HABITANTES ESCARMENTADOS
A província do Rio Grande de São Pedro serviu como base para operações militares durante as tentativas de ocupação da Banda Oriental do Rio da Prata – atual Uruguai. No início do século XIX, foi também, o ambiente de convocações compulsórias e contratação de mercenários para a manutenção da campanha militar depois de derrotas das forças luso-brasileiras. A expressão “habitantes escarmentados” refere-se às experiências de danos sofridos pela população rio grandense, castigada pelos conflitos impostos na região; denotava desesperança e desilusão. Embora, em 1826, tanto a Cisplatina quanto o Rio Grande fossem províncias brasileiras, os conflitos de interesses nessa região atravessavam a emergência de projetos nacionais para a província de Buenos Aires e demais províncias adjacentes e para Banda do Uruguai. À ocupação luso-brasileira em Montevidéu iniciada em 1817 pelas tropas de d. João, seguiu-se a anexação da Província Cisplatina em 1821 e a subordinação ao governo do Rio de Janeiro a partir de 1822. As repercussões do envolvimento do Rio Grande com os conflitos na região do Prata se evidenciaram na presença significativa de desertores, tanto das forças de ocupação, como também da resistência organizada, que se abrigaram na província. Na prática, os enfrentamentos e a instabilidade na ordem pública na Banda Oriental transbordaram para as províncias meridionais, como Rio Grande e Santa Catarina, onde a desordem social proveniente do afluxo de refugiados e desertores da campanha militar na Cisplatina se fazia presente. Ao longo das primeiras décadas do século XIX, verifica-se a difusão das ideias liberais deste lado do Atlântico e, no território onde atualmente é o Uruguai. As disputas se travaram entre: soluções de subordinação a Espanha; autonomia local; incorporação a Buenos Aires; anexação luso-brasileira; união com o governo independente do Rio de Janeiro e vinculação a Lisboa. Nesse contexto, a proximidade geográfica, somada às movimentações guerrilheiras, e aos interesses pecuários do Brasil, expressa um contágio da província de Rio Grande com o ambiente de ocupação e resistência local em Montevidéu, com implicações futuras para a região ao longo de todo o Oitocentos.
HEBREUS
Povo de origem semita - indivíduos descendentes dos povos e culturas oriundas da Ásia ocidental e, portanto, pertencentes à mesma família etnográfica e lingüística, como os assírios, os aramaicos, os fenícios e os árabes -, os hebreus, segundo os primeiros relatos, habitavam o sul da Mesopotâmia. Eram pastores seminômades, organizados em pequenos grupos, e que tinham na religião judaica a sua principal característica, aquilo que os identificava como povo. O judaísmo - primeira religião monoteísta -, os diferenciava sobremaneira dos outros povos que também habitavam essa conturbada região e praticavam o politeísmo. Há aproximadamente 2000 anos a.C., os hebreus radicaram-se no vale do rio Jordão, na Palestina. A partir dessa ocupação, deixam o seu estado tribal para assumir uma identidade nacional, onde a terra, tornar-se-ia outro elemento de união desse povo. Por volta do ano 70 d.C., os romanos dominaram a região, destruindo sua principal cidade, Jerusalém. A partir de então, os hebreus, expulsos, dispersaram-se pelo mundo – o que ficaria conhecido como diáspora judaica. Foi no período romano que o etnônimio passou a ser utilizado também para referir-se aos judeus, um grupo étnico e religioso de ascendência hebraica. Durante a diáspora, os hebreus migraram para outras regiões do globo, sobretudo a Ásia Menor, África e o sul da Europa, onde formaram comunidades judaicas no intento de manter suas crenças e tradições. No mundo ibérico, sua presença sempre foi bastante conturbada. Constantemente sujeitos a perseguições, os judeus eram difamados como usurários, assassinos, ladrões, feiticeiros, etc. Expulsos pela Inquisição espanhola, em 1492, também enfrentaram a Inquisição em Portugal, após o casamento entre d. Manoel I e