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Sala de aula

Publicado: Terça, 05 de Junho de 2018, 14h42 | Última atualização em Segunda, 11 de Junho de 2018, 13h07

Cerco a Recife

Oficio de Manoel Carvalho Paes de Andrade, presidente da província de Pernambuco, a Tristão Gonçalves de Alencar Araripe, presidente da província do Ceará pedindo a aceleração de uma marcha que contenha maior numero possível de combatentes para enfrentar as tropas que vêm do Rio de Janeiro.

 

Conjunto documental: Confederação do Equador
Notação: caixa 742, pct. 01
Data-limite: 1808-1878
Titulo de fundo: Confederação do Equador
Código do fundo: 1N
Data do documento: 25 de agosto de 1824
Local: s.l.
Folhas(s): -

 

Em data de hoje escrevo de ofício ao Exmo. Filgueiras[1]  para acelerar sua marcha com o maior número de gente que puder reunir, e mesmo agregar em caminho para acabarmos de uma vez com os escravos do Imperador novamente chegados do Rio de Janeiro em número de mil e duzentos, segundo as informações mais verídicas, e até cartas do Rio de Janeiro. Temos em nosso bloqueio[2] a nau D. Pedro, e a seu bordo Lord Cochrane, o qual já me ofereceu artigos de capitulação[3], que não aceito pelos motivos que verá da Proclamação, e por que não sei capitular, só sei vencer, ou morrer.

Do impresso junto verá a concordata que fiz com o governo do Rio Grande do Norte, e parece-me muito a propósito fazer-se o mesmo entre este e esse governo, sendo do agrado de V.Ex.ª poder assinar dita concordata por parte deste governo o padre Luiz Carlos Coelho da Silva a esse fim autorizado nessa ocasião. A força daquela Província vai operar já sobre a Paraíba de acordo com as forças do centro da mesma Paraíba, que vão ser reunidas por Belarmino de Arruda Câmara, cujo irmão Major desta Província vai com ele: as forças que estavam ás ordens do Presidente Temporário, tão bem se hão de reunir, e deste modo pretendo que em dias do próximo setembro fiquem concluídos os negócios da Paraíba, para mais desafrontados entrarmos nas Alagoas, e sacudirmos para fora dos limites da Confederação[4], que é no Rio de São Francisco do Norte, aos frios escravos, que indignos pisam nosso solo.

Lord Cochrane tem-nos ameaçado com grande bombardeamento, o que muito tem assustado as mulheres e homens covardes como elas, deste Recife; porém eu nunca tive tanta coragem, e agora é que julgo a nossa causa na crise da decisão a nosso favor. Tanto maior é o perigo, quanto mais gloriosa é a vitória. Conte V. Exª com a minha constância, assim como eu conto com a firmeza de V. Ex.ª, e cooperação do Exmo. Filgueiras.

Deos Guarde a V. Exª ms. as. Secretaria do governo de Pernambuco 25 de Agosto de 1824./

Ill mo e Exmo Snr. Tristão Gonçalves de Alencar Araripe[5], Prezidente do governo da Província do Ceará. Manoel de Carvalho Paes de Andrade[6]

 

[1] FILGUEIRAS, JOSÉ PEREIRA (1758-1824): nascido na Bahia foi proprietário de terras e chegou a ser capitão-mor do Crato, no Ceará, durante a Revolução Pernambucana de 1817. Sob seu comando, a rebelião foi debelada, tendo seus líderes (nomes como Tristão de Alencar, e sua mãe Bárbara de Alencar) presos e remetidos para Fortaleza. Foi feito comandante em chefe das forças expedicionárias por d. Pedro I. Porém, devido a insatisfações para com promessas não cumpridas pelo Imperador, Filgueiras mandou uma circular às câmaras da província, em termos pouco respeitosos para com a Majestade Imperial, e retirou-se para Fortaleza, fazendo várias prisões, depondo o presidente e anexando o Ceará à Confederação do Equador, proclamada em Pernambuco. Ao lado de Tristão Araripe (presidente), tornou-se o Governador das Armas, no Ceará. Foi preso em novembro de 1824, durante a repressão ao movimento, pelas tropas imperiais, e morreria de febre palustre a caminho do Rio de Janeiro.

[2] BLOQUEIO [AO RECIFE]: no ano de 1824, durante a Confederação do Equador, a cidade de Recife foi bloqueada duas vezes. O primeiro começou em fins de março, com a chegada de uma divisão composta pelas fragatas Niterói e Piranga, sob comando de John Taylor, com objetivo de garantir a nomeação de Francisco Paes Barreto, realizada por d. Pedro I e rejeitada pelo senado e pelas câmaras municipais de Pernambuco. Na sua chegada, o comandante Taylor apresentou a proclamação do Imperador, exigindo o cumprimento das suas ordens, ao que o senado resistiu, alegando, inicialmente, que aguardavam uma resposta definitiva do imperador, já que haviam pouco antes enviado uma representação ao Rio de Janeiro com o intuito de esclarecer e rogar a compreensão e aceitação dos pontos de vista constitucionalistas dos pernambucanos. A resposta de Taylor foi a convocação do Grande Conselho para deliberar sobre a questão. Os mais de 300 membros do conselho, cientes que o objetivo da divisão naval enviada era impor o nome de Paes Barreto em substituição ao de Paes de Andrade, decidiram manter sua decisão, rejeitar o presidente escolhido pelo Imperador e enviar outra representação ao Rio de Janeiro. O capitão John Taylor, então, decreta o bloqueio do porto do Recife, ao que Paes de Andrade respondeu determinando a prisão dos emissários de Taylor encontrados em terra. Em 11 de junho de 1824, depois de rejeitar mais um presidente – Carlos Mayrink – e de recusarem-se a jurar o projeto de constituição “apresentado” pelo Imperador, as câmaras de Pernambuco receberam a notícia da suspensão do bloqueio, pois na corte se receava um ataque de forças portuguesas ao Rio de Janeiro e, por isso, d. Pedro determinava o retorno de todas as embarcações a esta cidade. Suspenso o bloqueio em primeiro de julho, deixados à própria sorte em caso de invasão portuguesa, os pernambucanos recebem a proclamação da Confederação do Equador em 2 de julho de 1824. Com a continuação da revolta e a não concretização da invasão do Rio de Janeiro pelos portugueses, uma nova esquadra é enviada ao Recife, desta vez sob o comando de Cochrane, que encontrou a revolta já disseminada por várias províncias do norte. Esta força naval partiu do Rio de Janeiro, e contava com a nau d. Pedro I, a corveta Carioca, o brigue Maranhão, e os navios Harmonia e Caridade. As tropas terrestres do general Francisco Lima e Silva, compostas por 1.200 homens, encontravam-se também embarcadas. Elas foram levadas para Jaraguá em meados de agosto, enquanto a esquadra seguia para o Recife, onde aportaria em 18 de agosto. Diante da recusa à rendição, a cidade é bombardeada pela primeira vez. Parte da esquadra segue para o Ceará, e, em outubro, Cochrane estaria em Fortaleza debelando a rebelião cearense. Este último bloqueio e a atuação das tropas de Lima e Silva acabariam na invasão do Recife e derrocada do movimento.

