segunda metade do século XVIII, seriam instaladas também Juntas de Fazenda na colônia, subordinadas ao Erário e responsáveis pela arrecadação nas capitanias. A invasão napoleônica desarticulou a sede do Erário Régio em Lisboa. Portanto, com a transferência da Corte para o Brasil, o príncipe regente, pelo alvará de 28 de junho de 1808, deu regulamento próprio ao Erário Régio no Brasil, contemplando as peculiaridades de sua nova sede. Em 1820, as duas contadorias com funções ultramarinas foram fundidas numa só: a Contadoria Geral do Rio de Janeiro e da Bahia. A nova sede do Tesouro Real funcionou no Rio de Janeiro até o retorno de d. João VI para Portugal, em 1821.

[3] ALFÂNDEGAS: organismo da administração fazendária responsável pela arrecadação e fiscalização dos tributos provenientes do comércio de importação e exportação. Entre 1530 e 1548, não havia uma estrutura administrativa fazendária, somente um funcionário régio em cada capitania, o feitor e o almoxarife. Porém, com a implantação do governo-geral, em 1548, o sistema fazendário foi instituído no Brasil com a criação dos cargos de provedor-mor – autoridade central – e de provedor, instalado em cada capitania. Durante o período colonial, foram estabelecidas casas de alfândega, que ficaram sob controle do Conselho de Fazenda até a criação do Real Erário em 1761, que passou a cobrar as chamadas “dízimas alfandegárias”. Estas, no entanto, mudaram com a vinda da família real em 1808 e a consequente abertura dos portos brasileiros. Por esta medida, quaisquer gêneros, mercadorias ou fazendas que entrassem no país, transportadas em navios portugueses ou em navios estrangeiros que não estivessem em guerra com Portugal, pagariam por direitos de entrada 24%, com exceção dos produtos ingleses que pagariam apenas 15%. Os chamados gêneros molhados, por sua vez, pagariam o dobro desse valor. Quanto à exportação, qualquer produto colonial (com exceção do pau-brasil ou outros produtos “estancados”) pagaria nas alfândegas os mesmos direitos que até então vigoravam nas diversas colônias.

[4] CORPO DE COMÉRCIO: conjunto dos negociantes de grosso trato matriculados no livro de registro de comerciantes da Junta do Comércio da praça do Rio de Janeiro. Em 23 de agosto de 1808, em consequência da abertura dos portos ao comércio estrangeiro, foi estabelecida no Brasil a Real Junta de Comércio, que substituíra a Mesa de Inspeção do Rio de Janeiro e estendera sua jurisdição a todas as capitanias. Alguns dos papéis da Junta, que teve como primeiro presidente o marquês de Aguiar, d. Fernando José de Portugal e Castro, empossado em 18 de maio de 1809, eram: o de matricular os negociantes de grosso trato e seus caixeiros, regular a instalação de manufaturas e fábricas, cuidar do registro de patentes de invenções. Desempenhou também importante papel nos litígios entre negociantes, nas dissoluções de sociedades mercantis, na administração de bens de negociantes falecidos ou de firma falidas ou em concordata, assim como o papel de garantir aos credores a quitação das dívidas, quando algum desses casos ocorresse.

[5] JOÃO VI, D. (1767-1826): segundo filho de d. Maria I e d. Pedro III, se tornou herdeiro da Coroa com a morte do seu irmão primogênito, d. José, em 1788. Em 1785, casou-se com a infanta Dona Carlota Joaquina, filha do herdeiro do trono espanhol, Carlos IV que, na época, tinha apenas dez anos de idade. Tiveram nove filhos, entre eles d. Pedro, futuro imperador do Brasil. Assumiu a regência do Reino em 1792, no impedimento da mãe que foi considerada incapaz. Um dos últimos representantes do absolutismo, d. João VI viveu num período tumultuado. Foi sob o governo do então príncipe regente que Portugal enfrentou sérios problemas com a França de Napoleão Bonaparte, sendo invadido pelos exércitos franceses em 1807. Como decorrência dessa invasão, a família real e a Corte lisboeta partiram para o Brasil em novembro daquele ano, aportando em Salvador em janeiro de 1808. Dentre as medidas tomadas por d. João em relação ao Brasil estão a abertura dos portos às nações amigas; liberação para criação de manufaturas; criação do Banco do Brasil; fundação da Real Biblioteca; criação de escolas e academias e uma série de outros estabelecimentos dedicados ao ensino e à pesquisa, representando um importante fomento para o cenário cultural e social brasileiro. Em 1816, com a morte de d. Maria I, tornou-se d. João VI, rei de Portugal, Brasil e Algarves. Em 1821, retornou com a Corte para Portugal, deixando seu filho d. Pedro como regente.

[6] COUTINHO, RODRIGO DE SOUZA (1755-1812): afilhado do marquês de Pombal, este estadista português exerceu diversos cargos da administração do Império luso, como o de embaixador em Turim, ministro da Marinha e Domínios Ultramarinos (1796-1801) e presidente do Real Erário (1801-3). Veio para o Brasil em 1808, quando foi nomeado secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, permanecendo no posto até 1812, quando faleceu no Rio de Janeiro. D. Rodrigo foi aluno do Colégio dos Nobres e da Universidade de Coimbra, tendo viajado pela Europa e mantido contato com iluministas como o filósofo e matemático francês Jean Le Rond d’Alembert, um dos organizadores da Encyclopédie. Considerado um homem das Luzes, destacou-se por suas medidas visando a modernização e o desenvolvimento do reino. D. Rodrigo aproximou-se da geração de 1790, vista como antecipadora do processo de Independência, e foi o principal idealizador do império luso-brasileiro, no qual a centralidade caberia ao Brasil. Sob o seu ministério, o Brasil adquiriu novos contornos com a anexação da Guiana Francesa (1809) e da Banda Oriental do Uruguai (1811). Preocupado com o desenvolvimento econômico e cultural, bem como com a defesa do território, Souza Coutinho foi um partidário da influência inglesa no Brasil, patrocinando a assinatura dos chamados “tratados desiguais” de que é exemplo o Tratado de Aliança e Comércio com a Inglaterra [ver Tratados de 1810]. Responsável pela criação da Real Academia Militar (1810), foi ainda inspetor-geral do Gabinete de História Natural e do Jardim Botânico da Ajuda; inspetor da Biblioteca Pública de Lisboa e da Junta Econômica, Administrativa e Literária da Impressão Régia; conselheiro de Estado; Grã-Cruz das Ordens de Avis e da Torre e Espada. Em 1808, o estadista recebeu o título nobiliárquico de conde de Linhares.

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