Isabel, princesa espanhola filha dos reis católicos. Entre as diversas leis contra os judeus, que foram publicadas nessa época, destaca-se o édito de expulsão de d. Manoel I, publicado em 1496, que obrigava os judeus e muçulmanos a sair do país ou a converter-se ao cristianismo. A partir de então, milhares de judeus foram forçados a adotar a fé católica, tornando-se os chamados cristãos-novos, mudando, inclusive, seus nomes, embora muitos tenham conservado em segredo a sua identidade, sendo denominados criptojudeus. Nas várias ondas de antissemitismo que atingiram os judeus, seus bens foram confiscados e suas mulheres condenadas à fogueira como hereges. Com relação à América portuguesa, os judeus aqui aportaram já em 1503, na condição de cristãos-novos, impulsionando o processo de colonização, com o aval da Coroa portuguesa. Desde 1535, era prática Portugal deportar para a América criminosos de todos os tipos e, com a introdução do Santo Ofício no Reino, que teve seu primeiro Auto-de-fé em 1540, os judaizantes - assim denominados aqueles que secretamente praticavam a fé judaica, mesmo na condição de cristãos-novos - também seriam degredados para o além-mar. Muitos também vieram fugidos da Inquisição, mesmo antes de uma acusação formal, pois o tribunal foi implacável na busca da origem étnica dos portugueses. Procuravam nos novos territórios ultramarinos um refúgio. No entanto, em fins do século XVI, a Inquisição se fez presente também na América portuguesa, através das visitas de inquisidores do Tribunal do Santo Ofício português, perseguindo e processando cristãos-novos por quaisquer condutas que ferisse os dogmas da Igreja Católica, entre elas as práticas de tradições e ritos judaicos. A partir da primeira visita em 1591, na Bahia, os cristão-novos, sendo eles sinceramente convertidos ou não, enfrentaram um clima de denuncismo, preconceito e hostilidade. Pode-se afirmar, contudo, que as perseguições que teriam se iniciado no século XVIII enfrentaram muitas dificuldades, tendo em vista à ocupação territorial bastante espalhada feita pelos cristão-novos na América portuguesa, levando a um número reduzido de prisões. Anita Novinsky (1972) também sustenta a ideia de que o interesse econômico da metrópole, ou seja, o peso das atividades financeiras desenvolvidas pelos cristãos-novos e sua importância na ocupação do território, contribuiu para as poucas detenções. Os judeus viveriam um período de relativa liberdade religiosa durante o período de ocupação holandesa no nordeste brasileiro (1630-1654). Algumas famílias de origem lusa, residentes nos Países Baixos, migraram para o nordeste, especialmente para Pernambuco, desfrutando da liberdade concedida então, sobretudo no período de Maurício de Nassau. Com a expulsão dos holandeses, muitos judeus regressaram à Holanda, outros ajudaram na fundação de Nova Amsterdam, atual cidade de Nova Iorque. A diáspora judaica chegou ao fim em 1948, com a fundação do Estado de Israel em sua região de origem, onde havia se mantido, ao longo do tempo, uma expressiva presença judaica. Ainda hoje, o povo judeu mantém a sua unidade através das histórias, tradições e cultos religiosos, independentemente do idioma ou da nacionalidade de cada indivíduo.
HENRIQUES, JOSÉ ANSELMO CORREA (1777-1831)
Nasceu na freguesia de Ribeira Brava, na Ilha da Madeira, no seio de uma família nobre. Foi escritor e poeta português, autor de vários poemas satíricos e políticos. Veio para o Brasil junto com a Corte em 1811 e escreveu suas impressões do Império português nos trópicos em Memorial sobre a residência d’El Rey no Brasil. Segundo o historiador Marco Morel, foi espião do ministro Thomás Villa Nova Portugal incumbido de investigar e denunciar as maçonarias. Villa Nova promoveu intensa campanha contra as sociedades secretas, sobretudo a maçonaria, vista por ela como uma ameaça a monarquia. Na Inglaterra, publicou dois jornais de linha absolutista: Argus, no ano de 1809 e O Zurrague Político das Cortes Novas em 1821.