[3]ARTIGOS DE CAPITULAÇÃO: termos de rendição de guerra. Os rebeldes que levaram a cabo o movimento pela Confederação do Equador jamais capitularam de forma integral: à medida que as forças do “exército cooperador da boa ordem” avançavam, algumas facções das forças confederadas capitulavam e outras seguiam em marcha pelo interior de Pernambuco. Assim que chegou ao Recife, o almirante Cochrane – líder das forças do governo – emitiu várias proclamações, que resultaram em um ultimato aos rebeldes, dando-lhes até o dia 28 de agosto para se entregar. As negociações, mediadas pela pintora e preceptora da família real Maria Graham, mostraram-se infrutíferas, pois os confederados estavam irredutíveis a qualquer rendição sem que se incluísse imediata convocação de uma assembleia constituinte. Depois do massacre de uma parte das forças rebeldes no Recife, em inícios de setembro de 1824, as tropas e lideranças restantes se refugiam em Olinda. Lima e Silva tenta forçar sua rendição incondicional, que acarretaria a execução sumária para as lideranças e, possivelmente, para muitos outros oficiais também. Poucos aceitam e a maioria prefere continuar a luta no interior. Pouco meses após um período de sérias privações e seguidas derrotas, a última coluna a resistir rende-se às tropas de Lamenha – ele mesmo, aliás, um desertor da Confederação – que apresentara termos de rendição benevolentes que jamais iriam se cumprir.

[4] CONFEDERAÇÃO [DAS PROVÍNCIAS UNIDAS] DO EQUADOR: assim ficou conhecido o movimento revolucionário republicano, iniciado no estado de Pernambuco, a 2 de julho de 1824, segundo a proclamação de Manuel de Carvalho Paes de Andrade. O movimento se alastrou pelo nordeste do país, e tem ligações com as ideias liberais do século XVIII, com a Revolução Pernambucana de 1817 e representou a principal reação contra a tendência absolutista e a política centralizadora do governo de d. Pedro I, esboçadas na dissolução da Assembleia Constituinte de 1823 e, sobretudo, na Carta Outorgada de 1824, a primeira constituição do país. A mesma evidenciava uma preocupação com a região sudeste brasileira, especialmente o Rio de Janeiro (sua capital à época), em detrimento das demais regiões do Brasil, além de instituir o “Poder Moderador” um elemento que evidenciava as tendências absolutistas do Imperador. A Confederação buscava uma independência dos estados do nordeste brasileiro e a formação de uma confederação a exemplo dos Estados Unidos da América. D. Pedro I era declarado traidor, já que seus propósitos seriam o de entregar o Brasil nas mãos dos portugueses. Ao mesmo tempo, eram convocadas todas as províncias do Norte a ignorar a autoridade imperial e reunirem-se num Estado federativo republicano independente, sob a presidência de Pernambuco, que ficaria conhecido como Confederação do Equador. O Ceará foi, depois de Pernambuco, o estado que mais ativamente tomou partido na rebelião. Entre seus líderes estavam Tristão Gonçalves de Alencar Araripe e José Pereira Filgueiras. Várias cidades cearenses como Crato, Icó e Quixeramobim (antes Vila de Campo Maior) aliaram-se aos confederados pernambucanos, demonstrando suas insatisfações para com o governo imperial. Após confrontos com o governo provisório controlado pelo Imperador, foi estabelecida a República do Ceará, em 26 de agosto de 1824, tendo Tristão Alencar como presidente do Conselho que governaria a província. A forte repressão das forças imperiais, todavia, rapidamente derrotaram o movimento rebelde. As execuções das lideranças puseram fim ao movimento, cujo lema era “Religião, Independência, União e Liberdade”, e custaram à província de Pernambuco a perda de parte de seu território (a antiga comarca de Rio São Francisco), incorporada à província da Bahia. O movimento deixou também um rastro de rivalidades mortais, estagnação econômica e confrontos políticos por toda a região.

[5] ARARIPE, TRISTÃO GONÇALVES DE ALENCAR (1789-1825): nascido no Crato, Ceará, participou da Revolução Pernambucana de 1817 e da tentativa de levar o movimento a sua terra natal, ao lado de sua mãe Bárbara de Alencar, do tio Leonel Pereira de Alencar e do irmão José Martiniano de Alencar. Em 3 de maio de 1817, uma pequena vila do interior do Ceará proclamou a República do Crato, assumindo a presidência Bárbara de Alencar. Os revolucionários foram presos pelo capitão-mor José Pereira Filgueiras e enviados para presídios em Fortaleza. Quando da sua liberdade e da eclosão da Confederação do Equador, aderiu ao movimento, tornando-se uma das figuras mais representativas, sendo proclamado pelos rebeldes republicanos, em 26 de agosto de 1824, presidente da província do Ceará, destituindo o tenente coronel Pedro José da Costa Barros. Ao seu lado, José Pereira Filgueiras figurava como comandante das armas. Outrora inimigos políticos, lutariam pela mesma causa em 1824, formando uma dupla de grande poder. Foi morto pelas forças imperiais no interior do Ceará.

[6] ANDRADE, MANOEL DE CARVALHO PAES DE (177?-1855): nascido em Pernambuco, viveu por algum tempo em Portugal, dedicando-se ao comércio em seu retorno. Participou da Revolução Pernambucana de 1817 e, com a derrota do movimento, refugiou-se nos Estados Unidos, temendo a retaliação das autoridades. Após a anistia, em 1821, voltou ao Brasil e ocupou o cargo de Intendente da Marinha. Foi eleito presidente da província de Pernambuco, provisoriamente, em 13 de dezembro de 1823, após a renúncia de Francisco Pais Barreto. Em 8 de janeiro de 1824, foi confirmado presidente pelos eleitores pernambucanos, contrariando as ordens do governo imperial que indicara Francisco Pais Barreto para a presidência. Manoel de Carvalho foi o responsável pela proclamação da Confederação das Províncias Unidas do Equador, em 2 de julho de 1824 [ver Confederação do Equador]. Malogrado o movimento, refugiou-se na Inglaterra por cerca de sete anos. Novamente no Brasil, foi eleito senador pela província da Paraíba e, em 1834, foi mais uma vez presidente da província de Pernambuco, além de deputado geral e senador do Império do Brasil entre 1831 e 1855. Faleceu no Rio de Janeiro em 1855.

 

 

Grande conselho provisional

Ata da reunião do Grande Conselho Provisional, com a presença, entre outros, de ouvidores, procuradores de câmaras provinciais e eleitores de toda a província. Propõe uma nova forma de governo, o rompimento com d. Pedro I e a adesão à Confederação do Equador. Tendo por base os prejuízos causados por "d. Pedro príncipe de Portugal, chamado Imperador do Brasil," percebe-se a quebra do pacto tantas vezes assegurado e também tantas vezes por ele violado, apesar de ser dizer defensor do Brasil. Acusa-o de ter agido despoticamente ao dissolver a Assembleia Geral Constituinte, despedindo com ignorância seus representantes e tomando para si o direito absoluto de legislar. Assinado por centenas de pessoas, destacando-se padre Gonçalo Ignácio Mororó, Tristão de Alencar, José Pereira Filgueiras.

 

Conjunto documental: Confederação do Equador
Notação: caixa 742, pct. 01
Data-limite: 1808-1878
Titulo de fundo: Confederação do Equador
Código do fundo: 1N
Data do documento: 27 de agosto de 1824
Local: Fortaleza, Ceará
Folhas(s): -

 

Carta Imperial

Brigadeiro Francisco de Lima e Silva[1], comandante da Brigada expedicionária cooperadora da boa ordem[2] da Província de Pernambuco[3]. Eu o IMPERADOR Constitucional[4] e defensor Perpétuo do Brasil vos envio muito saudar. Foi-me presente o vosso Ofício de vinte oito de Setembro próximo passado, em que expondes que, achando-se já presos muitos dos cúmplices da rebelião dessa província, não tendes ainda procedido contra eles na forma prescrita pelo decreto de vinte seis, e Carta imperial de vinte sete de julho do corrente ano, que criou a comissão militar[5], pela falta de verdadeira inteligência, de quais sejam, ou devam reputar-se os chefes e cabeças dela; e sendo fora de toda a dúvida que como tais se devem considerar não só todos os chefes de corpos, e guerrilhas[6], comandantes de fortalezas, e redutos, que atrozmente rebelando-se contra a Minha Imperial Pessoa, e integridade do Império, com as armas nas mão, comandarão, e fizeram viva, é sanguinolenta oposição as leais e valorosas tropas, que desta marcharam em socorro e salvação da referida província, mas também os que declamaram contra a Minha legítima, e suprema Autoridade, atacando-a com escritos insolentes, e injuriosos, e todos os que acintemente matarem os soldados da brigada que tanto deve concorrer para o restabelecimento da boa ordem da mesma província: hey por bem declarar-vos que todos os réus de semelhante natureza, se devem julgar compreendidos na referida comissão militar, para serem logo por ela processados, e sentenciados, verbal, e sumarissimamente, sem atenção a sua qualidade, empregos, e graduações qualquer que seja. O que me parecei participar-vos para vossa inteligência e devida execução. Escrita no Palácio do Rio de Janeiro em 16 de outubro de 1824, 3.º da Independência e do Império= IMPERADOR= Clemente Ferreira França= Para o Brigadeiro Francisco de Lima e Silva= Clemente Ferreira e França

 

[1] SILVA, FRANCISCO DE LIMA E (1785-1853): único barão de Barra Grande, nasceu em 1785, no Rio de Janeiro. Em 1801, casou-se com Mariana Cândida de Oliveira Belo, com quem teve Luís Alves de Lima e Silva, futuro duque de Caxias. Em 1824, com a patente de brigadeiro do exército imperial, foi designado por D. Pedro I para comandar uma brigada expedicionária que tinha como objetivo sufocar a Confederação do Equador. Em setembro de 1824, as forças de Lima e Silva dominaram Recife e Olinda (principais centros de resistência) e dois meses mais tarde, após outros enfrentamentos na região, chegava ao Ceará. Depois de debelar o movimento, Lima e Silva presidiu as chamadas comissões militares, criadas por d. Pedro com o intuito de julgar os revoltosos. Dentre outras medidas, ordenou o fuzilamento de frei Caneca que, através do jornal Tífis Pernambucano, havia se tornado uma importante liderança na revolta. Foi presidente de província em Pernambuco, em 1824-25, e senador entre 1827 e 1853. Destacou-se, ainda, como membro da Regência Trina Provisória (1831) durante a menoridade de Pedro II e, em 17 de junho de 1831, foi eleito novamente como regente, desta vez para a Regência Trina Permanente. Faleceu em 1853.

[2] BRIGADA EXPEDICIONÁRIA COOPERADORA DA BOA ORDEM: era assim conhecida a brigada expedicionária, liderada pelo brigadeiro Francisco de Lima e Silva, em 1824, que tinha por finalidade combater os revoltosos confederados em Pernambuco, e reprimir a Confederação do Equador. Suas operações se iniciaram em Alagoas, incorporando tropas pernambucanas, fiéis ao governo nomeado pelo imperador, e forças enviadas da Bahia e Rio de Janeiro.

[3] PERNAMBUCO: a capitania de Pernambuco foi uma das subdivisões do território brasileiro no período colonial. Em 9 de março de 1534, essas terras foram doadas ao fidalgo português Duarte Coelho Pereira, que fundou Recife e Olinda (primeira capital do estado) e iniciou a cultura da cana-de-açúcar e do algodão, que teriam importante papel na história econômica do país. A capitania, originalmente, estendia-se por 60 léguas entre os rios Igaraçu e São Francisco, e era chamada de Nova Lusitânia. Nos primeiros anos da colonização, junto com São Vicente, a capitania teve grande destaque, pois sua exploração foi bem-sucedida, principalmente devido ao cultivo e produção do açúcar, responsável por mais da metade das exportações brasileiras. O sucesso da lavoura açucareira atraiu investimentos de outros colonos portugueses. O povoado de Olinda prosperou, tanto que, em 1537, o povoado foi elevado à categoria de vila, tornando-se um dos mais importantes centros comerciais da colônia. Em 1630, no entanto, os holandeses invadem Olinda e conquistam Pernambuco. A vila foi incendiada em 1631, como resultado dos contra-ataques portugueses, e Recife torna-se, então, o centro administrativo da capitania, crescendo sob a administração dos holandeses. O domínio holandês, sob a administração do conde Maurício de Nassau, provocou mudanças econômicas, sociais e culturais: tolerância religiosa; melhoramento urbano em Recife; incentivo a atividades artísticas e estudos científicos, além de acordos com os senhores de engenho no sentido de minorar suas dívidas e incentivar a produção de açúcar. Os holandeses foram expulsos em 1654 e foi iniciada a lenta reconstrução da vila de Olinda. Os anos de guerra e os conflitos internos abalaram a economia da capitania e, com o crescimento de outras regiões da colônia, Pernambuco perdeu sua supremacia econômica. Foi, também, no século XVII, que se formou o quilombo dos Palmares, o maior centro de resistência negra à escravidão do período colonial. Parte dele localizava-se em terras da capitania de Pernambuco e era formado por escravos fugitivos. Foi destruído em 1690, por Domingos Jorge Velho, após quase um século de existência. Pernambuco foi palco de diversos conflitos e revoltas. A guerra dos mascates, em 1710 e 1711, apresentou-se como um embate entre interesses imediatos de comerciantes portugueses – concentrados em Recife, pejorativamente chamados de mascates – e senhores de engenho, assentes em Olinda. A já existente rivalidade entre as duas cidades, que expressava uma disputa de poder político entre os dois grupos mencionados, acentuou-se em 1710, com a elevação do povoado de Recife à categoria de vila, independente de Olinda que, a partir de então, entraria em declínio, perdendo o status de capital para a rival logo em 1711. Em 1817, outro conflito eclodiria na capitania, a Revolução Pernambucana, que marcou o período de governo de d. João VI como um dos principais movimentos de contestação ao domínio português. Em meio a esse clima, a dissolução da Assembleia Constituinte, em 1823, e a outorga da Constituição de 1824 por d. Pedro I geraram violenta reação de Pernambuco. Após a tentativa de destituição de Manuel Paes de Andrade da presidência da província, para a nomeação de Francisco Pais Barreto pelo Imperador, acirraram-se as tensões, abrindo caminho para um movimento contestador: a Confederação do Equador – grande movimento revolucionário de caráter separatista e republicano que se estendeu por grande parte do nordeste brasileiro e teve Pernambuco como centro irradiador.