HISTÓRIA NATURAL
Ao longo do século XVIII, tornam-se centrais a observação e estudo da natureza, orientados pelos critérios ilustrados de racionalidade e utilitarismo. O campo do conhecimento designado como História Natural que compreendia a Botânica, a Zoologia e a Mineralogia, sofreu, no setecentos, a influência das novas teorias científicas e paradigmas filosóficos. Buscava-se promover um inventário da natureza de acordo com os sistemas de classificação e a taxonomia criados por Carl Von Lineu e das propostas de descrição e investigação do mundo natural organizadas pelo intendente do Jardin du Roi, conde de Buffon. Nesse período, foram promovidas viagens às diversas regiões do globo tendo em vista o recolhimento de espécies dos “três reinos da natureza” para envio aos museus e gabinetes de História Natural criados na Europa. Em Portugal, verifica-se um crescente interesse pela História Natural na segunda metade do XVIII, manifestado na criação de museus, gabinetes e jardins botânicos e na introdução da disciplina nos estudos superiores através da reforma pombalina da Universidade de Coimbra (1772). Após o período da ocupação holandesa no nordeste brasileiro, quando se produziu o primeiro tratado de História Natural do Brasil, por Piso e Margrave, a investigação da natureza ficaria a cargo especialmente dos religiosos da Companhia de Jesus, até o setecentos, sobretudo em sua segunda metade, quando um maior aproveitamento das potencialidades dos territórios impulsionou o conhecimento das produções naturais dos domínios ultramarinos portugueses, incluindo as viagens científicas e filosóficas patrocinadas pela Coroa lusa. Integravam tais expedições, naturalistas formados pela Universidade reformada, conhecedores da História Natural que professavam os princípios de experimentação e observação da ciência moderna. As diferentes espécies vegetais e animais recolhidas nas viagens eram encaminhadas aos gabinetes de História Natural e classificadas segundo o sistema lineano. A preocupação com as possíveis aplicações dos produtos verificava-se já na pesquisa de campo, quando os naturalistas indicavam o uso medicinal e alimentar que lhes davam os povos indígenas. Inúmeras foram as publicações que resultaram desse intenso período dedicado à coleta e à pesquisa dos chamados “três reinos da natureza”, entre elas o Florae Lusitanicae et Brasiliensis (1788) e o Dicionário dos termos técnicos de História Natural (1788) de Domingos Vandelli; Flora fluminensis, de José Marianno da Conceição Veloso; Observações sobre a História Natural de Goa, feitas no ano de 1784, de Manoel Galvão da Silva, além de diversas memórias da Academia Real das Ciências de Lisboa dedicadas à botânica.
HOLANDESES
O interesse dos holandeses pelo território brasileiro remonta ao século XVI, quando estes já empreendiam viagens à colônia portuguesa na América, motivados, sobretudo, pelo lucrativo comércio do açúcar e buscando recolher informações acerca do potencial econômico costeiro, das possíveis rotas marítimas e dos melhores pontos para atracamento. Com a proibição da entrada de estrangeiros no Brasil em 1605, durante a União Ibérica, as incursões holandesas ao território da colônia escassearam. Esse período de união luso-espanhol e das guerras de independência dos Países Baixos contra a Espanha é decisivo para a compreensão dos ataques holandeses ao nordeste brasileiro nas primeiras décadas do século XVII. Durante as guerras de independência, uma das medidas adotadas por Felipe II, rei das duas coroas ibéricas, foi a suspensão do comércio entre Holanda e Portugal e suas colônias, incluindo a América lusa. Tal proibição afetava diretamente o comércio do açúcar brasileiro, uma vez que os flamengos eram os principais investidores da agroindústria açucareira. Caberia à Companhia Neerlandesa das Índias Ocidentais, fundada em 1621 e detentora do monopólio desse comércio, o restabelecimento das transações mercantis entre neerlandeses e o Brasil, considerado território vulnerável no grande Império Ibérico, mas de grande potencial lucrativo. O nordeste brasileiro, principal região produtora de açúcar, foi o alvo de ataques holandeses. A primeira incursão foi na Bahia em 1624, região estratégica para o comércio no Atlântico sul. O assalto não foi bem-sucedido. Em 1628, os holandeses mudaram o foco e passaram a cobiçar a região de Pernambuco, igualmente importante em termos econômicos, mas fragilmente protegida. Sob ocupação holandesa, a produção de açúcar no nordeste brasileiro floresceu. O período mais prolífico da presença holandesa no Brasil foi o da governação de Maurício de Nassau. Responsável pelas afamadas reformas urbanísticas no Recife, Nassau construiu palácios, pontes, calçou ruas e praças, promoveu melhorias sanitárias e apoiou diversas missões de naturalistas, pintores e estudiosos das ciências naturais, promovendo o conhecimento da natureza do território. Deixou como legado um rico e vasto material iconográfico, bem como diversos testemunhos da história da presença holandesa no Brasil, que se encerrou em 1645, quando foram expulsos pelas forças luso-brasileiras.
HOMENS BONS
No período colonial, eram considerados homens bons aqueles que pertenciam a um status social e econômico elevado, brancos, proprietários de terras e escravos, constituindo-se as únicas pessoas qualificadas para exercerem determinados cargos políticos. Além do caráter pecuniário, a pureza de sangue também impunha-se, excluindo descendentes de judeus e mouros. Somente aos homens bons era creditado o direito de se elegerem e votarem para os cargos disponíveis nas Câmaras Municipais.