[4] PEDRO I, D. (1798-1834): batizado como Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon, d. Pedro I era filho de d. João VI e de d. Carlota Joaquina. Tornou-se herdeiro da Coroa portuguesa após a morte do primogênito Antônio, recebendo o título de príncipe real no mesmo ano da sagração de d. João como rei de Portugal, em 1816. Casou-se com a arquiduquesa da Áustria, Carolina Josefa Leopoldina em 1817, que veio a falecer no Brasil nove anos depois. Contraiu segundas? núpcias com a duquesa alemã Amélia Augusta em 1829. Com o retorno da família real a Portugal, em 1821, d. Pedro tornou-se príncipe regente do Brasil. Os planos políticos que as cortes de Lisboa destinavam ao Brasil levaram d. Pedro a romper definitivamente com Portugal, proclamando a independência do Brasil em setembro de 1822, quando foi sagrado e coroado imperador e defensor perpétuo do Brasil. O reinado de d. Pedro I (1822-1831) foi marcado por acontecimentos importantes como a convocação e dissolução da Assembleia Constituinte (1823); a outorga da primeira constituição do Brasil (1824); a criação do Conselho de Estado e a Guerra Cisplatina (1825-1828). Com a morte de d. João, em 1826, d. Pedro ascendeu ao trono, recebendo o título de Pedro IV. Forçado a abdicar em favor de sua filha primogênita, Maria da Glória, nomeou seu irmão d. Miguel como regente. Em 1831, foi a vez de d. Pedro abdicar do trono no Brasil, em favor do seu filho Pedro de Alcântara. A esta altura o monarca já havia dado várias demonstrações de seu caráter autoritário, a exemplo da dissolução da Assembleia Legislativa e do afastamento dos irmãos Andrada do governo por defenderem ideias consideradas radicais como o fim da escravidão e a limitação dos poderes do imperador. Os empréstimos com a Inglaterra, conflitos internos e a Guerra da Cisplatina agravaram a situação financeira do recém-criado Império, além das disputas entre os grupos políticos formados pelos partidos português, brasileiro e radical, que incendiavam ainda mais o contexto instável do governo e contribuíam para a impopularidade do imperador que, também no aspecto pessoal, era visto como boêmio e mantinha um famoso caso extraconjugal com a marquesa de Santos. Todos esses fatores levaram à abdicação do trono brasileiro e, ao regressar a Portugal, d. Pedro assumiu a liderança nas lutas contra seu irmão pelo trono. Amante da música, d. Pedro I compôs o hino da Carta (posteriormente adotado como hino nacional português até 1910) e o hino da independência do Brasil. Morreu tuberculoso em 1834.

[5] COMISSÃO MILITAR: a comissão militar foi criada pelo Imperador, com a carta régia de 25 de julho de 1824, com a finalidade de julgar e sentenciar os revoltosos confederados. O decreto de criação da comissão era, em si, quase uma exigência de condenação, ordenando que os réus fossem processados de forma sumária e verbal pela comissão. Funcionou sob a presidência do brigadeiro e governador interino da província, Francisco de Lima e Silva, e suas atividades se encerraram em março de 1825, após a sentenciação sumária dos implicados na Confederação do Equador.

[6] GUERRILHA [COMPANHIAS DE]: desde o início de 1824, durante a Confederação do Equador, Manuel de Carvalho Paes de Andrade demonstrou preocupação com uma reorganização militar da região nordestina. Em janeiro, um decreto por ele emitido determinava a reestruturação das companhias de guerrilhas e que o capitão comandante de cada companhia seria nomeado pelo próprio presidente de província. Outros postos dentro de cada companhia, embora indicados pelo capitão, deveriam ser confirmados pelas autoridades civis. Embora seus membros se originassem também de outras forças armadas, as guerrilhas não se integravam ou subordinavam a nenhum outro corpo militar. Seu objetivo era manter a ordem pública geral, manter a segurança local, vigiar estradas, controlar o fluxo de pessoas. Poderiam, contudo, em caso de necessidade, atuar como uma força militar convencional, caso em que se subordinavam ao Governador das Armas. O governo de Pernambuco também convocou corpos de milícias e determinou um recrutamento geral de indivíduos capazes em algum ofício, mesmo artesãos presos, para se engajarem em obras e tarefas especializadas.

Repressão

Carta do imperador d. Pedro I ao comandante da Brigada Expedicionária Cooperadora da Boa Ordem da província de Pernambuco, brigadeiro Francisco de Lima e Silva, determinando como identificar e como proceder com os rebeldes. E ainda afirma que todos eles devem ser punidos de acordo com a comissão militar independente de sua qualidade de emprego ou graduação.

 

Conjunto documental: Confederação do Equador
Notação: caixa 742, pct. 01
Data-limite: 1808-1878
Titulo de fundo: Confederação do Equador
Código do fundo: 1N
Data do documento: 16 de outubro de 1824
Local: Rio de Janeiro
Folhas(s): -

 

Carta Imperial

Brigadeiro Francisco de Lima e Silva[1], comandante da Brigada expedicionária cooperadora da boa ordem[2] da Província de Pernambuco[3]. Eu o IMPERADOR Constitucional[4] e defensor Perpétuo do Brasil vos envio muito saudar. Foi-me presente o vosso Ofício de vinte oito de Setembro próximo passado, em que expondes que, achando-se já presos muitos dos cúmplices da rebelião dessa província, não tendes ainda procedido contra eles na forma prescrita pelo decreto de vinte seis, e Carta imperial de vinte sete de julho do corrente ano, que criou a comissão militar[5], pela falta de verdadeira inteligência, de quais sejam, ou devam reputar-se os chefes e cabeças dela; e sendo fora de toda a dúvida que como tais se devem considerar não só todos os chefes de corpos, e guerrilhas[6], comandantes de fortalezas, e redutos, que atrozmente rebelando-se contra a Minha Imperial Pessoa, e integridade do Império, com as armas nas mão, comandarão, e fizeram viva, é sanguinolenta oposição as leais e valorosas tropas, que desta marcharam em socorro e salvação da referida província, mas também os que declamaram contra a Minha legítima, e suprema Autoridade, atacando-a com escritos insolentes, e injuriosos, e todos os que acintemente matarem os soldados da brigada que tanto deve concorrer para o restabelecimento da boa ordem da mesma província: hey por bem declarar-vos que todos os réus de semelhante natureza, se devem julgar compreendidos na referida comissão militar, para serem logo por ela processados, e sentenciados, verbal, e sumarissimamente, sem atenção a sua qualidade, empregos, e graduações qualquer que seja. O que me parecei participar-vos para vossa inteligência e devida execução. Escrita no Palácio do Rio de Janeiro em 16 de outubro de 1824, 3.º da Independência e do Império= IMPERADOR= Clemente Ferreira França= Para o Brigadeiro Francisco de Lima e Silva= Clemente Ferreira e França

 

[1] SILVA, FRANCISCO DE LIMA E (1785-1853): único barão de Barra Grande, nasceu em 1785, no Rio de Janeiro. Em 1801, casou-se com Mariana Cândida de Oliveira Belo, com quem teve Luís Alves de Lima e Silva, futuro duque de Caxias. Em 1824, com a patente de brigadeiro do exército imperial, foi designado por D. Pedro I para comandar uma brigada expedicionária que tinha como objetivo sufocar a Confederação do Equador. Em setembro de 1824, as forças de Lima e Silva dominaram Recife e Olinda (principais centros de resistência) e dois meses mais tarde, após outros enfrentamentos na região, chegava ao Ceará. Depois de debelar o movimento, Lima e Silva presidiu as chamadas comissões militares, criadas por d. Pedro com o intuito de julgar os revoltosos. Dentre outras medidas, ordenou o fuzilamento de frei Caneca que, através do jornal Tífis Pernambucano, havia se tornado uma importante liderança na revolta. Foi presidente de província em Pernambuco, em 1824-25, e senador entre 1827 e 1853. Destacou-se, ainda, como membro da Regência Trina Provisória (1831) durante a menoridade de Pedro II e, em 17 de junho de 1831, foi eleito novamente como regente, desta vez para a Regência Trina Permanente. Faleceu em 1853.

[2] BRIGADA EXPEDICIONÁRIA COOPERADORA DA BOA ORDEM: era assim conhecida a brigada expedicionária, liderada pelo brigadeiro Francisco de Lima e Silva, em 1824, que tinha por finalidade combater os revoltosos confederados em Pernambuco, e reprimir a Confederação do Equador. Suas operações se iniciaram em Alagoas, incorporando tropas pernambucanas, fiéis ao governo nomeado pelo imperador, e forças enviadas da Bahia e Rio de Janeiro.

[3] PERNAMBUCO: a capitania de Pernambuco foi uma das subdivisões do território brasileiro no período colonial. Em 9 de março de 1534, essas terras foram doadas ao fidalgo português Duarte Coelho Pereira, que fundou Recife e Olinda (primeira capital do estado) e iniciou a cultura da cana-de-açúcar e do algodão, que teriam importante papel na história econômica do país. A capitania, originalmente, estendia-se por 60 léguas entre os rios Igaraçu e São Francisco, e era chamada de Nova Lusitânia. Nos primeiros anos da colonização, junto com São Vicente, a capitania teve grande destaque, pois sua exploração foi bem-sucedida, principalmente devido ao cultivo e produção do açúcar, responsável por mais da metade das exportações brasileiras. O sucesso da lavoura açucareira atraiu investimentos de outros colonos portugueses. O povoado de Olinda prosperou, tanto que, em 1537, o povoado foi elevado à categoria de vila, tornando-se um dos mais importantes centros comerciais da colônia. Em 1630, no entanto, os holandeses invadem Olinda e conquistam Pernambuco. A vila foi incendiada em 1631, como resultado dos contra-ataques portugueses, e Recife torna-se, então, o centro administrativo da capitania, crescendo sob a administração dos holandeses. O domínio holandês, sob a administração do conde Maurício de Nassau, provocou mudanças econômicas, sociais e culturais: tolerância religiosa; melhoramento urbano em Recife; incentivo a atividades artísticas e estudos científicos, além de acordos com os senhores de engenho no sentido de minorar suas dívidas e incentivar a produção de açúcar. Os holandeses foram expulsos em 1654 e foi iniciada a lenta reconstrução da vila de Olinda. Os anos de guerra e os conflitos internos abalaram a economia da capitania e, com o crescimento de outras regiões da colônia, Pernambuco perdeu sua supremacia econômica. Foi, também, no século XVII, que se formou o quilombo dos Palmares, o maior centro de resistência negra à escravidão do período colonial. Parte dele localizava-se em terras da capitania de Pernambuco e era formado por escravos fugitivos. Foi destruído em 1690, por Domingos Jorge Velho, após quase um século de existência. Pernambuco foi palco de diversos conflitos e revoltas. A guerra dos mascates, em 1710 e 1711, apresentou-se como um embate entre interesses imediatos de comerciantes portugueses – concentrados em Recife, pejorativamente chamados de mascates – e senhores de engenho, assentes em Olinda. A já existente rivalidade entre as duas cidades, que expressava uma disputa de poder político entre os dois grupos mencionados, acentuou-se em 1710, com a elevação do povoado de Recife à categoria de vila, independente de Olinda que, a partir de então, entraria em declínio, perdendo o status de capital para a rival logo em 1711. Em 1817, outro conflito eclodiria na capitania, a Revolução Pernambucana, que marcou o período de governo de d. João VI como um dos principais movimentos de contestação ao domínio português. Em meio a esse clima, a dissolução da Assembleia Constituinte, em 1823, e a outorga da Constituição de 1824 por d. Pedro I geraram violenta reação de Pernambuco. Após a tentativa de destituição de Manuel Paes de Andrade da presidência da província, para a nomeação de Francisco Pais Barreto pelo Imperador, acirraram-se as tensões, abrindo caminho para um movimento contestador: a Confederação do Equador – grande movimento revolucionário de caráter separatista e republicano que se estendeu por grande parte do nordeste brasileiro e teve Pernambuco como centro irradiador.