HOMENS DO VALONGO
Assim eram conhecidos os traficantes e negociantes de escravos no Rio de Janeiro, a maior parte deles portugueses, que praticavam o comércio escravagista na região do Valongo. Toda a complexa estrutura de organização desse comércio, que envolvia comissários da alfândega, capitães dos navios, grandes negociantes, tropeiros, atravessadores, foi transferida para o Valongo ainda em fins do século XVIII, pelo marquês do Lavradio. Anteriormente, os escravos eram vendidos nas ruas da área central da cidade, mormente nas proximidades do largo do Paço, na rua São José e arredores, ao alcance dos olhos de moradores e estrangeiros que chegavam para conhecer a colônia. Assim, sob a alegação de proteger os cidadãos das doenças trazidas pelos navios negreiros e preservar a imagem da capital do Brasil, esse mercado foi transferido para a região onde atualmente compreende as áreas da Saúde, Gamboa e Santo Cristo. A região do Valongo abrigou o desembarque dos navios, e a comercialização dos escravos, nos mercados, trapiches e casas dos negociantes que se localizavam na rua de mesmo nome (hoje rua Camerino). Os homens do Valongo, controlavam o comércio de escravos no maior porto de desembarque de africanos da América, auferindo grandes lucros. Segundo Manolo Fiorentino (1997) e João Fragoso (1998), o mercado de africanos tornou-se uma das atividades coloniais mais lucrativas, responsável pela fortuna mercantil que colocaria tais mercadores no topo da hierarquia econômico e social da colônia. Mesmo depois da lei de 1831 que proibia o tráfico, muitos donos de armazéns continuaram a trabalhar na clandestinidade, mas em condições mais difíceis por conta da inspeção inglesa. Os negociantes continuaram lucrando, principalmente por conta do aumento do preço do cativo, todavia a atividade tornou-se mais arriscada. A partir de 1850, quando o tráfico é definitivamente extinto, o comércio interno de escravos perdurou, entretanto, parte dos comerciantes passaria a dedicar seus capitais a outras atividades comerciais e a indústria.
HORTA, ANTÔNIO JOSÉ DA FRANÇA E (1753-1823)
Nascido na cidade de Faro, em Portugal, foi um militar e administrador colonial, tenente-general, fidalgo da Casa Real e comendador da Ordem de Cristo. Governador e capitão general da capitania de São Paulo, de dezembro de 1802 a outubro de 1808, se propôs a acelerar o desenvolvimento econômico da capitania através da melhoria dos “caminhos”, ou seja, as vias de comunicação das quais dependiam o sucesso da atividade comercial, e da concentração das exportações paulistas pelo porto de Santos, buscando a integração da província à política monopolista da metrópole. Outra importante medida de França e Horta foi a criação do primeiro curso oficial de cirurgia no Brasil, no Hospital Militar da cidade de São Paulo, ministrado pelo físico-mor Mariano José do Amaral, São Paulo sofria com a falta de médicos e boticas no período. Promoveu também, aulas de desenho e matemática para formação de oficiais engenheiros na capitania. Foi conselheiro da Fazenda a partir de 17 de janeiro de 1812. Integrou o Corpo Militar como Marechal de Campo graduado e retornou a Portugal, em 1821, com d. João VI. Em sua homenagem, uma cidade do estado de São Paulo foi batizada de Franca.
HOSPITAL DOS LÁZAROS
Fundado em 1º de fevereiro de 1765 no Rio de Janeiro, funcionava no antigo casarão da fazenda de São Cristóvão, que pertencia a Companhia de Jesus. Com a expulsão definitiva dos jesuítas do Brasil, o prédio passou para a administração da Irmandade da Candelária que já atendia aos hansenianos da região. Após reformas, instalou-se no imóvel o Hospital dos Lázaros ou Hospital Frei Antônio, destinado a prestar assistência aos doentes de lepra. Sua localização, em um ponto central do Rio de Janeiro, levantou sérias questões quanto aos diversos cuidados necessários para garantir o isolamento dos enfermos, a fim de evitar a disseminação da doença pela população. Já em São Paulo, o primeiro lazareto foi fundado em 1802 para abrigar os hansenianos com o objetivo de isolá-los e os afastar do convívio na cidade, pois a enfermidade era contagiosa e sem cura. Até a construção do lazareto, os portadores da doença, em razão do estigma a ela associado, perambulavam pelas estradas sem destino ou viviam em acampamentos distantes da cidade. A área escolhida para construção do hospital localizava-se em direção a uma das saídas da cidade, na região leste, denominada de Olaria, próximo ao Convento da Luz. O terreno foi comprado pelo governador Antonio José da Franca e Horta e entregue aos cuidados da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia. A obra começou logo no ano seguinte, a partir do apoio governamental e de doações de particulares. Esse hospital funcionou durante todo o século XIX de forma extremamente precária, atendendo a um número muito reduzido de pacientes, isto devido principalmente à ausência de fundos regulares que permitissem custear os gastos necessários com a manutenção dos doentes. A administração cabia apenas à Santa Casa de Misericórdia, não recebendo nenhum auxílio da Câmara Municipal, nem da província de São Paulo. Em 1904, o Hospital dos Lázaros foi fechado e os doentes transportados para um novo estabelecimento construído em um local mais distante da cidade: Guapira.