[4] PEDRO I, D. (1798-1834): batizado como Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon, d. Pedro I era filho de d. João VI e de d. Carlota Joaquina. Tornou-se herdeiro da Coroa portuguesa após a morte do primogênito Antônio, recebendo o título de príncipe real no mesmo ano da sagração de d. João como rei de Portugal, em 1816. Casou-se com a arquiduquesa da Áustria, Carolina Josefa Leopoldina em 1817, que veio a falecer no Brasil nove anos depois. Contraiu segundas? núpcias com a duquesa alemã Amélia Augusta em 1829. Com o retorno da família real a Portugal, em 1821, d. Pedro tornou-se príncipe regente do Brasil. Os planos políticos que as cortes de Lisboa destinavam ao Brasil levaram d. Pedro a romper definitivamente com Portugal, proclamando a independência do Brasil em setembro de 1822, quando foi sagrado e coroado imperador e defensor perpétuo do Brasil. O reinado de d. Pedro I (1822-1831) foi marcado por acontecimentos importantes como a convocação e dissolução da Assembleia Constituinte (1823); a outorga da primeira constituição do Brasil (1824); a criação do Conselho de Estado e a Guerra Cisplatina (1825-1828). Com a morte de d. João, em 1826, d. Pedro ascendeu ao trono, recebendo o título de Pedro IV. Forçado a abdicar em favor de sua filha primogênita, Maria da Glória, nomeou seu irmão d. Miguel como regente. Em 1831, foi a vez de d. Pedro abdicar do trono no Brasil, em favor do seu filho Pedro de Alcântara. A esta altura o monarca já havia dado várias demonstrações de seu caráter autoritário, a exemplo da dissolução da Assembleia Legislativa e do afastamento dos irmãos Andrada do governo por defenderem ideias consideradas radicais como o fim da escravidão e a limitação dos poderes do imperador. Os empréstimos com a Inglaterra, conflitos internos e a Guerra da Cisplatina agravaram a situação financeira do recém-criado Império, além das disputas entre os grupos políticos formados pelos partidos português, brasileiro e radical, que incendiavam ainda mais o contexto instável do governo e contribuíam para a impopularidade do imperador que, também no aspecto pessoal, era visto como boêmio e mantinha um famoso caso extraconjugal com a marquesa de Santos. Todos esses fatores levaram à abdicação do trono brasileiro e, ao regressar a Portugal, d. Pedro assumiu a liderança nas lutas contra seu irmão pelo trono. Amante da música, d. Pedro I compôs o hino da Carta (posteriormente adotado como hino nacional português até 1910) e o hino da independência do Brasil. Morreu tuberculoso em 1834.

[5] COMISSÃO MILITAR: a comissão militar foi criada pelo Imperador, com a carta régia de 25 de julho de 1824, com a finalidade de julgar e sentenciar os revoltosos confederados. O decreto de criação da comissão era, em si, quase uma exigência de condenação, ordenando que os réus fossem processados de forma sumária e verbal pela comissão. Funcionou sob a presidência do brigadeiro e governador interino da província, Francisco de Lima e Silva, e suas atividades se encerraram em março de 1825, após a sentenciação sumária dos implicados na Confederação do Equador.

[6] GUERRILHA [COMPANHIAS DE]: desde o início de 1824, durante a Confederação do Equador, Manuel de Carvalho Paes de Andrade demonstrou preocupação com uma reorganização militar da região nordestina. Em janeiro, um decreto por ele emitido determinava a reestruturação das companhias de guerrilhas e que o capitão comandante de cada companhia seria nomeado pelo próprio presidente de província. Outros postos dentro de cada companhia, embora indicados pelo capitão, deveriam ser confirmados pelas autoridades civis. Embora seus membros se originassem também de outras forças armadas, as guerrilhas não se integravam ou subordinavam a nenhum outro corpo militar. Seu objetivo era manter a ordem pública geral, manter a segurança local, vigiar estradas, controlar o fluxo de pessoas. Poderiam, contudo, em caso de necessidade, atuar como uma força militar convencional, caso em que se subordinavam ao Governador das Armas. O governo de Pernambuco também convocou corpos de milícias e determinou um recrutamento geral de indivíduos capazes em algum ofício, mesmo artesãos presos, para se engajarem em obras e tarefas especializadas.

União de Pernambuco e Ceará

Oficio de Tristão Gonçalves de Alencar Araripe, presidente da província do Ceará, a Manoel Carvalho Paes de Andrade, presidente da província de Pernambuco, solicitando auxílio em armamentos, pois as tropas cearenses não possuíam muito poder de fogo. Defende também que as duas províncias, Ceará e Pernambuco, deveriam lutar juntas contra o imperador e em defesa da liberdade.


Conjunto documental: Confederação do Equador
Notação: caixa 742, pct. 01
Data-limite: 1808-1878
Titulo de fundo: Confederação do Equador
Código do fundo: 1N
Data do documento: 30 de abril de 1824
Local: Ceará
Folhas(s): -

Está feita a nossa intima união, quer de reciprocidade de sentimentos, quer de riscos, e de perigos. O Ceará[1] não cede a Pernambuco[2] em patriotismo, e zelo da sua liberdade: ambas são Províncias do Brasil, cheias de gás, e daqueles ilustres caracteres que a natureza gravou nos corações livres dos Brasileiros honrados. Do papel junto verá V. Exª os motivos que nos obrigarão a depor o Presidente do governo desta província dentro de quatorze dias. O senhor Pedro José da Costa Barros em tão pequeno período de tempo tornou-se o alvo dos ressentimentos deste povo brioso, que já não sofre os enganos, e para melhor dizer, o descaramento do Gabinete do Rio de Janeiro[3]. Quis levar-nos como escravos dos ferros do despotismo, e pretendeu que o Ceará negasse á Pernambuco aqueles indispensáveis socorros, que um irmão deve prestar a seu irmão consternado: propôs mesmo que nós fossemos de todo opostos aos sentimentos dos dessodados Pernambucanos. Foi este um evidente testemunho da sua denegação a ideias Liberais[4], e apesar dos nossos convites já mais se resolve abraçar o nosso sistema, e muito menos desaferrar-se dos princípios Ministeriais, quais havia adotado no Rio de Janeiro. Estamos certos de breve invasão, e nós achamos desarmados. Rogo por tanto a V.Exª. queira repartir conosco o armamento, e apetrechos de guerra, que puder dispensar, para cuja condução enviarei ao Sargento Mor Luis Rodrigues Chaves a essa Província, ou outro qualquer oficial com a mais possível brevidade. Parece desnecessário afiançar a V. Exª. uma inabalável identidade do bem, ou do mal entre estas duas Províncias. Em quanto durar a minha Presidência Temporária, e ainda depois dela conte V.Exª., que o Ceará não afrouxará um só fuzil da grande cadeia, que nos interlassa, pois que de mais a mais temos na frente o intrépido Senhor Filgueiras, o ídolo do Povo, e tão firme como uma rocha no embate das ondas. Creio que V.Exª. me entende. Espero ansioso pela deliberação das Províncias a quem o extinto Governo Provisório[5] se dirigiu para a coligança afim de melhor defender-mo-nos do inimigo.

Deus Guarde a V.Exª. como é mister. Palácio do Governo do Ceará 30 de abril de 1824, 3.º da Independência e do Império.

Senhor Manoel de Carvalho Paes de Andrade[6], Presidente do governo da Província de Pernambuco.

Tristão Gonçalves de Alencar Araripe[7].

 

[1] CEARÁ, CAPITANIA DO: capitania hereditária, estabelecida em 1534, tornou-se parte do Estado do Grão-Pará e Maranhão em 1621. Passou a integrar o Estado do Brasil em 1656, ficando subalterna à capitania de Pernambuco até 1799, ano em que alcançou o status de capitania de primeira ordem, embora com subordinação judicial primeiro à relação da Bahia e, depois à de Pernambuco até 1821. A chamada “civilização do couro”, na expressão de Capistrano de Abreu, encontrou dificuldades na conquista, mas se expandiu rapidamente já no século XVII (Cf. Maria Yedda Linhares. Pecuária, Alimentos e Sistemas Agrários no Brasil. Revista Tempo, 1996). A pecuária contribuiu bastante para a sua efetiva colonização, interiorizando a ocupação do território. A criação de gado expandiu-se no século XVIII, quando foi levada para Pernambuco, Bahia e Minas Gerais pelos caminhos do sertão. Além do mercado interno, a pecuária cearense destinava couro e carne para o exterior. Existiam outros produtos como as madeiras nobres, o sal, o algodão e a cera de carnaúba, que tiveram importância para a economia dessa capitania. Embora o Ceará não estivesse entre as praças mais voltadas à exportação, a escravidão africana na região foi significativa desde o século XVIII. O interior da capitania manteria uma concentração maior de população e de atividades de produção até meados do século XIX, o que explica a iniciativa de vilas da região do Crato e de Quixeramobim nas revoltas de 1817 (Revolução Pernambucana) e 1824 (Confederação do Equador). Em 1817, a capitania do Ceará foi palco das lutas entre os revolucionários e os contrarrevolucionários. Seu governador, Manuel Inácio de Sampaio, foi um dos principais aliados do conde dos Arcos, governador da Bahia, no freio à expansão da revolução no Nordeste e na subsequente vitória sobre os rebeldes. A Revolução de 1817, apesar de malograda, foi a semente de um movimento maior, que floresceu em Pernambuco e se expandiu pelo nordeste, incluindo-se o Ceará: a Confederação do Equador. Destaca-se aí a participação de Tristão Gonçalves de Alencar Araripe, liberal radical, que veio a tornar-se chefe do governo cearense. O Ceará, depois de Pernambuco, foi o estado onde a adesão ao movimento revolucionário foi mais ativa e intensa, e se deu de forma imediata. Anteriormente a sua proclamação, já havia eclodido vários focos insurrecionais no Ceará: a Câmara de Quixeramobim (antiga Vila de Campo Maior) declarou decaída a dinastia dos Bragança; e o Padre Gonçalo Inácio de Loiola, mais tarde, Padre Mororó, espalhou por Icó, São Bernardo das Russas e Aracati o movimento revolucionário. José Pereira Figueiras e Tristão Gonçalves comandaram a adesão do Crato. Os embates foram intensos, espalharam-se pelos sertões, e a repressão eliminou, de forma previsivelmente sangrenta, o movimento de 1824, executando ou assassinando suas principais lideranças.

[2] PERNAMBUCO: a capitania de Pernambuco foi uma das subdivisões do território brasileiro no período colonial. Em 9 de março de 1534, essas terras foram doadas ao fidalgo português Duarte Coelho Pereira, que fundou Recife e Olinda (primeira capital do estado) e iniciou a cultura da cana-de-açúcar e do algodão, que teriam importante papel na história econômica do país. A capitania, originalmente, estendia-se por 60 léguas entre os rios Igaraçu e São Francisco, e era chamada de Nova Lusitânia. Nos primeiros anos da colonização, junto com São Vicente, a capitania teve grande destaque, pois sua exploração foi bem-sucedida, principalmente devido ao cultivo e produção do açúcar, responsável por mais da metade das exportações brasileiras. O sucesso da lavoura açucareira atraiu investimentos de outros colonos portugueses. O povoado de Olinda prosperou, tanto que, em 1537, o povoado foi elevado à categoria de vila, tornando-se um dos mais importantes centros comerciais da colônia. Em 1630, no entanto, os holandeses invadem Olinda e conquistam Pernambuco. A vila foi incendiada em 1631, como resultado dos contra-ataques portugueses, e Recife torna-se, então, o centro administrativo da capitania, crescendo sob a administração dos holandeses. O domínio holandês, sob a administração do conde Maurício de Nassau, provocou mudanças econômicas, sociais e culturais: tolerância religiosa; melhoramento urbano em Recife; incentivo a atividades artísticas e estudos científicos, além de acordos com os senhores de engenho no sentido de minorar suas dívidas e incentivar a produção de açúcar. Os holandeses foram expulsos em 1654 e foi iniciada a lenta reconstrução da vila de Olinda. Os anos de guerra e os conflitos internos abalaram a economia da capitania e, com o crescimento de outras regiões da colônia, Pernambuco perdeu sua supremacia econômica. Foi, também, no século XVII, que se formou o quilombo dos Palmares, o maior centro de resistência negra à escravidão do período colonial. Parte dele localizava-se em terras da capitania de Pernambuco e era formado por escravos fugitivos. Foi destruído em 1690, por Domingos Jorge Velho, após quase um século de existência. Pernambuco foi palco de diversos conflitos e revoltas. A guerra dos mascates, em 1710 e 1711, apresentou-se como um embate entre interesses imediatos de comerciantes portugueses – concentrados em Recife, pejorativamente chamados de mascates – e senhores de engenho, assentes em Olinda. A já existente rivalidade entre as duas cidades, que expressava uma disputa de poder político entre os dois grupos mencionados, acentuou-se em 1710, com a elevação do povoado de Recife à categoria de vila, independente de Olinda que, a partir de então, entraria em declínio, perdendo o status de capital para a rival logo em 1711. Em 1817, outro conflito eclodiria na capitania, a Revolução Pernambucana, que marcou o período de governo de d. João VI como um dos principais movimentos de contestação ao domínio português. Em meio a esse clima, a dissolução da Assembleia Constituinte, em 1823, e a outorga da Constituição de 1824 por d. Pedro I geraram violenta reação de Pernambuco. Após a tentativa de destituição de Manuel Paes de Andrade da presidência da província, para a nomeação de Francisco Pais Barreto pelo Imperador, acirraram-se as tensões, abrindo caminho para um movimento contestador: a Confederação do Equador – grande movimento revolucionário de caráter separatista e republicano que se estendeu por grande parte do nordeste brasileiro e teve Pernambuco como centro irradiador.