HOSPITAL MILITAR DO RIO DE JANEIRO
A inexistência de um hospital próprio para os militares na América portuguesa, levou ao rei de Portugal Pedro II a decretar, através de carta régia de 21 de março de 1702, a criação de um hospital militar no Rio de Janeiro. Mas o funcionamento do Hospital Real Militar e Ultramar só se iniciou na segunda metade do século XVIII, no antigo Colégio dos Jesuítas, no morro do Castelo. Até a sua criação, a responsabilidade dos cuidados com os enfermos militares ficava a cargo, sobretudo, dos hospitais da misericórdia, que recebiam para isso um pagamento da Fazenda Real. No entanto, ao longo dos anos, as santas casas, como eram conhecidos os hospitais da misericórdia estabelecidas nas principais vilas coloniais, tornaram-se insuficientes e passaram a exigir um aumento do subsídio anual pago pelo Estado. Assim, logo após a expulsão dos jesuítas em 1759, foram transferidas, para o então desocupado Colégio dos Jesuítas, enfermarias militares, com o objetivo de centralizar o atendimento a esses pacientes em um único edifício, cuja direção foi entregue ao cirurgião-mor Teotonio dos Santos de Almeida. Com a transferência da corte em 1808, o hospital passou a ser chamado de Hospital Militar da Corte do Rio de Janeiro, e sofreu por diversas mudanças na sua organização, entre as quais pode-se citar a nomeação de um boticário e ajudantes para o preparo de remédios na própria instituição. Anexa ao hospital, foi criada a Botica Real Militar, onde os remédios seriam manipulados. Em 1820, o decreto de regulamentação dos hospitais regimentais levou a descentralização do atendimento exclusivo aos soldados.
HOSPITAL REAL DE SÃO JOSÉ
O antigo Hospital Real de Todos os Santos, primeiro hospital de grande porte português, teve sua construção iniciada ainda no reinado de d. João II (1455-1495), após sucessivas autorizações obtidas junto aos papas Sisto IV, Inocêncio VIII e Alexandre VI, para congregar diversos hospitais da cidade de Lisboa em um único estabelecimento. A inauguração, entretanto, ocorreu apenas em 1504, sob o governo de d. Manuel I (1469-1521). Resultado da fusão de diversas instituições de assistência, o hospital refletia um período de mudança no que tange o papel do Estado absolutista como promotor e gestor da assistência pública, exercida até então pela Igreja. No período medieval, os estabelecimentos de assistência como albergarias, mercearias, gafarias e hospitais, em sua maioria administrados por ordens religiosas e particulares, exerciam principalmente funções de recolhimento, hospício e abrigo, enquanto o atendimento médico era prioritariamente destinado ao espaço domiciliar. No início do século XVI, atendendo às necessidades da crescente população urbana, e refletindo a centralização do poder político na figura do rei, foram criados hospitais gerais nas principais cidades portuguesas, sob controle régio. Além dos doentes, a exemplo das instituições de assistência da época, o hospital abrigava crianças abandonadas (expostos), mendigos e peregrinos, embora não fossem admitidos os portadores de doenças incuráveis e vítimas de peste. A instituição contava com enfermarias separadas para homens e mulheres, uma “casa de doidos”, a casa de expostos e instalações para nobres. No ano de 1564, através de carta régia, o hospital passa a ser de responsabilidade da Misericórdia de Lisboa. Tendo parte de suas instalações destruídas por um incêndio decorrente do famoso terremoto de que a cidade de Lisboa é palco em 1755, seus internos são transferidos pelo Marquês de Pombal, em 1775, para o Colégio de Santo Antão, antiga Casa da Companhia de Jesus, passando a receber o nome de Hospital Real de São José, em honra do rei d. José I.
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