[3] GOVERNO DO RIO DE JANEIRO: a vinda da família real para o Rio de Janeiro, em 1808, ampliou a importância política e administrativa dessa cidade na América portuguesa. Com o retorno de d. João VI a Portugal, em meio à revolução liberal de 1820, aqui a regência de d. Pedro I se defronta com a elite política formada em torno da causa brasileira. Para esses segmentos dominantes de nascidos no Brasil, mais os portugueses ajustados às circunstâncias da colônia, o que interessava era a autonomia em relação a Lisboa, sem abrir mão da continuidade na ordem social e econômica estabelecida. As deliberações das Cortes revolucionárias, a partir de 1821, se mostraram inconvenientes ao “partido brasileiro”, dividido entre tendências conservadoras e ideias progressistas, mas nitidamente resistente à subordinação irrestrita do Brasil a Portugal. Nessas tensões engendrou-se o processo de independência do Brasil e o governo do Rio de Janeiro, a partir de 1822, expressou a implementação de um projeto de soberania na organização do Estado deste lado do Atlântico. Durante a Confederação do Equador, em 1824, o Gabinete do Rio de Janeiro, ou seja, o Imperador e seus ministros instalados na cidade, era visto pelos confederados com uma face despótica e centralista, não muito diferente daquela apresentada pela dinastia de Bragança antes da independência, quando sediada em Lisboa. Além disso, a maior atenção atribuída àquela cidade e à região sudeste, evidenciada inclusive na Constituição de 1824, deixaria marginalizado o restante do país, em especial o Nordeste.

[4] IDEIAS LIBERAIS [NA CONFEDERAÇÃO DO EQUADOR]: inspiradoras do movimento nordestino de 1824 e de diversos outros movimentos revolucionários no Brasil, as ideias liberais têm raízes nas lutas da burguesia em superar os obstáculos que a ordem jurídica feudal opunha ao livre desenvolvimento da economia. O liberalismo postulava as limitações do poder estatal em benefício das liberdades individuais, era fundamentado nas teorias racionalistas e empiristas do Iluminismo, e na expansão econômica gerada pela industrialização. O ideário liberal no terreno econômico possuía sua contrapartida no terreno das ideias políticas, que defendiam a liberdade intelectual e a secularização do processo político vistas, cada vez mais, como um negócio entre iguais. O ideário liberal, de uma forma ampla, influenciou muitos movimentos “rebeldes” antes e depois de 1822 no Brasil, fosse para justificar a independência política ou o fim do monopólio comercial, fosse para justificar o rompimento com um governo centralizador e despótico. A Confederação do Equador, e a Revolução Pernambucana de 1817, foram marcadas pelo liberalismo radical, embora defendido com variados graus de intensidade e sinceridade, e apesar da forte repressão, as ideias republicanas e autonomistas estavam significativamente presentes em parcelas da sociedade pernambucana. O principal defensor, no plano intelectual, das ideias liberais durante a Confederação do Equador foi o carmelita Joaquim do Amor Divino, o Frei Caneca, que utilizava o jornal Tífis Pernambucano para defendê-las, reafirmando que a origem da soberania residia no povo e nação, que agiam através de representantes legítimos.

[5] GOVERNO PROVISÓRIO: junta governamental composta por cinco membros oriundos das principais camadas da sociedade, durante a Revolução Pernambucana. Instituído em 8 de março de 1817, integravam-na os seguintes representantes: Domingos José Martins, chefiando o comércio; João Ribeiro de Pessoa de Mello e Montenegro, o clero; Manoel Correia de Araújo, os proprietários de terras; José Luiz de Mendonça, a justiça; e Domingos Teotônio Jorge, o exército. Domingos Teotônio e Francisco de Paula foram os principais líderes militares da rebelião de 1817 e ocupavam, respectivamente, os cargos de general em armas e da divisão. A partir de sua criação, o governo provisório iniciou uma série de medidas, como a criação de cargos de secretário de estado, abolição de impostos sobre lojas e subsídio militar de 160 réis em arroba de carne verde; decretos estabelecendo a liberdade plena de comércio e assegurando a propriedade aos senhores de escravos e a aprovação das leis orgânicas em 7 de abril – onde foram pioneiramente inscritos princípios como o republicanismo, a liberdade de consciência, a tolerância religiosa e um regime tributário menos escorchante. Em virtude da iminente invasão pelas tropas reais e a não-aceitação do acordo de capitulação, a junta governamental foi dissolvida a 18 de maio de 1817, delegando amplos poderes a Domingos Teotônio Jorge. A referência ao Governo Provisório, contudo, sobreviveria à rebelião, influenciando os rebeldes de anos vindouros, frequentemente lembrado tanto pelo poder instaurado – que temia a sua evocação – quanto pelos opositores deste — que ameaçavam com seu retorno.

[6] ANDRADE, MANOEL DE CARVALHO PAES DE (177?-1855): nascido em Pernambuco, viveu por algum tempo em Portugal, dedicando-se ao comércio em seu retorno. Participou da Revolução Pernambucana de 1817 e, com a derrota do movimento, refugiou-se nos Estados Unidos, temendo a retaliação das autoridades. Após a anistia, em 1821, voltou ao Brasil e ocupou o cargo de Intendente da Marinha. Foi eleito presidente da província de Pernambuco, provisoriamente, em 13 de dezembro de 1823, após a renúncia de Francisco Pais Barreto. Em 8 de janeiro de 1824, foi confirmado presidente pelos eleitores pernambucanos, contrariando as ordens do governo imperial que indicara Francisco Pais Barreto para a presidência. Manoel de Carvalho foi o responsável pela proclamação da Confederação das Províncias Unidas do Equador, em 2 de julho de 1824 [ver Confederação do Equador]. Malogrado o movimento, refugiou-se na Inglaterra por cerca de sete anos. Novamente no Brasil, foi eleito senador pela província da Paraíba e, em 1834, foi mais uma vez presidente da província de Pernambuco, além de deputado geral e senador do Império do Brasil entre 1831 e 1855. Faleceu no Rio de Janeiro em 1855.

[7] ARARIPE, TRISTÃO GONÇALVES DE ALENCAR (1789-1825): nascido no Crato, Ceará, participou da Revolução Pernambucana de 1817 e da tentativa de levar o movimento a sua terra natal, ao lado de sua mãe Bárbara de Alencar, do tio Leonel Pereira de Alencar e do irmão José Martiniano de Alencar. Em 3 de maio de 1817, uma pequena vila do interior do Ceará proclamou a República do Crato, assumindo a presidência Bárbara de Alencar. Os revolucionários foram presos pelo capitão-mor José Pereira Filgueiras e enviados para presídios em Fortaleza. Quando da sua liberdade e da eclosão da Confederação do Equador, aderiu ao movimento, tornando-se uma das figuras mais representativas, sendo proclamado pelos rebeldes republicanos, em 26 de agosto de 1824, presidente da província do Ceará, destituindo o tenente coronel Pedro José da Costa Barros. Ao seu lado, José Pereira Filgueiras figurava como comandante das armas. Outrora inimigos políticos, lutariam pela mesma causa em 1824, formando uma dupla de grande poder. Foi morto pelas forças imperiais no interior do Ceará.

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